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segunda-feira, 28 de maio de 2007

Artigo: Europa II

Quando há dias assumi as minhas reservas relativamente às tentativas, em, Portugal, de imposição aos portugueses de um modelo de Constituição europeia, sem que os portugueses se possam pronunciar - atitude que revela, mais do que o medo pelos resultados de uma consulta popular, a apologia de comportamentos e de concepções perfeitamente anti-democráticas e intoleráveis - quis sobretudo sustentar que continua a existir um enorme desconhecimento relativamente à realidade europeia e que, provavelmente, nem mesmo esta presidência portuguesa da União Europeia inverterá um distanciamento que a abstenção os sucessivos actos eleitorais para o Parlamento Europeu, revelam estar a crescer.
Mas sou um europeísta convicto, em grande medida pela percepção que tenho que num mundo a caminho da globalização extrema, só uma Europa unida conseguirá manter-se com a competitividade e com o protagonismo e o poder de decisão que salvaguardará os nossos interesses colectivos. É neste quadro, por um lado de desejo de uma Europa consolidada, mas também, por outro, de reconhecimento que várias oportunidades foram perdidas e desafios desaproveitados, que me situo. Tenho a absoluta consciência, até por declarações já proferidas por governantes portugueses, que a problemática da Constituição Europeia volta a estar na primeira linha das preocupações dos dirigentes europeus e na agenda política da presidência portuguesa da União. Mas quando se fala na Constituição europeia, fala-se num Tratado que tem gerado muita polémica, causado divergências e mantido, lamentavelmente, as pessoas longe do debate que inevitavelmente terá que ter lugar. Sei que uma esmagadora percentagem de cidadãos europeus, não têm a noção do ponto da situação, nem do que falamos.
Neste momento a França (a Constituição Europeia foi referendada em Maio de 2005 mas 55% dos franceses votaram “não”) e a Holanda (60% dos holandeses disseram “não” no referendo) rejeitaram o Tratado proposto, e outros países que optaram pelo referendo decidiram “travar” o processo de consulta para impedirem qualquer ricochete. República Checa, Dinamarca, Irlanda, Polónia, Portugal e Suécia têm a ratificação do Tratado atrasada, e em todos eles, essa situação resulta do receio das implicações dos resultados dos referendos francês e holandês. Quanto à Alemanha, o parlamento alemão ratificou a Constituição em Maio de 2005, mas continua pendente um recurso para o Tribunal Constitucional alemão. A Eslováquia encontra-se na mesma situação. Já ratificaram o Tratado a Finlândia (parlamento, de Dezembro de 2006), Bélgica (parlamento, de Junho de 2006), Áustria (duas câmaras do parlamento austríaco, Maio de 2005), Chipre (parlamento cipriota ratificou em Junho de 2005), Estónia (parlamento, Maio de 2006), Grécia (parlamento, Abril de 2005), Hungria (parlamento, Dezembro de 2004), Itália (parlamento, Abril de 2005), Letónia (parlamento, Junho de 2005), Lituânia (o primeiro país a ratificar o Tratado Constitucional Europeu, Novembro de 2004, no parlamento), Luxemburgo (em referendo, Julho de 2005, com 56% no “sim”), Malta (parlamento, Julho de 2005) e Eslováquia (parlamento, Maio de 2005), Eslovénia (parlamento, Fevereiro de 2005) e Espanha (referendo consultivo, Fevereiro de 2005, com 77% no ”sim”, mas 58% de abstenção).
A este propósito, recordo que um estudo da Universidade de Cambridge (realizado em mais de 180 regiões em 15 Estados-membros da União e abrangendo mais de 20 mil pessoas), revelou que os portugueses e os italianos “são os europeus menos felizes e menos satisfeitos com a sua vida num grupo de quinze Estados-membros da União Europeia”. O estudo continha perguntas como o nível de confiança que os inquiridos têm nas pessoas que as rodeiam, na sociedade em geral, na polícia, no sistema legal e nos respectivos governos. Uma das possíveis explicações para este descontentamento pode ter a ver, por exemplo, e segundo os autores, com o facto de que entre 2002 e 2004 Portugal “era o país com o salário per capita mais baixo dos 15 analisados". Numa escala de felicidade de zero a dez, o Algarve “aparecia como a zona mais feliz do país com 6,90 pontos, seguindo-se o Norte com 6,69, e o Alentejo com 6,57. O centro de Portugal (6,43) e a região de Lisboa e Vale do Tejo, com 6,38, eram as regiões menos felizes do país”. Segundo o estudo, os cidadãos mais felizes e satisfeitos, eram os dinamarqueses, seguidos dos finlandeses e dos irlandeses.
É perante esta realidade -. E num próximo texto dedicarei atenção aos resultados de uma sondagem (eurobarómetro) acerca dos conhecimentos dos portugueses sobre a União Europeia!... - que entendo que a imposição política de um Tratado Constitucional, pode constituir uma atitude lamentável e reveladora da forma leviana como a problemática europeia é tratada pela classe política. E diga o que disser o Presidente da República (apologista da ratificação simplista pela Assembleia da República), há uma promessa eleitoral (do PS e de José Sócrates) que não pode ser, mais uma, atirada para o caixote do lixo.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 25 de Maio 2007

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