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segunda-feira, 2 de julho de 2007

Artigo: PRESIDÊNCIA

Portugal assumiu ontem a presidência da União Europeia, numa conjuntura caracterizada por muitas dúvidas e poucas certezas. A Cimeira de Bruxelas, tirou muitas dores-de-cabeça e embora possa ter aberto (?) caminho a uma chamada versão reduzida do Tratado Europeu – mas que ninguém sabe ao certo do que se trata nem do que falamos – não conseguiu neutralizar outras dificuldades da União, particularmente o desemprego, a falta de competitividade, divergências internas entre países, o acentuar de assimetrias entre regiões e países, impasses políticos em várias frentes, etc. Ficamos todos com a ideia – e na Polónia a opinião pública e a comunicação social continua a ser fortemente crítica das cedências – que os polacos foram obrigados a vergar perante os demais parceiros e que terão sido chantageados com o cenário futuro dos fundos comunitários, dado que a Polónia era o único obstáculo ao acordo pretendido. O radicalismo dos polacos, que admito tenha sido excessivo em relação a algumas matérias, manteve-se durante horas inalterável. Creio que a história desta Cimeira de Bruxelas ficou por fazer-se, incluindo a suspeição de que vários acordos políticos terão sido “cozinhados” sem qualquer divulgação para o exterior. Pode ser pura especulação, admito-o, pode não ter correspondência com o que se passou, mas que a suspeição está instalada, disso ninguém se livra.
Há uma certa imagem de fragilidade crescente da União, que aos poucos está a ser construída junto da opinião pública europeia, e que resulta não das disputadas entre os principais países da União, mas sobretudo dos egoísmos e dos interesses sectários específicos de cada país. A União Europeia continua a ser uma realidade que avança, timidamente por vezes, parando no tempo, porque continuamos a não ser capazes de criar o tal grande espaço comum, onde os países, mesmo perdendo um pouco da sua identidade própria, terão que abdicar de qualquer coisa a favor desse espaço que inevitavelmente terá que ser construído, se realmente apostamos no sucesso da Europa.
Eu sou, sempre o disse, um europeísta convicto. Mas não gosto da Europa que procura impor aos cidadãos tudo o que meia dúzia de iluminados em Bruxelas entendem ser o melhor, não quero uma Europa que tenha receio de saber o que pensam os seus cidadãos, não quero uma Europa construída (?) com base em egoísmos nacionalistas, não quero uma Europa incapaz de combater os problemas económicos, não quero uma Europa ridicularizada e dividida, incapaz de virar a esquina das dificuldades e encontrar novos caminhos. Não quero uma Europa que não institucionalize a Europa das regiões, não quero uma Europa que tenha medo de descer até aos pilares essenciais à sua existência, os cidadãs, ouvindo-os, informando-os, mobilizando-os para uma participação cívica que não pode continuar a ser a palhaçada que tem sido e que, por exemplo, as eleições europeias o demonstram.
Quero uma Europa construída de baixo para cima, de forma consistente e participada, quero uma Europa economicamente forte, competitiva, que distribua riqueza em vez de cruzar os braços perante o avanço da pobreza, quero uma Europa que propicie emprego aos seus cidadãos, que proteja os idosos, que acompanhe e incentive os jovens, que construa o conceito europeísta do espaço único alargada.
Quero uma Europa séria, não a Europa dos ricos contra os pobres, dos mais fortes contra os mais pequenos, das regiões mais frágeis contra as regiões mais desenvolvidas, de políticos iluminados, quero uma Europa de combate não uma Europa aos soluços, quero uma Europa justa e estabilizada, não uma Europa que vagueia ao sabor dos arrufos dos políticos, mais ou menos incompetentes que chegam a posições de liderança ou de destaque no espaço comunitário.
Mas quero essencialmente uma Europa onde nos sintamos, todos nós europeus, plenamente realizados, satisfeitos e seguros. Não quero uma Europa ameaçada externamente, debilitada, incapaz de reagir e de se defender.
É neste quadro que Portugal assume a presidência da União. Dizem alguns que serão seis meses difíceis, outros admitem que se poderá chegar a um consenso e obter uma nova versão do Tratado Europeu que finalmente nos faça ultrapassar as dificuldades. Não tenho tanta certeza disso. Não sou um europessimista, mas tenho cada vez mais a convicção de que nem tudo tem sido feito para que se construam consensos.
Mais do que emitir juízos de valor sobre o envolvimento que a presidência portuguesa atribuiu às regiões do país, enquanto potenciais palcos de realização de reuniões internacionais ao longo deste semestre, importa sublinhar que a União Europeia certamente que concentrará as suas atenções no processo de aprovação de uma nova proposta de Tratado Europeu. Espero que em qualquer circunstância, esse Tratado, no que a Portugal diz respeito, deixe de ser sancionado pela vontade suprema do Povo, nunca imposto por uma classe política nacional que, às vezes, revela injustificáveis temores em recorrer ao veredicto livre e democrático dos cidadãos. Desejo sinceramente que esse novo Tratado institucionalize, definitivamente e sem equívocos, o conceito da Europa das Regiões, aproximando-se mais, através delas, dos cidadãos.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 02 de Julho 2007

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