Opinião: DÉFICES E EXPECTATIVAS…
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Diz o jornal em questão (Publico) que no ano passado Portugal acabou mesmo por não conseguir evitar o impacto no défice destas duas injecções de capital, “já que, em Abril de 2007, o Eurostat – que tem a palavra final nas contas públicas – forçou as autoridades portuguesas a corrigir os dados de 2005, agravando o défice”.
Mas enquanto Portugal – governo e a tal comissão – discutem afinal qual o défice público que apresentarão a Bruxelas, e que depois terá que ser aceitem ou não, pelos organismos comunitários a quem cabe a última palavra nesta matéria, ficamos a saber que Portugal ocupa a 15ª posição como destino preferido pelos investidores estrangeiros ao nível da União Europeia, segundo dados constantes de um estudo realizado por uma empresa de consultoria, para quem "desempenho de Portugal em 2007 surpreende pela positiva”, mantendo em 2007 a mesma posição que tinha 2005, no âmbito da União Europeia, à frente da Dinamarca, Áustria e Noruega. Quer isto dizer que o governo socialista tem assentado muita da sua retórica quanto á recuperação da economia e quanto á estabilidade e controlo das contas públicas em informações da autoria de entidades públicas ou privadas consistentes, dispersas, mas que nalguns casos têm alguma credibilidade.
Deixando para trás as questões formais, vamos ao encontro do país real – utilizando o mesmo procedimento que na Região a oposição usa quando quer confrontar os resultados do PIB regional (mas não é disso que estamos a falar) com a realidade social interna – e constatar, ou tentar constatar, se nos últimos anos tem existido ou não. Por parte da governação em Lisboa, uma dependência crónica perante um predomínio imposto do primado economicista em elação a todos os demais, nomeadamente as questões humanas.
E é a mesma Comissão Europeia que o governo quer ver aprovar o défice abaixo dos 3% a traçar um retrato, a propósito da pobreza em Portugal, particularmente dos idosos e das crianças que nos envergonha a todos (mas esse será tema de um meu próximo artigo), já que revela o efeito pernicioso de orientações economicistas, onde apenas o défice das contas públicas é essencial. Eu esclareço desde já, até para evitar interpretações erradas ou deturpações, que considero uma obrigação dos governos e dos Estados o equilíbrio das suas contas públicas, porque insistir sistematicamente em gestões deficitárias acaba por constituir um ónus que em nada abo na a favor dos governantes. Considero, e nem sequer discuto isso, que este governo, na fase inicial do seu mandato, depois das eleições de 2005, teve necessidade de suster o agravamento do défice público. O que se pode questionar, com toda a legitimidade, são as medidas adoptadas, a natureza e a intencionalidade eventualmente subjacentes a nalgumas delas, mas sobretudo a sua prorrogação temporal até hoje a par de muitas contradições – e amanhã falaremos disso – reveladoras de hesitações ou de cumplicidade com determinadas realidades financeiras do Estado que parecem passar ao lado de tudo o que tem sido feito noutros níveis, nomeadamente com as Regiões Autónomas, os Municípios e alguns departamentos governamentais.
Luís Filipe Malheiro (in "Jornal da Madeira", 27 de Fevereiro de 2008)
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