Opinião: MADEIRA E A POBREZA (II)
Eu já tive oportunidade de referir, e reafirmo, a propósito da pobreza, que nunca ouvirão dizer-me que na Madeira, ou nos Açores, ou em Portugal, ou na Europa, seja onde quiserem, que não existe pobreza. Mais, para além de não cometer essa bárbara hipocrisia, creio que no modelo actual da sociedade em que vivemos, dificilmente alguma vez poderemos sonhar, como seria desejável, com uma sociedade sem pobreza, sem carências humanas graves, uma sociedade onde todos os que nela vivem tenham direito à dignidade e ao acesso de condições para viverem sem privações que muitas vezes resultam da incúria e da justiça dos próprios homens em relação aos seus pares. E quando essas privações, particularmente a pobreza e a fome, atingem de uma forma mais acentuada mulheres, crianças e idosos, o sentimento de revolta aumenta também, porque é nesses momentos que nos apercebemos que, provavelmente, em vez de apontarmos ao dedo à sociedade em geral, deveríamos começar por olhar para cada um de nós, e sabe até que ponto somos agentes propagadores da solidariedade humana no combate a essas situações miseráveis repugnantes. Mas continuo sem perceber como é que se quantificam os pobres, seja na Madeira, seja em que parte for, se os 50 mil que o Bloco de Esquerda, por exemplo, diz existirem, se os 80 mil que o PCP garante haver, embora remetendo a origem da informação para as conclusões de um estudo feito por docentes universitários partindo dos indicadores constantes do chamado “Inquérito aos Orçamentos Familiares, 2000”, do INE.
Mantenho a opinião de que a pobreza, tal como a fome e todas as demais formas de sofrimento humano que indignificam qualquer sociedade e os homens que nela mais responsabilidades têm e que, por isso e por circunstâncias várias, mais solidários deveriam ser, não podem ser objecto de indecorosos aproveitamentos políticos ou manipulações partidárias, seja de quem for, partidos, pessoas ou instituições, assim como não são uma “reserva moral destinada a um partido que se incomoda muito quando os demais abordam essa temática.
Clarificada esta questão preliminar, e dando continuidade do meu texto de ontem sobre este tema, gostaria de recordar o que dizem os autores do tal estudo no capítulo “Padrões de Territorialização”, no qual foram quantificados, com base em diversas projecções, os supostos valores totais da pobreza nas diferentes regiões nacionais: “O fenómeno da pobreza encontra-se disseminado pelo território nacional. Contudo podemos verificar a existência de espaços de maior concentração de grupos pobres, onde se aglomeram as categorias mais vulneráveis: trabalhadores de baixos salários, famílias monoparentais, isolados, idosos pensionistas, pessoas de menores qualificações, grupos com orientações culturais mais ou menos marginais. Desta forma, devido à escassez de recursos e a um sentimento de afinidade das opções tomadas face a oportunidades de residência efectivas, estas populações acabam por ocupar áreas desfavorecidas. Estas áreas são particularmente visíveis quando têm a forma de bairros degradados que contrastam com o meio urbano e semi-urbano, ao contrário do que se passa com as áreas rurais deprimidas do interior mais “diluídas na paisagem”. O meio rural apresenta uma incidência da pobreza de 29,4%, estando este valor acima da média nacional em 9 pontos percentuais e significando mais do dobro do mesmo valor para o meio urbano. As zonas semi-urbanas encontram-se mais perto da média, com 18,8% daquela taxa. Contudo, é necessário olhar a importância deste fenómeno nos diferentes territórios, pois nas zonas urbanas residem cerca de 40% das pessoas e famílias pobres, contra 35% em zonas semi-urbanas e 25% em meio rural. Ao analisar os contornos da pobreza em Portugal devemos ter em atenção o facto de nem sempre as regiões onde se regista uma maior intensidade do fenómeno serem aquelas onde se encontra um maior número absoluto de pessoas nesta situação. O caso das Regiões Autónomas é disso prova evidente. Sendo as mais afectadas pelo risco de pobreza, o peso dessas regiões no conjunto dos pobres em Portugal não ultrapassa os 4%. Em situação semelhante se encontra o Algarve, Alentejo e Centro, com 25%, 22,5% e 24% de risco de pobreza, todos superiores à média. Nos dois primeiros casos a contribuição para o número de pobres nacionais é de apenas 4,8% e 8,8% respectivamente. Já a região Centro abarca um quarto dos pobres em Portugal. Por sua vez, com o maior número de pobres, 36,4% do total do país, está a região Norte, onde a taxa de pobreza monetária se encontra próxima da média. Por fim, Lisboa ocupa a terceira posição relativamente ao número de pobres do total nacional, chegando a mais de 319 mil pessoas pobres, muito embora a taxa de pobreza se situe nos 12%, inferior à média nacional”. É logo depois que aparece o tal quadro - "Risco de pobreza e população pobre nas regiões em Portugal" - elaborado com base no tal “Inquérito aos Orçamentos Familiares, 2000" – que, somando vários itens, aponta para os seguinte valores de pobreza:
· TOTAL do país, 1.853.745 pobres (numa população residente de 10.356.117)
· NORTE, 663.712 (3.687.293)
· CENTRO, 434.453 (2.348.397)
· LISBOA, 332.731 (2.661.850)
· ALENTEJO, 170.849 (776.585)
· ALGARVE, 92.876 (395.218)
· AÇORES, 84.617 (241.763)
· MADEIRA, 80.854 (245.011)
E acrescentam os autores do estudo: "Medindo a pobreza tendo por base o total dos rendimentos e não apenas os rendimentos monetários, mantém-se a estrutura apresentada. O risco de pobreza total desce 1,3 pontos percentuais, o que mostra o impacto dos rendimentos não monetários sobretudo nas regiões Centro, Norte e Algarve. O risco de pobreza apenas é agravado, tendo em conta os rendimentos totais, na região dos Açores”.
Tal como em Lisboa o PCP nem esperou pelos resultados de negociações sobre as alterações ao Código de Trabalho para avançar com uma Moção de Censura ao governo socialista (mas esse problema não me diz respeito...), na Madeira, o PCP tomou idêntica decisão contra o Governo Regional, não se percebendo bem com que intenção: se a de apresentar soluções (!) para resolver a pobreza - porventura usando o mesmo modelo da ex-URSS e países da antiga Cortina de Ferro, nos quais não existiam milhões de pessoas em situação de pobreza e de fome extrema só denunciada quando o Muro caiu… - se para criticar uma política regional, se para contestar algum departamento em particular, etc.
Mantenho a opinião de que a pobreza, tal como a fome e todas as demais formas de sofrimento humano que indignificam qualquer sociedade e os homens que nela mais responsabilidades têm e que, por isso e por circunstâncias várias, mais solidários deveriam ser, não podem ser objecto de indecorosos aproveitamentos políticos ou manipulações partidárias, seja de quem for, partidos, pessoas ou instituições, assim como não são uma “reserva moral destinada a um partido que se incomoda muito quando os demais abordam essa temática.
Clarificada esta questão preliminar, e dando continuidade do meu texto de ontem sobre este tema, gostaria de recordar o que dizem os autores do tal estudo no capítulo “Padrões de Territorialização”, no qual foram quantificados, com base em diversas projecções, os supostos valores totais da pobreza nas diferentes regiões nacionais: “O fenómeno da pobreza encontra-se disseminado pelo território nacional. Contudo podemos verificar a existência de espaços de maior concentração de grupos pobres, onde se aglomeram as categorias mais vulneráveis: trabalhadores de baixos salários, famílias monoparentais, isolados, idosos pensionistas, pessoas de menores qualificações, grupos com orientações culturais mais ou menos marginais. Desta forma, devido à escassez de recursos e a um sentimento de afinidade das opções tomadas face a oportunidades de residência efectivas, estas populações acabam por ocupar áreas desfavorecidas. Estas áreas são particularmente visíveis quando têm a forma de bairros degradados que contrastam com o meio urbano e semi-urbano, ao contrário do que se passa com as áreas rurais deprimidas do interior mais “diluídas na paisagem”. O meio rural apresenta uma incidência da pobreza de 29,4%, estando este valor acima da média nacional em 9 pontos percentuais e significando mais do dobro do mesmo valor para o meio urbano. As zonas semi-urbanas encontram-se mais perto da média, com 18,8% daquela taxa. Contudo, é necessário olhar a importância deste fenómeno nos diferentes territórios, pois nas zonas urbanas residem cerca de 40% das pessoas e famílias pobres, contra 35% em zonas semi-urbanas e 25% em meio rural. Ao analisar os contornos da pobreza em Portugal devemos ter em atenção o facto de nem sempre as regiões onde se regista uma maior intensidade do fenómeno serem aquelas onde se encontra um maior número absoluto de pessoas nesta situação. O caso das Regiões Autónomas é disso prova evidente. Sendo as mais afectadas pelo risco de pobreza, o peso dessas regiões no conjunto dos pobres em Portugal não ultrapassa os 4%. Em situação semelhante se encontra o Algarve, Alentejo e Centro, com 25%, 22,5% e 24% de risco de pobreza, todos superiores à média. Nos dois primeiros casos a contribuição para o número de pobres nacionais é de apenas 4,8% e 8,8% respectivamente. Já a região Centro abarca um quarto dos pobres em Portugal. Por sua vez, com o maior número de pobres, 36,4% do total do país, está a região Norte, onde a taxa de pobreza monetária se encontra próxima da média. Por fim, Lisboa ocupa a terceira posição relativamente ao número de pobres do total nacional, chegando a mais de 319 mil pessoas pobres, muito embora a taxa de pobreza se situe nos 12%, inferior à média nacional”. É logo depois que aparece o tal quadro - "Risco de pobreza e população pobre nas regiões em Portugal" - elaborado com base no tal “Inquérito aos Orçamentos Familiares, 2000" – que, somando vários itens, aponta para os seguinte valores de pobreza:
· TOTAL do país, 1.853.745 pobres (numa população residente de 10.356.117)
· NORTE, 663.712 (3.687.293)
· CENTRO, 434.453 (2.348.397)
· LISBOA, 332.731 (2.661.850)
· ALENTEJO, 170.849 (776.585)
· ALGARVE, 92.876 (395.218)
· AÇORES, 84.617 (241.763)
· MADEIRA, 80.854 (245.011)
E acrescentam os autores do estudo: "Medindo a pobreza tendo por base o total dos rendimentos e não apenas os rendimentos monetários, mantém-se a estrutura apresentada. O risco de pobreza total desce 1,3 pontos percentuais, o que mostra o impacto dos rendimentos não monetários sobretudo nas regiões Centro, Norte e Algarve. O risco de pobreza apenas é agravado, tendo em conta os rendimentos totais, na região dos Açores”.
Tal como em Lisboa o PCP nem esperou pelos resultados de negociações sobre as alterações ao Código de Trabalho para avançar com uma Moção de Censura ao governo socialista (mas esse problema não me diz respeito...), na Madeira, o PCP tomou idêntica decisão contra o Governo Regional, não se percebendo bem com que intenção: se a de apresentar soluções (!) para resolver a pobreza - porventura usando o mesmo modelo da ex-URSS e países da antiga Cortina de Ferro, nos quais não existiam milhões de pessoas em situação de pobreza e de fome extrema só denunciada quando o Muro caiu… - se para criticar uma política regional, se para contestar algum departamento em particular, etc.
Luís Filipe Malheiro (in Jornal da Madeira, 07 de Maio de 2008)
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