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segunda-feira, 2 de julho de 2007

Artigo: RELAÇÕES

Não me parece, francamente, que o facto do primeiro-ministro ter passado a coordenação das relações com as Regiões Autónomas da sua tutela directa para a do Ministro Silva Pereira, signifique qualquer perspectiva redutora. Não vou por aí. Nos governos anteriores, do PSD ou com a presença do PSD, essas relações institucionais nunca estiveram a cargo directo do primeiro-ministro - repito, nunca estiveram – mas sim de um ministro, até por razões de eficácia e de maior facilidade. O último caso conhecido foi o de Morais Sarmento que foi a”ponte” entre a Madeira e Lisboa. O problema é saber se tudo funcionou bem, se as coisas forem resolvidas, se o protelar de decisões acabou por ter efeitos negativos e legar para os governos seguintes a decisão que em devido tempo poderia, e de veria, ter sido tomada, etc. Mas o juízo político quanto à eficácia desse modelo é uma coisa, outra é pretender desvalorizar o interesse e a disponibilidade de diálogo do poder central, apenas porque é um ministro a assumir essa responsabilidade dialogante.
Eu não estou, embora possa ser acusado disso, a acreditar demasiado numa alteração da actual situação, no que eu chamei de degelo no relacionamento institucional entre os dois governos. Tenho a consciência, que para se ultrapassarem dificuldades que impedem qualquer diálogo, as cedências terão que ser das duas ou de todas as partes directamente envolvidas e interessadas. Não se trata de querer que alguém se submeta a outrem, porque nesse caso a questão passava a ter mais a ver com a dignidade a que todos têm direito e com perspectivas políticas diferentes, e menos com a simples questão de saber se é o ministro X, Y ou Z ou o secretário de Estado A, B ou C que se encarregará das relações com a Madeira. Eu quero acreditar nesse degelo, e acho que ninguém me pode impedir de o fazer, simplesmente porque não acredito que possamos ganhar alguma coisa com o protelar desta situação
Não sou pessimista - embora tenha essa “fama”, sobretudo em momentos eleitorais onde, por norma, procuro quebrar certas euforias excessivas que além de pecarem pelo excesso podem influenciar negativamente estados de espírito e estruturas. Considero-me um realista, pragmaticamente realista, que olho para as coisas, obviamente em função de uma interpretação que, por ser pessoal, será necessariamente sectária e passível de contestação ou de concordância. Eu creio mesmo – e julgo que em tempos já escrevi isso – que o primeiro-ministro nunca deveria ter chamado a si esse relacionamento, não só porque está a introduzir uma carga política excessiva, mas porque também poderia acabar por condicionar e complicar as coisas, já que as relações institucionais estão a um outro nível que não somente o político.
Não podemos ser hipócritas. As dificuldades actuais decorrem, obviamente, das diferenças políticas e partidárias existentes entre os dois governos, já que pela primeira vez a Madeira, e a governação regional em particular, se confrontaram com uma maioria socialista em Lisboa dotada de condições políticas que lhe permitem assumir comportamentos, por exemplo, diferentes do que caracterizaram os governos de Guterres, devido à maioria absoluta parlamentar que foi atribuída ao PS e a José Sócrates em 2005. Silva Pereira – todos sabemos – é um dos ministros mais importantes do denominado “núcleo duro” do governo socialista, é uma personagem com forte receptividade e influência junto de José Sócrates – é Ministro da Presidência – pelo que poderá ser, resta saber se quer ser, uma solução passível de gerar apaziguamento, sem que isso signifique que todos vão ganhar o que querem ou perder o que os seus interlocutores porventura desejem.
Nunca foram um oásis, pelo contrário, as relações entre o governo regional e o governo social-democrata liderado por Cavaco Silva, e igualmente dotado de uma ampla maioria absoluta parlamentar na Assembleia da República. Obviamente que foram dados passos importantes, mas muita coisa ficou pendente, passando de governo para governo, de ministro para ministro, até aos nossos dias, sem que ninguém resolvesse nada. Quando se olha para esse passado, libertos de preconceitos, não podemos, em nome da verdade, branquear uns em detrimento de outros. Evidentemente que nem todos foram iguais para a Madeira, que existiram cumplicidades no passado, que hoje não existem, entre Funchal e Lisboa, que ajudaram a resolver coisas ou a ultrapassar impasses. Mas no passado também se emperrou muita coisa. Deliberadamente, nalgumas situações porque era chique – pretensamente por agradar à opinião pública continental (ou lisboeta?) – optar pelo braço-de-ferro com o Funchal, e especialmente com Alberto João Jardim, em detrimento de uma demonstração de solidariedade política.
O desejável, penso eu, seria o de se estabelecerem canais de contacto e de diálogo directos, entre as secretarias regionais e os ministérios, quer ao nível dos ministros, quer, preferencialmente de secretários de estado, funcionando os representantes da República apenas como moderadores desse diálogo. Creio que é esse o modelo, que vigora em Canárias e noutras regiões europeias, seria o ideal, porventura impensável ainda por mais algum tempo num Portugal que, por exemplo, se for capaz e tiver a coragem e a ousadia de aprovar a regionalização do Continente, terá necessariamente que repensar a estrutura e o modelo de exercício do poder centralizado e por vezes arbitrariamente arrogante. Uma nota final: eu continuo a acreditar, digo-o uma vez mais, na capacidade política de Alberto João Jardim, na sua experiência, habilidade e sobretudo na persistência e na coerência de prescindir de questões partidárias em detrimento da Madeira, para resolver este impasse no relacionamento com Lisboa. Porque não há, politicamente falando, e considerando a actual conjuntura nacional, alternativa credível, e consistente. O resto é folclore.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 28 de Junho 2007

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