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segunda-feira, 30 de julho de 2007

Artigo: A REFORMA DO TRATADO (III)

Antes da Cimeira de Bruxelas, de Junho passado, já o presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, tinha rejeitado que o futuro Tratado da União fosse qualificado de "minimalista" ou de "maximalista": "Será o Tratado que a União Europeia precisa para actuar e enfrentar os desafios da globalização".
Mas afinal, quais os motivos dos pavores que parecem reinar entre a classe política e a estrutura de topo da nomenclatura do poder em Lisboa? Embora não o assumam – nem assumirão – é óbvio que os governantes portugueses temem que a opção por um referendo sobre o tema, em concreto, do Tratado Europeu, possa confundir-se, por causa de “desvios” ou de outras “interferências”, com outros temas, porventura mais interessantes para a opinião pública portuguesa. E como se tudo isto não bastasse, existem indicadores recentes que mostram um desconhecimento cultural em torno do tema europeu, que não pode ser ignorado, mas cujas responsabilidades por esse défice informativo, cabem aos partidos, aos políticos e às instituições políticas e governamentais e/ou parlamentares.
Para que percebam do que estou a falar e da situação em que se encontram os portugueses, sempre que se fala na União Europeia, recordo uma sondagem recente que indicava que um quarto dos portugueses nem sabia quantos membros tem a União, embora a maioria acredite nos benefícios da próxima presidência. Entre os portugueses que responderam, mais de metade deram uma resposta errada. Apenas 17,3% acertaram no actual número de países-membros. Questionados sobre qual o país que consideram ter presentemente mais poder na Europa, mais de 39% indicaram a Alemanha, seguindo-se a Inglaterra (11%) e a França (10,9%). Mesmo assim, o que é facto é que uma minoria (mais de 2%), dos inquiridos “voltou a mostrar assinalável ignorância (ou sentido de humor?) indicando os Estados Unidos da América como o país com mais poder actualmente na Europa”. As restantes questões da sondagem - todas relacionadas com Portugal - mostraram uma “grande confiança dos inquiridos na capacidade das autoridades portuguesas para presidirem à União e que daí retirariam vantagens”. Quanto ao poder de Portugal no conjunto da União, mais de 41% disseram que ele vai sair reforçado, mas mais de 40% entende que a presidência não terá nenhuma influência. Isto explica que 44% tenha afirmado que a presidência portuguesa será benéfica para Portugal, contra 34% que dizem que ela não terá influência nenhuma.
De que alterações ao Tratado estamos a falar? Basicamente das seguintes, muito resumidamente, apoiando-me no próprio comunicado final da Cimeira de Bruxelas:
- Na cláusula n.º 1 do Tratado Reformador serão incluídas as alterações ao actual TUE;
- O TUE será dividido em 6 títulos: Disposições comuns (I), Disposições relativas aos princípios democráticos (II), Disposições relativas às instituições (III), Disposições relativas à cooperação reforçada (IV), Disposições gerais relativas à acção externa da União e disposições específicas relativas à política externa e de segurança comum (V), e Disposições finais (VI). Os Títulos I, IV (actual VII), V e VI (actual VIII) obedecem à estrutura do actual TUE, com as alterações acordadas na CIG de 2004. Os dois títulos restantes (II e III) são novos, introduzindo as inovações acordadas na CIG de 2004;
- O Título I do actual TUE – que compreende, entre outros, artigos sobre os valores e os objectivos da União, sobre as relações entre a União e os Estados­‑Membros e sobre a suspensão dos direitos dos Estados­‑Membros – será alterado de acordo com as inovações acordadas na CIG de 2004;
- O artigo relativo aos direitos fundamentais remeterá para a Carta dos Direitos Fundamentais acordada na CIG de 2004, conferindo­‑lhe valor juridicamente vinculativo e definindo o seu âmbito de aplicação;
- No artigo sobre os princípios fundamentais especificar­‑se­‑á, no tocante às competências, que a União actua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados­‑Membros lhe tenham atribuído nos Tratados;
- Será alargado de 6 para 8 semanas o prazo de que dispõem os Parlamentos nacionais para analisar os projectos de actos legislativos e emitir um parecer fundamentado sobre a observância do princípio da subsidiariedade (serão alterados em conformidade os Protocolos relativos aos Parlamentos nacionais e à subsidiariedade e proporcionalidade, respectivamente);
- Será estabelecido um mecanismo de controlo reforçado da subsidiariedade segundo o qual, caso um projecto legislativo seja contestado por maioria simples dos votos atribuídos aos Parlamentos nacionais, a Comissão deverá reanalisar o projecto, podendo decidir mantê­‑lo, alterá­‑lo ou retirá­‑lo. Se optar por manter o projecto, a Comissão deverá especificar, em parecer fundamentado, a razão pela qual entende que o mesmo obedece ao princípio da subsidiariedade. O parecer fundamentado da Comissão, bem como os pareceres fundamentados dos Parlamentos nacionais, deverão ser enviados ao legislador da UE, para ponderação no processo legislativo;
- O papel dos Parlamentos nacionais ficará consagrado num novo artigo de carácter geral;
- Uma parte das alterações institucionais aprovadas na CIG de 2004 será integrada no TUE, sendo as restantes incorporadas no Tratado sobre o Funcionamento da União. O novo Título III dará uma panorâmica do sistema institucional, especificando as seguintes modificações institucionais ao actual sistema: artigos relativos às instituições da União, ao Parlamento Europeu (nova composição), ao Conselho Europeu (sua conversão numa instituição e criação do cargo de Presidente), ao Conselho (introdução do sistema de votação por dupla maioria e mudanças no sistema de presidências semestrais do Conselho, com possibilidade de o alterar), à Comissão Europeia (nova composição e reforço do papel do Presidente), ao [Ministro] dos Negócios Estrangeiros da União (criação do novo cargo, mudança do título para Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança) e ao Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias;
- O sistema de votação por dupla maioria, tal como acordado na CIG de 2004, produzirá efeitos em 1 de Novembro de 2014, data até à qual o actual sistema de maioria qualificada, continuará a ser aplicado. Posteriormente, durante um período transitório até 31 de Março de 2017, sempre que uma decisão deva ser adoptada por maioria qualificada, um membro do Conselho pode solicitar que a decisão seja tomada de acordo com a maioria qualificada definida no actual TCE.
Luís Filipe Malheiro

Jornal da Madeira, 23 de Julho 2007

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