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segunda-feira, 28 de maio de 2007

Artigo: FUNCIONÁRIOS E LÓGICA

Na semana passada, ficamos a saber que os funcionários públicos vão continuar impedidos de progredir na carreira no próximo ano, decisão que parece decorrer do “novo sistema de vínculos e carreiras, cuja proposta de lei está a ser negociada com os sindicatos e que fixa um regime transitório que adia as primeiras progressões na carreira para 2009”. Com esta medida, segundo dizia ontem um comentador para os assuntos económicos numa estação de televisão, o governo socialista da República poupa mais de 420 milhões, atirando para 2008 (em princípio e não já vamos ver porquê) ou para 2009, ano de eleições legislativas nacionais, as medidas mais satisfatórias para o funcionalismo público, comportamento a que não é estranho o timing eleitoral dos socialistas. Mas verdade seja dita, todos os governos jogam com a calendarização e o anúncio das boas medidas com a proximidade dos períodos eleitorais, sendo difícil encontrar quem “possa atirar a primeira pedra” ao vizinho. Acusar de demagogia e oportunismo este governo, por causa desse comportamento, seria hipocrisia e desonestidade intelectual, que comigo não pega, na medida em que, tal como referi, todos os governos, repito, todos os governos sem excepção, jogam com os calendários eleitorais, mesmo que não o digam ou, nalguns casos é isso que se passa, até fiquem todos irritadiços negando o que sabemos todos ser uma verdade incontornável.
Depois de ter prometido uma redução de 75 mil funcionários públicos, desde a sua posse até final do mandato 2009 (dos quais apenas 11 mil já abandonaram a actividade pública), é mais do que evidente que o governo central, mais do que a problemática da poupança resultante da não introdução da progressão de carreiras, deverá estar a preparar um novo mecanismo de avaliação e de progressão para os funcionários, que assentará em critérios rigorosos, que recusarão a generalização das promoções como um direito adquirido e das avaliações inflacionadas (muito bom). É neste quadro que tenho cada vez mais a percepção da perfeita inutilidade de sindicatos que continuam a insistir no mesmo discurso que já tinham nos anos oitenta e mesmo até antes, incapazes de perceberem que as formas de luta sindicais terão que ser mudadas e que os sindicatos terão que adaptar-se a uma nova realidade, política e legislativa, que se impõe com facilidade, porque não encontra nos sindicatos a resistência que seria de supor. Alguns sindicatos ligados ao funcionalismo público, nas duas múltiplas vertentes, pecam ainda pelo facto de continuarem a ter, há anos, os mesmos dirigentes, cuja cara por si só já farta as pessoas e desmobiliza os sindicalizados que neles não acreditam
Os últimos acontecimentos em matéria de investidas contra o funcionalismo púbico, almofadados pela demagogia sindical e pela total inércia destes perante as medidas mais punitivas para os trabalhadores, ficam a dever-se exactamente a uma realidade sindical que tem que ser alterada e que tem mais a ver com protagonismos pessoais ou disputas partidárias do que com a honestidade e a obrigação ética de defesa dos trabalhadores ameaçados.
Neste contexto, referia um jornal de Lisboa, que “no espaço de pouco mais de quatro horas, o Governo alterou o seu discurso e abriu a possibilidade de, em 2008, os funcionários públicos beneficiarem de progressões nas carreiras que estão congeladas desde meados de 2005”. Quando o secretário de Estado da Administração Pública, João Figueiredo, chamou os jornalistas para a leitura de um comunicado (sem direito a perguntas) no qual garantiu que "o Governo assegurará a aplicação em pleno, já em 2008, de todos os mecanismos remuneratórios do novo sistema [de vínculos, carreiras e remunerações]". Era mais do que evidente que o secretário, que de político pouco ou mesmo nada tem, recebeu ordens para fazer o que fez, provavelmente pelo próprio José Sócrates ou de alguns dos ministros que fazem parte da ala política do governo, devido à percepção que eles têm de que a questão do funcionalismo público, tal como a OTA continuarão a desgastar o governo. Penso que esta mudança de opinião do governo socialista tem a ver também com as eleições para a Câmara de Lisboa e com o eventual receio de António Costa – quem sabe se ele próprio não pediu este pinote?!... – que tudo apostou nesta candidatura, de que qualquer ataque governamental aos funcionários públicos, que nos últimos anos viram agravadas as suas condições e a sua situação laboral, não tenha repercussões nos resultados eleitorais na capital.
Vamos a ver se nos entendemos. Eu no lugar de Costa, depois de ter abdicado de ser o nº 2 do governo da República, para aceitar, quase empurrado, a candidatura à Câmara de Lisboa, não toleraria, sob pena de me envolver num conflito político e partidário de repercussões imprevisíveis, que até à realização das eleições para a Câmara o governo insistisse no sistemático anúncio de decisões que apenas penalizam as pessoas ou as empresas. Por isso não critico Costa se realmente fez isso – não posso garantir – porque estaria a ser hipócrita e porque acabei de dizer, e repito, que faria exactamente o mesmo. Limito-me apenas a constatar factos, eventualmente a especular em torno de conjunturas que considero não serem nem absurdas nem estarem porventura próximas da realidade.
Depois do anúncio de recusa de progressões profissionais, o governo deu o dito por não dito e, embora envergonhadamente, já que admitiu que "podem registar-se, à luz da lei que ficará aprovada, alterações das posições remuneratórias dos funcionários públicos já em 2008", o que significa o fim do congelamento das remunerações actualmente em vigor, depois do mesmo secretário de Estado da Administração Pública ter garantido que as progressões remuneratórias só seriam possíveis em 2009.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 28 de Maio 2007

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