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quarta-feira, 24 de janeiro de 2007

Artigo: Subversão

Alguma comunicação social destacou ontem o facto de ter passado um ano de eleição do actual Presidente da República, Cavaco Silva, embora apenas tenha tomado posse em Março do ano passado, e ao facto dele se ter tornado o político português mais popular, particularmente entre o eleitorado do PS. Estes dados constam de uma sondagem publicada no Correio da Manhã, a única que por ocasião daquela efeméride foi divulgada, a qual mostrou que a maioria dos portugueses, 59,2%, considera que Cavaco tem actuado bem, já que apenas 8,4% afirma que ele esteve mal. A mim estes dados não valem rigorosamente nada, em termos de consistência de uma avaliação que apenas deve ser feita mais para a frente, mais não seja pelo facto do primeiro mandado presidencial ser, essencialmente, um mandato virado para a fotogenia e para a definição das grandes linhas de actuação por parte do Chefe de Estado. Não quero um Presidente da República gerador de conflitos institucionais e políticos, muito menos num país que continua de pantanas, como o nosso. Mas também não quero um Presidente da República manietado, transformado um “pau-mandado” da maioria política que o elegeu e que porventura sonharia (?) — mal e despropositadamente — com a vitória presidencial de Cavaco para que fosse este a “picar” o governo socialista e desestabilizar a maioria parlamentar que o suporta na Assembleia da República. Como nem sequer fui eleitor ou apoiante do Presidente da República, considero-me totalmente à vontade e livre para me pronunciar sobre ele e as suas decisões e/ou comportamentos. Mas também não aceito um Presidente da República com memória curta, excessivamente colado, de forma submissa, ao Governo, provavelmente por ter a consciência da realidade política e parlamentar nacional, que o impossibilita, em meu entender, de adoptar um outro discurso, particularmente mais reivindicativo face ao trabalho do executivo, pese as ténues indicações deixadas na mensagem de Ano Novo. E não quero um Presidente com memória curta porque não aceito o paradoxo de uma subversão total da realidade eleitoral registada neste país há um ano. Cavaco andou um ano, seguramente, a levar na “tola” pela esquerda, apesar de dividida em vários candidatos presidenciais, foi o alvo preferencial de Soares — o candidato oficial do PS — foi criticado e por vezes atacado directamente por vários ministros socialistas em campanha, e, depois de eleito, por uma margem mínima, à primeira volta, ei-lo “colado” à maioria eleitoral que não o elegeu, prejudicando claramente e indirectamente — pela imagem que tão estranha “confraternização” excessiva transmite à sua base eleitoral de apoio — o PSD que foi a suja principal base de apoio na ambição pelo tacho presidencial. Eu estou-me nas tintas, absolutamente nas tintas, para o que as outras pessoas pensam ou deixam de pensar acerca do Presidente. Porque não prescindo de, em liberdade, e de acordo com o que julgo ser a realidade lamentável que entretanto se foi criando, ou por mero oportunismo dos socialistas (pela colagem que fazem ao Presidente) e por demasiada ingenuidade presidencial (pelo recurso aos elogios perfeitamente dispensáveis), criticar o que considero criticável. Isto porque, de acordo com a referida sondagem, quem mais apreciou a actuação do Presidente da República foi o eleitorado do PS, já que 67,2% dos inquiridos que votaram no PS nas últimas Legislativas de Fevereiro de 2005, consideraram que Cavaco Silva está a ter uma boa prestação. Aliás esta popularidade do cavaquismo alarga-se ao eleitorado da Esquerda — 66,4% dos eleitores do PSD aprova a actuação de Cavaco Silva, o mesmo acontecendo com 60,5% do eleitorado do Bloco de Esquerda e grande parte dos eleitores da CDU 40%. Curiosamente, o eleitorado do CDS-PP, na sua maioria, 48,3%, diz apoiar Cavaco Silva. O que é espantoso, nesta sondagem, é que a manifestação do apoio do PS a Cavaco Silva é superior ao apoio que este encontrou junto do PSD (66,4%). n P.S.: Foi ontem noticiado que Manuela Ferreira Leite — que sempre ficou conhecida por ser uma pessoa séria, austera e de relacionamento difícil, mesmo entre os seus pares — afirmou numa rádio o seu apoio às iniciativas do deputado socialista João Cravinho em matéria de combate à corrupção, em relação às quais, curiosamente, o PS franziu o olho e insiste em divagar ao redor de alegadas inconstitucionalidades: “Qualquer partido que não aprove ou não dê andamento a propostas contra a corrupção de um deputado ficará sob a mesma suspeita que cai sobre o PS, que é a suspeita de não estar interessado em atacar de frente o problema.” A ex-ministra das finanças, responsável pela paternidade de muitas das medidas orçamentais que estão ainda hoje a ser desencadeadas pelos socialistas, apoiou João Cravinho numa altura em que este, curiosamente, se despede do Parlamento português para se instalar em Londres, como administrador do Banco Europeu para a Reconstrução e Desenvolvimento (BERD), nomeação que nada tem a ver com os “jobs for the boys”! Obviamente que o combate à corrupção é um dever do Estado, que esse combate vai aumentar em Portugal, que a justiça está cada vez mais empenhada em viabilizar esse combate e que novas medidas serão certamente tomadas para viabilizar essa actuação. Contudo, parece-me que o comportamento dos socialistas na Assembleia da República, pelo menos até este momento, começa a indiciar um estranho receio em aceitar uma iniciativa de um seu deputado, facto que deverá ser devidamente acompanhado por quem de direito, incluindo a comunicação social, neste caso, em busca de eventuais “justificações” para tão esquisitos “temores”…
Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 24 de Janeiro 2007

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