PINACULOS

Opinião e coisas do nosso mundo...

quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Artigo: Encenações…

O Tribunal Constitucional deu a esperada “luz verde” à aprovação da nova Lei das Finanças Regionais, tendo votado a favor do acórdão 9 dos 13 juízes que fazem parte daquela estrutura constituída a partir da Assembleia da República e que a transforma, por isso, em apenas mais uma mera peça de um puzzle estatal, mais vasto e com múltiplos interesse de cumplicidades, o que nada tem a ver, evidentemente com a competência dos seus membros.
No momento em que escrevo este meu artigo desconheço mais pormenores, nem sequer sei o teor do acórdão. Por isso vou aguardar mais algum tempo, convicto de que estamos perante um exemplo claro do que é passar a “batata quente” de uma instituição (Tribunal Constitucional) para um órgão de soberania (Presidente da República), tudo porque falta a coragem de alguns em despirem-se de preconceitos, deixarem alguns fundamentalismos teóricos na porta da rua e perorarem de uma forma realista sobre a real amplitude e o impacto negativo de uma lei que, mesmo cumprindo os preceitos constitucionais, acaba por ter, a montante ou a jusante, outras implicações e outras componentes bem mais problemáticas e que podem ser questionáveis. Penso que esse trabalho — e não apenas o de “vigilantes” da constitucionalidade das leis.
Terminou assim, da forma que todos esperavam mais uma encenação — uma de muitas que ultimamente têm envolvido o TC. Mas deixarei os meus comentários, mais concretos, para um dia destes, quando estiver em poder de todo o acórdão emitido. De concreto sabe-se apenas que nove dos treze juízes do Tribunal subscrevem a constitucionalidade do diploma, tendo o acórdão sido feito pelo juiz relator, Bravo Serra. Lembro ainda que este pedido de fiscalização preventiva foi feito em Dezembro passado pelo PSD, alegando a existência de várias inconstitucionalidades na nova lei, aprovada no Parlamento com os votos favoráveis da maioria socialista e a abstenção do CDS-PP. Depois desta decisão favorável no TC, a Lei das Finanças Regionais segue para Belém, residindo aqui a questão mais polémica e expectante: vai o Presidente da República optar pelo veto político ou, suportando-se pelo acórdão do Tribunal Constitucional, vai promulgar uma lei — que no fundo ele defende porque mesmo como primeiro-ministro olhou sempre com desconfiança as autonomias regionais, protelando decisões que poderiam ter sido tomadas nessa altura, etc — ou seja, vai Cavaco Silva protagonizar um conflito político com o governo de Sócrates ainda mais sabendo que ao devolver à Assembleia da República, esta pode limitar-se a devolver a mesma lei, com a mesma votação, obrigando então o Presidente a promulgá-la? Mesmo que a promulgue o Governo Regional da Madeira já anunciou, e bem, que tenciona suscitar um novo processo no Tribunal Constitucional.
Aguardemos as cenas dos próximos capítulos de uma novela política que colocou a nu o descaramento do Estado, quando resolve decidir de forma sectária.

II. Por vezes, há que desmistificar ideias que podem instalar-se junto da opinião pública, porque moldadas deficientemente, mas em função das quais se fazem ou emitem juízos de valor que, depois, acabam por ter explicações facilmente perceptíveis. No caso da actividade parlamentar regional, e considerando uma notícia recentemente publicada num jornal funchalense, obviamente que o papel dos chamados “pequenos partidos” — sobretudo se estiverem na oposição e lutarem pela sua sobrevivência parlamentar e política, quase sempre de uns à custa de outros — se encontra muito mais facilitado, por exemplo comparativamente ao PSD. Se os social-democratas regionais dispõem de uma ampla maioria parlamentar, se o Governo Regional, a exemplo do Governo de Sócrates, mostra uma natural vocação para a produção legislativa, porque motivo seriam os deputados laranjas locais, tal como os deputados socialistas em São Bento, obrigados a apresentar iniciativas legislativas apenas para as estatísticas? Para esse objectivo e com essa intenção trabalham, reconhecidamente partidos regionais que se limitam a apresentar, em mais de 90% das suas iniciativas, simples recomendações transpostas para a figura do projecto de resolução, e que, nessa perspectiva, valem o que valem. E para quem está na oposição é muito fácil abrir a “fábrica” de recomendações, pedidos, sugestões, propostas e emitir projectos de resolução uns atrás dos outros. No final da Sessão Legislativa, quando tocar a fazer a tal estatística legislativa que alguns julgam que marca a diferença entre partidos ou calibra a sua influência, evidentemente que os partidos que lutam permanentemente pela sua sobrevivência aparecem lá em cima, muito bem destacados no topo da lista dos mais “produtivos”, esquecendo-se contudo que há uma componente bem mais importante — a do realismo pragmático de saber qual a eficácia (níveis de aprovação) dessa produção legislativa frenética e facilitista — que não pode ser escamoteada. E é aqui que as coisas se complicam. Por outro lado, é bom que se diga, por cada projecto de resolução apresentado há uma conferência de imprensa convocada, o que também, diga-se em abono da verdade, aumenta a amplitude do peso que realmente esses partidos têm, dando-lhes um desmesurado protagonismo na comunicação social.

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 15 de Janeiro 2007

Click for Funchal, Madeira Islands Forecast