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sexta-feira, 11 de abril de 2008

Opinião: CAVACO E O ENVELHECIMENTO

Em vésperas de visitar oficialmente a Madeira durante quase uma semana, o Presidente da República usou da palavra na sessão de abertura do “Fórum Gulbenkian de Saúde 2008/2009”, realizado esta semana em Lisboa, no qual teve oportunidade de traçar algumas das ideias. Registei, por exemplo, e muito bem, a preocupação de Cavaco Silva perante o fenómeno do envelhecimento da população portuguesa, realidade em relação à qual muitos parecem não dar a devida atenção.
Lembro, a propósito, que em Setembro do ano passado, um estudo do INE já deixava alertas preocupantes: “O número de idosos tem aumentado, em particular o grupo com 80 e mais anos. Na sua maioria (58,2%), os idosos são mulheres. Nos próximos 25 anos o número de idosos poderá mais do que duplicar o número de jovens. A maioria dos idosos vive com o cônjuge. Cerca de um quarto dos indivíduos dos 50 aos 69 anos de idade e que deixaram o último emprego trabalharam durante 40 a 44 anos, sendo o limite de idade de reforma obrigatória a principal razão para a reforma. 62% dos indivíduos entre os 50 e 69 anos - com pensão de reforma ou que, não recebendo, tinham direito a ela - apontaram como motivo principal para continuar a trabalhar a necessidade de ter um rendimento familiar suficiente. A proporção de idosos que utilizam computador e Internet tem vindo a aumentar”.
Na intervenção feita na reunião a que me referi, Cavaco Silva mostrou claramente saber do que falava e, mais do que isso, mostrou qual a intencionalidade subjacente à escolha e ao destaque dado ao tema: “ Para cada um de nós, trata-se (o envelhecimento) da concretização da lei da vida, mas, para as sociedades em que vivemos, o envelhecimento, enquanto fenómeno estrutural, representa um desafio cujos contornos e impactos estão longe de ser devidamente identificados e avaliados. Duvido que a opinião pública e os cidadãos portugueses estejam suficientemente informados e conscientes das dimensões desse desafio, dos problemas que levanta, dos processos de mudança que exige, e também das oportunidades que nele devem ser procuradas. Nesta perspectiva, nunca é demais retomarmos o debate sobre o envelhecimento em toda a sua abrangência”. O Presidente lembrou:
· No final desta década, a população portuguesa deverá atingir o seu máximo histórico: cerca de 10 milhões e 600 mil habitantes - nessa altura, a população com 65 e mais anos representará cerca de 18% do total;
· Se projectarmos as actuais tendências para quarenta anos mais tarde, em meados do século XXI a população portuguesa ver-se-á reduzida em cerca de 1 milhão e 300 mil habitantes e os idosos representarão, nessa altura, 32% do total;
· Em média, os portugueses viverão mais seis anos e o actual índice de envelhecimento será multiplicado por quase duas vezes e meia, passando dos actuais 108 para 243 idosos por cada 100 jovens. Ou seja, a manterem-se as actuais tendências, a população com 65 e mais anos representará, em 2050, cerca de um terço do total da população portuguesa.
Perante este alerta e a realidade destes indicadores quem é que poderia ficar insensível ao alerta – mais um – do Presidente da República, particularmente do seu alerta, insistente, para “uma alteração profunda da estrutura demográfica e social portuguesa, que exige das próximas gerações novas formas de encarar o envelhecimento e novas soluções na afectação dos recursos disponíveis”. Depois de criticar, e bem, o facto de que “na opinião pública e nos órgãos de comunicação social, a preocupação tem-se centrado, quase exclusivamente, nos custos do envelhecimento” lembrou Cavaco que o “impacto sobre os sistemas de pensões, a sua sustentabilidade financeira, ou a pressão sobre os sistemas nacionais de saúde decorrente dos custos acrescidos da longevidade têm sido temas abordados com alguma insistência. Compreendo essa perspectiva e reconheço, naturalmente, a sua importância. Mas quero propor-vos uma reflexão mais alargada”.
Registei o facto do Presidente ter alertado – e é também por isso que considero este discurso de Cavaco um dos mais importantes que até hoje proferiu na abordagem da problemática demográfica em Portugal – para o facto do envelhecimento “não dever ser visto como uma ameaça ou como um fardo para o bem-estar das novas gerações. Não é o facto de estarmos a falar de pessoas mais idosas que nos deve impedir de as considerar também como parte das soluções que nos abrem novas portas para o futuro. Não é o facto de estarmos a falar de pessoas estatisticamente inactivas que nos autoriza a ignorar ou a prescindir do seu contributo para a criação de riqueza e de bem-estar. É precisamente por se tratar de pessoas que não devemos tomá-las apenas como um número, um custo ou um encargo”.
Por limitação de espaço, não posso realçar aqui todas as ideias expressas por Cavaco Silva nesse encontro, mas dado que o Presidente insistiu no enumerar de considerações e de alertas que deveriam passar a ser incluídos, num patamar de prioridade superior ao que actualmente lhe é reconhecidamente atribuído pelos partidos e pelos políticos, de uma maneira geral, acho que devo voltar ao assunto. Deixo apenas, como reflexão final, esta passagem:
“No caso das empresas, questiono-me sobre se a obsessão sobre o contínuo rejuvenescimento dos seus trabalhadores se traduz sempre num ganho efectivo de eficiência e se tal não poderá contribuir para um défice de identidade, de cultura organizacional e, mesmo, de rentabilidade. No caso das organizações cívicas, tenho vindo a destacar o papel do voluntariado e como o aproveitamento da experiência de muitos quadros de empresas, entretanto passados à reforma, pode ser um contributo para que, com os mesmos recursos materiais, essas organizações prestem melhores serviços e os tornem acessíveis a um maior número de cidadãos carenciados”.
Luís Filipe Malheiro (in Jornal da Madeira, 11 de Abril de 2008)

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