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sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Opinião: A MENSAGEM

Acabou por ser polémica a mensagem de Ano Novo do Presidente da República que desta forma cumpriu um “ritual” anual, regra geral sem grande mediatismo e impacto, mas que Cavaco Silva pretendeu claramente que fosse mais do que isso. Logo a abrir: “Sei que o ano que terminou não foi fácil para muitos Portugueses. Todos gostaríamos que a evolução da situação económica e social do País tivesse sido mais positiva e que os sinais de recuperação fossem agora mais fortes”. O mais caricato é que aqueles que à priori são os destinatários das críticas e das chamadas de atenção, aparecem a concordar com as declarações de Cavaco como se não fosse nada com eles.
Mas foi de outra forma, menos polémica, que Cavaco iniciou o texto da sua mensagem, com referências elogiosas aos resultados da actividade governativa, de facto matérias que dificilmente o Presidente da República numa mensagem desta natureza poderia ignorar, até para poder dizer o que depois disse: “Portugal exerceu, no 2º Semestre, a Presidência do Conselho da União Europeia, tarefa exigente e de grande responsabilidade. Fê-lo com eficácia, rigor e dignidade. É de toda a justiça reconhecer o papel desempenhado pelo Governo. Portugal saiu prestigiado do exercício da presidência e todos aqueles que nela trabalharam são credores do nosso apreço. No ano que passou, melhorou o crescimento da nossa economia. Mas não são ainda seguros os sinais de que nos encontramos no caminho de uma aproximação sustentada ao nível de desenvolvimento médio dos países mais avançados da Europa. Foram alcançados progressos no controlo do desequilíbrio das finanças públicas e surgiram sinais de recuperação do investimento, aspectos importantes para o desenvolvimento futuro do País”.
Depois foram os “mas”:
“Mas o desemprego atingiu níveis preocupantes e são muitas as famílias que enfrentam sérias dificuldades para fazer face às suas despesas de todos os dias. É natural que aos Portugueses se coloquem hoje várias interrogações: será possível reduzir a taxa de desemprego? Os sacrifícios da última meia dúzia de anos garantem um futuro melhor? Conseguirá o País aproximar-se do nível de desenvolvimento médio da União Europeia? Será que Portugal pode vencer?”
Cavaco reclamou “mais investimento, bom investimento”, disse ser preciso que as empresas “sejam capazes de enfrentar a concorrência externa” e lembrou que “somos um País de pequenas e médias empresas, pelo que sem o seu contributo não é possível o crescimento da economia e a redução do desemprego”. Exigiu mais eficiência e rigor “na utilização dos dinheiros públicos e não seja obstáculo a quem quer empreender e criar riqueza” e que os fundos comunitários que começarão a chegar este ano “sejam aplicados com verdadeiro sentido estratégico e geridos com eficiência e transparência”. Insistiu na urgência do aumento do número de alunos no ensino secundário e superior e na redução do insucesso e do abandono escolares “mas temos ainda muito a fazer para reduzir o atraso de qualificação dos nossos jovens”. Ao defender a união de esforços e a melhoraria do clima de confiança entre todos os intervenientes no processo educativo, que estaria Cavaco a querer dizer e que críticas cuidadosamente escondia, e a quem? E quando exigiu a “dedicação dos professores, a participação mais activa dos pais na educação dos filhos, sem dispensar a exigência para com os alunos”?
Contundente quando à justiça: “O funcionamento do sistema de justiça ainda é um obstáculo ao progresso económico e social do País (…) os cidadãos e as empresas ainda não sentiram melhorias significativas na resposta do sistema judicial e continuam, legitimamente, a reclamar uma administração da justiça mais eficiente e mais célere”. Que pode dizer o Ministro da Justiça a tudo isto? Nada. Calar e ouvir…
Que pretendeu Cavaco Silva dizer, e a quem se dirigia, quando considerou “altamente vantajoso o aprofundamento do diálogo entre os agentes políticos”, reclamou “diálogo entre os poderes públicos e os grupos e parceiros sociais” e defendeu que as críticas devem ser encaradas “como um estímulo para fazermos melhor”?
“Perante as dificuldades de crescimento da nossa economia, perante a angústia daqueles que não têm emprego e a subsistência de bolsas de pobreza, devemos concentrar-nos no que é essencial para o nosso futuro comum, e não trazer para o debate aquilo que divide a sociedade portuguesa. Não desviemos as atenções do que é verdadeiramente importante (…) Apesar do esforço do Estado na área da protecção social, não podemos deixar de nos inquietar perante as desigualdades na distribuição do rendimento que as estatísticas revelam”. E das críticas aos “rendimentos auferidos por altos dirigentes de empresas não serão, muitas vezes, injustificados e desproporcionados, face aos salários médios dos seus trabalhadores”?
O que pretendeu dizer Cavaco Silva, e o que criticava, quando afirmou que “o acesso aos cuidados de saúde é uma inquietação de muitos Portugueses. Não estão seguros de que os utentes, principalmente os de recursos mais baixos, ocupem, como deve ser, uma posição central nas reformas que são inevitáveis para assegurar a sustentabilidade financeira do Serviço Nacional de Saúde. Seria importante que os Portugueses percebessem para onde vai o País em matéria de cuidados de saúde. Poderiam, assim, avaliar melhor aquilo que tem sido feito”? E que pode dizer o Ministro da Saúde a tudo isto? Nada. Calar e ouvir…

Luís Filipe Malheiro (in "Jornal da Madeira", 04 de Janeiro de 2008)

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