Artigo: A REFORMA DO TRATADO (I)
Uma das maiores hipocrisias, em crescendo na Europa, tem a ver com o facto das elites comunitárias insistirem, em determinados momentos, sobretudo quando não têm a certeza de que conseguem impor as suas ideias aos cidadãos, no poder de decisão olhado de uma forma restritiva, centrado praticamente no eixo Bruxelas-Estrasburgo, mas esquecendo que são os cidadãos europeus, ao votarem, os responsáveis pela eleição de muitos dos membros dessas alegadas elites comunitárias e europeias. Ou seja, para lhes dar tacho e penacho os cidadãos europeus são os “maiores”, porque eles precisam do seu voto. Mas quando se trata de partilhar decisões que vão afectar a Europa e cada um dos estados-membros, já não convém fazer descer a um nível tão baixo esse poder de decisão, atribuindo-lhe uma dimensão mais restritiva. E como explica essa gente este comportamento patético? Falta de informação, os europeus não percebem patavina das questões europeias, deixam-se influenciar por factores externos, acabam por votar influenciados por polémicas que não estão directamente relacionadas com o tema central em apreciação. Daí o pavor aos referendos, e a desesperada tentativa encontrarem uma explicação para o inexplicável: forçar a não realização de referendos e impor as versões que forem aprovadas em cimeiras europeias. No meio de tudo isto, se existe défice de informação, a verdade é que não se vê grande interesse em propiciar mais informação às pessoas, pelo contrario, as presidências da União são utilizadas ou como instrumentos de propaganda pelos governos ou como trampolins para protagonismos pessoais que muitas vezes têm mais a ver com disputas políticas internas do que com os interesses dos europeus ou o futuro da Europa. Nesse contexto, porque me parece que a informação veiculada foi insuficiente, recordo o que o comunicado da última Cimeira Europeia, realizada em Bruxelas, referiu sobre as novas iniciativas destinadas a encontrar uma nova versão de Tratado Europeu do qual ninguém sabe ainda rigorosamente nada de concreto: “O Conselho Europeu concorda que, passados dois anos de incerteza sobre o processo de reforma dos Tratados da União, é chegado o momento de resolver esta questão e de a União avançar. O período de reflexão que passou constituiu uma oportunidade para realizar um debate público alargado e ajudou a preparar as bases de uma solução. Com esse objectivo, o Conselho Europeu acorda em convocar um Conferência Intergovernamental e convida a Presidência a tomar sem demora as medidas necessárias nos termos do Tratado, na perspectiva de inaugurar a CIG até ao final de Julho, logo que estejam cumpridos todos os requisitos legais. A CIG levará a cabo os seus trabalhos de harmonia com o mandato definido. O Conselho Europeu convida a próxima Presidência a redigir um projecto de Tratado de acordo com os termos do mandato e a apresentá‑lo à CIG logo que esta for inaugurada. A CIG concluirá os trabalhos o mais rapidamente possível, e de qualquer modo antes do fim do ano de 2007, de forma a que reste tempo suficiente para proceder à ratificação do Tratado que dela resultar antes das eleições para o Parlamento Europeu de Junho de 2009.A CIG será conduzida sob a responsabilidade geral dos Chefes de Estado e de Governo, assistidos pelos membros do Conselho (Assuntos Gerais e Relações Externas). O Representante da Comissão tomará parte na Conferência. O Parlamento Europeu será estreitamente associado e envolvido nos trabalhos da Conferência. O necessário apoio de secretariado será fornecido pelo Secretariado‑Geral do Conselho. Tendo consultado o Presidente do Parlamento Europeu, o Conselho Europeu convida o Parlamento Europeu, por forma a preparar a resolução do problema da sua futura composição a tempo das eleições de 2009, a apresentar um projecto da iniciativa prevista até Outubro de 2007. A próxima Presidência é convidada a assegurar que os países candidatos sejam plenamente informados, com regularidade, ao longo de toda a Conferência Intergovernamental”. Curiosa a preocupação dos líderes europeus com as questões económicas: “Consolidar as quatro liberdades do mercado interno (liberdade de circulação de bens, pessoas, serviços e capitais) e melhorar o seu funcionamento continuam a ser factores de primordial importância em termos de crescimento, competitividade e emprego. O Conselho Europeu aguarda com expectativa que a Comissão apresente, no próximo Outono, a sua análise sobre o Mercado Único, acompanhada das devidas propostas, e apela ao Conselho e ao Parlamento Europeu para que progridam rapidamente no que respeita aos regulamentos "nova abordagem" e "reconhecimento mútuo", sem prejuízo da harmonização das regras técnicas nacionais, sempre que adequado”. E no domínio da política social: “ haverá que prosseguir com determinação os trabalhos de coordenação dos sistemas de segurança social, a fim de encerrar, logo que possível, os principais capítulos ainda em aberto. O Conselho Europeu aguarda com expectativa a próxima Comunicação da Comissão sobre flexissegurança, com base na qual poderão ser acordados princípios comuns antes do final do corrente ano, e congratula‑se com os progressos alcançados no que respeita à estratégia da inclusão activa. O Conselho Europeu aguarda com igual expectativa a apresentação de uma proposta alterada referente à directiva relativa aos requisitos mínimos para uma maior mobilidade dos trabalhadores, melhorando a aquisição e a manutenção dos direitos à pensão complementar que sirva de base à prossecução dos trabalhos nesta matéria. Solicita‑se aos Estados‑Membros que implementem rapidamente a estratégia comunitária para 2007‑2012 no domínio da saúde e da segurança no trabalho, recentemente adoptada, que reforçará a abordagem global no que respeita ao bem‑estar no trabalho e relançará políticas de prevenção e melhorias para os trabalhadores. O Conselho Europeu convida os Estados‑Membros, a Comissão e os parceiros sociais a recorrerem eficazmente à Aliança para as Famílias, a fim de fomentar a adopção de boas práticas e de abordagens inovadoras em relação às políticas a favor da família, coerentes com a política pública nacional dos Estados‑Membros e a promoverem a igualdade entre homens e mulheres. O Conselho Europeu aguarda com expectativa o próximo relatório da Comissão sobre a avaliação da realidade social”.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 12 de Julho 2007
Jornal da Madeira, 12 de Julho 2007
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