Opinião: Uma visita...
Li recentemente num jornal local uma curiosa noticia intitulada “Ninguém desafiou Sócrates para visitar a Madeira”, que não deixa de ser intrigante na medida em que, por um lado, porque estes assuntos não se resolvem nos jornais, por outro, os convites não precisam de “intermediários” (ou se fazem directamente ou não se fazem), por outro uma cosia são visitas de carácter partidário outra coisa são visitas institucionais que precisam de se preparadas para que delas resultem efeitos concretos e porque, finalmente, se bem me lembro, o próprio Alberto João Jardim, durante a recente visita oficial de Cavaco Silva à Madeira, afirmou publicamente o interesse e a utilidade de uma deslocação oficial de Sócrates à Madeira. Revela o jornalista autor da notícia, citando o próprio primeiro-ministro: "ao contrário. Ninguém me falou nisso". Esta foi a resposta fugidia de José Sócrates quando questionado sobre a eventualidade de ter sido desafiado pelos madeirenses residentes na Venezuela a visitar brevemente a Região”. A verdade é que o jornalista reconheceu que parece existir da parte do primeiro-ministro vontade de uma deslocação oficial à Madeira.
O jornal em questão acrescentava que o gabinete de José Sócrates “trabalha para que a visita ocorra, mas de forma a que o poder regional não tenha interferências no programa, nem motivos para exibicionismos de Jardim e seus pares à custa do Chefe do Governo. "Deve ser um momento de Estado". Confesso que não percebi. Organizar uma visita sem interferências de Jardim? Nesse caso Sócrates resolve vir à Madeira por sua iniciativa e faz ele próprio o programa? Mas quem é que, neste contexto, obriga o executivo regional, e todos os serviços directa ou indirectamente dependentes do executivo, bem como as autarquias, a se envolverem na visita? Ou estarão a falar, pretensamente, apenas uma visita de afirmação da tutela colonial do governo de Lisboa sobre os serviços existentes na região e que ainda dependem da República. As coisas não são como muitas vezes se noticia, pelo simples facto de que institucionalmente não funcionam assim.
Sócrates, por exemplo, foi recentemente à Venezuela, assinar não sei quantos acordos com Chávez. Será que o primeiro-ministro não cumpriu o programa que o presidente venezuelano lhe pôs na mesa para se servir, ressalvando a parte que envolveu as comunidades? Será que Chávez, uma vez mais (lembram-se que ele até usou numa campanha eleitoral um cartaz em que ele aparecia a cumprimentar Sócrates numa altura em que estava completamente isolado perante os países ocidentais facto que originou a reacção incomodada de Lisboa?) Será que nesta visita não houve exibicionismo de Chávez e dos seus pares? Ou teremos que voltar a ver as reportagens televisivas (as emitidas e as outras que foram deliberadamente “arquivadas”…) da visita? E Chávez, só por acusa do petróleo, é um exemplo inquestionável de um líder verdadeiramente democrático, respeitador dos direitos da oposição (veja-se a televisão encerrada pelo simples facto de que o incomodava) e que está totalmente desligado do poder (veja a tentativa de referendar uma Constituição que visava mantê-lo no poleiro por tempo indeterminado). Marcelo Caetano tinha na RTP as ais “Conversas em Família”. Alguns ainda se lembrarão. E Chávez que tem o seu programa “Alô Presidente” (que chega a demorar 5 e 6 horas!)? A rapaziada do gabinete do primeiro-ministro teve algum protagonismo ou poder de decisão neste programa da visita? O jornalismo também precisa destas cosas, de confrontar as pessoas com situações reais, de colocar em evidência esta diferenciação de atitudes. Na Venezuela, bico calado porque precisavam dos papéis assinados. Mas em relação à Madeira, já recuperam o pio e com ou sem fundamento – eu acredito no que os jornalistas escrevem, mas não acredito em todas as fontes de informação. Voltemos às questões sérias.
Para que se evitem confusões, quero desde já salientar que considero que seria importante para a Madeira e para o relacionamento institucional desta com o Governo da República, uma visita oficial do primeiro-ministro. Entendo, seja-me permitido, que no actual quadro político e parlamentar, regional e nacional – e não consigo deixar de ser pragmático e realista – existem "pontes" que terão que ser lançadas e mantidas, discretamente, longe do mediatismo comunicacional, mas que sejam eficazes, funcionais, que pugnem pela seriedade do relacionamento institucional. Dando continuidade ao trabalho já realizado, ou explorando novas potencialidades, para que essa reaproximação seja possível. Eu sei que entre Alberto João Jardim e José Sócrates – provavelmente também por uma questão de feitio, dirão alguns, mas sobretudo por razões de ordem política – dificilmente os veremos remar para o mesmo lado ou envolvimentos num sintonia total. Nem a isso são obrigados, como é evidente. Ninguém obriga dois políticos de partidos diferentes – e que por razões que não vou agora recordar, cavaram entre si um fosso aparentemente intransponível – a terem que abdicar das suas diferenças e a se deixarem manipular pela hipocrisia de mostrarem ou serem o que não são. Mas o respeito pela diferença, inclusivamente de pensamento, não pode, não deve, melhor dizendo, impedir que o necessário e desejável relacionamento institucional entre a Região e a República se normalize. A Madeira sabe que nunca terá da parte de Lisboa – e no passado isso já aconteceu – tudo o que pede, aliás o mesmo aconteceu com governos do PSD no Terreiro do Paço. Mas Lisboa também sabe, provavelmente pelo passado e pela "tradição" de uma “conflitualidade” reivindicativa, que as Regiões Autónomas dificilmente deixarão de insistir em reclamar sempre mais, em nome de uma insatisfação que acredito José Sócrates aceite como perfeitamente admissível e lógica.
Portanto, e ressalvando esta questão preliminar, acho que José Sócrates deveria visitar a Madeira, tendo por base um programa oficial que não seja um instrumento gerador de conflitos, elaborado à margem dos legítimos órgãos de governo próprio, democrática e livremente eleitos pelos madeirenses, mas antes procurando, tanto quanto possível, conciliar várias ideias, sem hostilizar a legitimidade do voto popular na região. A mesma legitimidade que o governo socialista, saído da actual maioria parlamentar do PS, tem por ter sido essa a vontade dos portugueses em Fevereiro de 2005. Transformar uma eventual visita oficial (?) à Madeira num novo foco de conflitualidade com a Região, ou hostilizar deliberadamente o Governo Regional, apenas por motivações político-partidárias, seria desastroso, um erro. É por tudo isto que, respeitando o trabalho do jornalista, mas duvidando da seriedade e da competência das suas fontes, que recuso acreditar na existência de alguma consistência nas declarações dessas "fontes governamentais".
Foi neste quadro que li que JCG Gouveia, abordando o assunto, garantiu que a agenda do PS-Madeira é independente da do secretário-geral do PS. Mas lá foi dizendo, inevitavelmente tinha de o dizer, que Sócrates não precisa de vir à Madeira fazer o que Cavaco fez, retomando as críticas habituais a Jardim e à política regional. Eu estou desejoso de ver o que vai acontecer a Gouveia em 2009, em São Vicente, onde será candidato, para ficarmos a saber se algum líder, que não ganha no seu concelho, terá a coragem de tomar a atitude adequada, por não poder continuar a liderar um partido que aspira a voos mais altos.
O jornal em questão acrescentava que o gabinete de José Sócrates “trabalha para que a visita ocorra, mas de forma a que o poder regional não tenha interferências no programa, nem motivos para exibicionismos de Jardim e seus pares à custa do Chefe do Governo. "Deve ser um momento de Estado". Confesso que não percebi. Organizar uma visita sem interferências de Jardim? Nesse caso Sócrates resolve vir à Madeira por sua iniciativa e faz ele próprio o programa? Mas quem é que, neste contexto, obriga o executivo regional, e todos os serviços directa ou indirectamente dependentes do executivo, bem como as autarquias, a se envolverem na visita? Ou estarão a falar, pretensamente, apenas uma visita de afirmação da tutela colonial do governo de Lisboa sobre os serviços existentes na região e que ainda dependem da República. As coisas não são como muitas vezes se noticia, pelo simples facto de que institucionalmente não funcionam assim.
Sócrates, por exemplo, foi recentemente à Venezuela, assinar não sei quantos acordos com Chávez. Será que o primeiro-ministro não cumpriu o programa que o presidente venezuelano lhe pôs na mesa para se servir, ressalvando a parte que envolveu as comunidades? Será que Chávez, uma vez mais (lembram-se que ele até usou numa campanha eleitoral um cartaz em que ele aparecia a cumprimentar Sócrates numa altura em que estava completamente isolado perante os países ocidentais facto que originou a reacção incomodada de Lisboa?) Será que nesta visita não houve exibicionismo de Chávez e dos seus pares? Ou teremos que voltar a ver as reportagens televisivas (as emitidas e as outras que foram deliberadamente “arquivadas”…) da visita? E Chávez, só por acusa do petróleo, é um exemplo inquestionável de um líder verdadeiramente democrático, respeitador dos direitos da oposição (veja-se a televisão encerrada pelo simples facto de que o incomodava) e que está totalmente desligado do poder (veja a tentativa de referendar uma Constituição que visava mantê-lo no poleiro por tempo indeterminado). Marcelo Caetano tinha na RTP as ais “Conversas em Família”. Alguns ainda se lembrarão. E Chávez que tem o seu programa “Alô Presidente” (que chega a demorar 5 e 6 horas!)? A rapaziada do gabinete do primeiro-ministro teve algum protagonismo ou poder de decisão neste programa da visita? O jornalismo também precisa destas cosas, de confrontar as pessoas com situações reais, de colocar em evidência esta diferenciação de atitudes. Na Venezuela, bico calado porque precisavam dos papéis assinados. Mas em relação à Madeira, já recuperam o pio e com ou sem fundamento – eu acredito no que os jornalistas escrevem, mas não acredito em todas as fontes de informação. Voltemos às questões sérias.
Para que se evitem confusões, quero desde já salientar que considero que seria importante para a Madeira e para o relacionamento institucional desta com o Governo da República, uma visita oficial do primeiro-ministro. Entendo, seja-me permitido, que no actual quadro político e parlamentar, regional e nacional – e não consigo deixar de ser pragmático e realista – existem "pontes" que terão que ser lançadas e mantidas, discretamente, longe do mediatismo comunicacional, mas que sejam eficazes, funcionais, que pugnem pela seriedade do relacionamento institucional. Dando continuidade ao trabalho já realizado, ou explorando novas potencialidades, para que essa reaproximação seja possível. Eu sei que entre Alberto João Jardim e José Sócrates – provavelmente também por uma questão de feitio, dirão alguns, mas sobretudo por razões de ordem política – dificilmente os veremos remar para o mesmo lado ou envolvimentos num sintonia total. Nem a isso são obrigados, como é evidente. Ninguém obriga dois políticos de partidos diferentes – e que por razões que não vou agora recordar, cavaram entre si um fosso aparentemente intransponível – a terem que abdicar das suas diferenças e a se deixarem manipular pela hipocrisia de mostrarem ou serem o que não são. Mas o respeito pela diferença, inclusivamente de pensamento, não pode, não deve, melhor dizendo, impedir que o necessário e desejável relacionamento institucional entre a Região e a República se normalize. A Madeira sabe que nunca terá da parte de Lisboa – e no passado isso já aconteceu – tudo o que pede, aliás o mesmo aconteceu com governos do PSD no Terreiro do Paço. Mas Lisboa também sabe, provavelmente pelo passado e pela "tradição" de uma “conflitualidade” reivindicativa, que as Regiões Autónomas dificilmente deixarão de insistir em reclamar sempre mais, em nome de uma insatisfação que acredito José Sócrates aceite como perfeitamente admissível e lógica.
Portanto, e ressalvando esta questão preliminar, acho que José Sócrates deveria visitar a Madeira, tendo por base um programa oficial que não seja um instrumento gerador de conflitos, elaborado à margem dos legítimos órgãos de governo próprio, democrática e livremente eleitos pelos madeirenses, mas antes procurando, tanto quanto possível, conciliar várias ideias, sem hostilizar a legitimidade do voto popular na região. A mesma legitimidade que o governo socialista, saído da actual maioria parlamentar do PS, tem por ter sido essa a vontade dos portugueses em Fevereiro de 2005. Transformar uma eventual visita oficial (?) à Madeira num novo foco de conflitualidade com a Região, ou hostilizar deliberadamente o Governo Regional, apenas por motivações político-partidárias, seria desastroso, um erro. É por tudo isto que, respeitando o trabalho do jornalista, mas duvidando da seriedade e da competência das suas fontes, que recuso acreditar na existência de alguma consistência nas declarações dessas "fontes governamentais".
Foi neste quadro que li que JCG Gouveia, abordando o assunto, garantiu que a agenda do PS-Madeira é independente da do secretário-geral do PS. Mas lá foi dizendo, inevitavelmente tinha de o dizer, que Sócrates não precisa de vir à Madeira fazer o que Cavaco fez, retomando as críticas habituais a Jardim e à política regional. Eu estou desejoso de ver o que vai acontecer a Gouveia em 2009, em São Vicente, onde será candidato, para ficarmos a saber se algum líder, que não ganha no seu concelho, terá a coragem de tomar a atitude adequada, por não poder continuar a liderar um partido que aspira a voos mais altos.
Sócrates, ao contrário do que os seus correligionários locais julgam, sabe mais do que eles, tem objectivos para 2009 que nada têm a ver com os socialistas locais, manterá um comportamento político que é determinado em função de metas estabelecidas, num contexto conjuntural onde não acredito que o PS da Madeira, sobretudo depois de Maio de 2007 e da copiosa derrota sofrida, tenha qualquer influência. Acredito que Sócrates sabe que tem duas opões: ou deixa-se aliciar pelas alegadas “pontes” que precisam de ser construídas, porque é intolerável manter esta situação ou parte para o ciclo eleitoral de 2009, mantendo uma atitude de hostilização propositada relativamente à Madeira, o que significará, não duvidem, que o PS local vai continuar a sofrer as consequências disso. Por isso, tenho dificuldade em entender a estratégia de JCG e do PS local: será que depois de Maio de 2007, do que lhes aconteceu nas urnas, ainda não entenderam as causas desse desaire?
Luís Filipe Malheiro (in Jornal da Madeira, 21 de Maio de 2008)
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