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quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Opinião: INCOMPATIBILIDADES

Ficamos ontem a saber, tal como já todos esperavam, ter o Tribunal Constitucional chumbado a chamada lei de incompatibilidades e impedimentos dos deputados aprovada na Assembleia Legislativa da Madeira, num acórdão emitido depois do representante da República, Monteiro Diniz, ter pedido a fiscalização do diploma indevidamente discutido e aprovado. Sustentou o Tribunal Constitucional que o diploma em causa foi aprovado por um órgão (Assembleia Legislativa) que não tinha competência para o fazer porque., com forme revelou o presidente do Tribunal, tal competência é reserva de São Bento, em virtude das incompatibilidade serem matéria estatutária e que apenas cabe à Assembleia da República aprovar os Estatutos Políticos das duas Regiões Autónomas.
Segundo o Presidente do TC, "a Assembleia Legislativa Regional tem competência para propor. O que acontece é que quem tem competência para aprovar é a Assembleia da República” pelo que ao ter sido o parlamento regional a aprovar essas incompatibilidades, “tal decisão contraria a Constituição". Curiosamente, o acórdão foi aprovado por unanimidade pelos juízes do tribunal, tendo-se registado apenas uma declaração de voto.
Mas afinal o que se passou?
O PSD da Madeira, pressionado pela permanente suspeição em matéria de incompatibilidades dos deputados regionais, e na sequência de um compromisso assumido por Alberto João Jardim na última campanha eleitoral regional, decidiu avançar com um projecto de decreto legislativo regional que pretendia estabelecer essas incompatibilidades, mesmo sabendo que se tratava de matéria estatutária e que, por isso mesmo, nunca poderia passar pelo crivo do representante da República, por evidente inconstitucionalidade. O PSD da Madeira, há que dizê-lo, não se pode afirmar surpreendido pela decisão do Tribunal Constitucional, mas também não se pode dar por satisfeito muito menos garantir aos eleitores madeirenses que cumpriu a promessa eleitoral de avançar com um regime de incompatibilidades. Fê-lo, é certo, mas de uma forma que não foi a mais correcta, porque os social-democratas sabiam à partida que a iniciativa legislativa em questão não seria promulgada e publicada.
Portanto, há que dizê-lo, há uma matéria que continuará a dever merecer a atenção do PSD da Madeira porque não acredito que o eleitorado mais sensível a este assunto considere que foi cumprido o compromisso assumido na disputa eleitoral regional de Maio do ano passado
Mas porque não optou o PSD da Madeira pela via mais correcta, incluindo o novo regime de incompatibilidades para os deputados que pretenda aplicar na madeira na proposta de revisão do Estatuto? Porque não quer e porque politicamente não pode. Os social-democratas sabem, e sabiam antes de terem avançado com esta iniciativa legislativa agora enviada para o caixote do lixo, que só por via do Estatuto Político – hoje um documento perfeitamente obsoleto e ultrapassado por legislação (lei eleitoral) e por alterações constitucionais entretanto surgidas – é que poderiam ser aprovadas essas incompatibilidades. Por isso, não creio que a “responsabilidade” pela situação possa ser remetida para Monteiro Diniz, que travou o diploma, ou para o Tribunal Constitucional que o considerou inconstitucional, quando na realidade a deficiência está claramente na origem.
O que temos agora? Nada, rigorosamente nada. Porquê? Porque o PSD da Madeira, e bem, já anunciou que não avançará com uma revisão do Estatuto Político – por exemplo os Açores enviaram para São Bento uma proposta aprovada por unanimidade pelos três únicos partidos que fazem parte do parlamento açoriano – por temer que possam surgir, da parte do PS nacional, propósitos de alteração do Estatuto destinados a retirar poderes conquistados pela Madeira, num comportamento que teria mais a ver com a actual disputa política e partidária entre o Funchal e Lisboa, do que propriamente com os interesses dos Madeirenses e com as necessidades que a autonomia regional naturalmente vai sentindo, com o passar do tempo, sobretudo em matéria de clarificação de competências e de supressão de omissões, particularmente quando estas podem originar situações de conflitualidade entre a Região e o Estado. O próprio Alberto João Jardim apressou-se a esclarecer que o seu compromisso de alterar a lei de incompatibilidades,” sem fundamentalismos”, mantém-se, mas “agora vamos esperar pela revisão constitucional de 2010 para que em função do Estatuto que então surgir o assunto seja retomado”. Está dado o mote. O PSD da Madeira considera-se “satisfeito” pela iniciativa, mesmo sabendo que se tratava de uma ilegalidade que nunca passaria em São Lourenço, mas insiste, cautelosamente, em não ter qualquer iniciativa em matéria de alteração do Estatuto Político regional, o que deixa antever que todas as anunciadas intenções de o fazer (o PS já deixou entender isso mesmo) por parte da oposição, não passarão. E como estão definitivamente postas de parte quaisquer tentativas de alteração do Estatuto Político directamente em Lisboa – por se tratar de matéria reservada, a iniciativa de alteração estatutária, aos parlamentos regionais respectivos – antes de 2009 (próximas eleições legislativas nacionais, das quais resultará uma nova configuração da Assembleia da República) não voltaremos a ter, pelo menos com a cumplicidade (e anuência) dos social-democratas, qualquer outra iniciativa neste domínio, pese embora o facto de se prever que a oposição venha a ensaiar alguma iniciativa do género, mesmo sabendo que a mesma não passará no parlamento regional. O fundamental é que o PSD da Madeira e Alberto João Jardim, cumpram esse compromisso assumido com o eleitorado, sem pôr obviamente em causa as conquistas políticas já alcançadas pela autonomia regional e consagradas no estatuto político.
Luís Filipe Malheiro (in "Jornal a Madeira", 16 de Janeiro de 2008)

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