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quinta-feira, 6 de março de 2008

Opinião: DUELO BARROSO-SÓCRATES?

Parece-me evidente que Durão Barroso já percebeu que são cada vez mais fortes as movimentações no seio da União Europeia destinadas a dotarem a futura Comissão Europeia de uma liderança mais dinâmica e politicamente mais consistente. E que, por isso, é mais do que provável – creio mesmo que inevitável, mesmo ressalvando que num contexto europeu nunca podemos falar em nada como adquirido – que Barroso acabará por ter, a exemplo de alguns dos seus antecessores com menos dinâmica, apenas um mandato em Bruxelas. O novo Tratado de Lisboa – em grande medida foi estruturado e definido nos seus princípios mais essenciais, durante a presidência alemã, que antecedeu a portuguesa – dotou a União de um novo modelo interno e de novas regas de funcionamento, que nada tem a ver com a metodologia até hoje seguida, nomeadamente com a opção pelas presidências rotativas, que funcionaram sempre como uma espécie de expressão máxima da afirmação dos egoísmos sectários nacionalistas por parte dos países, que olharem para aqueles seis meses de glória efémera, qual passadeira de vaidades e protagonismos, muitas vezes pensando no retorno político e eleitoral interno.
Neste quadro, é natural que o objectivo político de Barroso passe pelo regresso a Portugal – não sei bem para fazer o quê (reassumir a liderança do PSD?) – inevitavelmente para preparar a sua candidatura às presidenciais de 2016, depois de Cavaco Silva se recandidatar com o apoio do PSD, como vai acontecer, em 2011. Ou seja, Barroso vai lutar, já está a lutar, para ser candidato presidencial do PSD no pós-cavaquismo, provavelmente tendo o actual primeiro-ministro José Sócrates como o seu adversário à esquerda. Ou seja, Cavaco será normalmente o candidato em 2011, não creio que a esquerda tenha possibilidades de apresentar um candidato capaz de o derrotar (seria o primeiro caso que um Presidente não seria reeleito, como aconteceu com Eanes, Soares e Sampaio), pelo que temos duas hipóteses a considerar: ou Sócrates avançaria já em 2011 contra Cavaco Silva, cenário que francamente não acredito possa acontecer, por recusa do líder socialista, tal a cumplicidade entre ambos, ou o actual primeiro-ministro optaria por apostar tudo numa vitória eleitoral em 2009, mesmo sem maioria absoluta, o que obrigaria a um entendimento (coligação?) parlamentar à esquerda que poderia funcionar como uma hipotética (consistente?) base para a preparação de uma candidatura presidencial de esquerda em 2016.
Até lá, e enquanto Barroso não desfrute de um palco que lhe garanta protagonismo político (salvo se o Presidente da Comissão, depois de substituído em Bruxelas no final de 2008, queira ser o candidato do PSD em 2009, o que mudaria muita coisa, desde logo no seu partido, embora este cenário não me pareça minimamente plausível por razões temporais), Sócrates, ao invés, disporia, no caso do PS vencer as eleições em 2009 (e ninguém garante isso, pelo contrário, as sondagens indiciam uma maioria absoluta bastante distante), da possibilidade desse protagonismo activo pelo menos até 2013. O segundo mandato presidencial de um Cavaco Silva tranquilamente reeleito, terminará em 2016. A minha única dúvida é esta: e entre 2013 e 2016, estariam Barroso e Sócrates já a preparar essa candidatura? Mas enquanto Sócrates mais facilmente poderá ter a possibilidade de convencer o PS, desconheço que hipóteses teria um Durão Barroso ainda hoje apontado no PSD de ter sido o principal responsável pelo descalabro político e eleitoral social-democrata de 2005, nas legislativas antecipadas depois da demissão presidencial do governo de Santana Lopes. Recordo que Romano Prodi, antigo Presidente da Comissão Europeia, assumiu um protagonismo político em Itália – aproveitando um Berlusconi em queda livre – que o levou ao poder. Mas Prodi foi eleito, não por ter sido Presidente da Comissão, mas apenas por ser a alternativa directa do partido de Berlusconi, e por liderar uma coligação alargada que foi propositadamente formalizada para ele. Curiosamente o próprio Prodi, embora se tivesse mantido dois anos na liderança italiana, acabou por sucumbir a uma instabilidade política interna que provocou a queda do governo e a convocação de eleições gerais antecipadas para Abril. Daí que o comissário Franco Frattini, responsável pela Justiça e Assuntos Internos, tenha comunicado a Durão Barroso que deixará o cargo para participar nas eleições de Abril no seu país. Um semanário lisboeta recordava que “o britânico Peter Mendelson, responsável pela pasta do Comércio, já foi informado pelo seu primeiro-ministro, Gordon Brown, que não terá o mandato renovado, Benita Ferrero-Waldner, comissária das Relações Externas e Joaquim Almunia, o espanhol responsável pelos Assuntos Monetários, poderão não cumprir até ao fim os respectivos mandatos, se entretanto entrar em vigor o novo Tratado, o qual determina a criação do cargo de Alto Representante para a Política Externa, acabando com o posto da primeira (se for Javier Solana o escolhido, Almunia terá que voltar para casa, porque não pode haver dois comissários com a mesma nacionalidade)”. É preciso não esquecer que Tony Blair foi lançado pelo Presidente francês, mas suscita muitas resistências, por ser oriundo de um país que continua a olhar a Europa com desconfiança e que nem faz parte do núcleo duro da zona euro. Outros entendem que essa opção seria a melhor para inverter essa situação. Mas nada disto está definido, nem Barroso está completamente posto de lado.
Que Barroso se está a movimentar, ninguém duvida. Ainda recentemente foi noticiado um (polémico) almoço em Lisboa para o qual convidou seus antigos colaboradores, deixando de fora, entre outros, Santana Lopes, opção que causou grande polémica, por ter sido o próprio Barroso, quando foi para Bruxelas a empurrar – para não dizer a impor ao PSD – o nome do então Presidente da Câmara de Lisboa, e actual líder parlamentar (!) para o cargo de líder do PSD e primeiro-ministro. Das duas uma: ou Barroso considera Santana um potencial obstáculo ou mesmo um adversário à sua estratégia, ou algo aconteceu entre os dois que ninguém sabe muito bem descortinar, mas que esteve na origem da atitude tomada. Acompanhemos esta novela, na certeza que ela não pode ser dissociada das presidenciais de 2016.

Luís Filipe Malheiro (in Jornal da Madeira, o6 de Março de 2008)

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