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Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Artigo: Lucros…

Uma pessoa menos atenta ainda é levada a acreditar que “isto” anda tão bom, tão bonzinho mesmo, que até as empresas públicas, um inevitável poço sem fundo em matéria de gestão e de crónica acumulação de déficites, passaram a dar lucro. Seria, por assim dizer, não um novo “milagre da multiplicação” de euros, mas algo parecido como um truque de magia à boa maneira de Houdini… A notícia foi dada mais ou menos nestes termos: as empresas públicas não financeiras fecharam o ano de 2006 com resultados líquidos positivos de 7,4 milhões de euros, com base nos valores ponderados pela participação do Estado. Este saldo, inédito nos últimos anos, traduz uma melhoria de 500 milhões de euros face aos prejuízos alcançados em 2005 de 545,7 milhões de euros”. Quem o anuncia é o relatório sobre o Sector do Empresarial do Estado. Mas a verdade é que “sem fazer as contas à participação directa do Estado nas sociedades mais lucrativas, casos da Galp e da EDP, as empresas não financeiras continuaram a perder dinheiro, com prejuízo consolidados de 114,5 milhões de euros, menos 81% que em 2005. Ou seja, apesar da melhoria nos resultados, os sectores mais deficitários do Estado (infra-estruturas ferroviárias, transportes públicos e saúde) agravaram os prejuízos. O relatório do Ministério das Finanças reconhece que a melhoria vem sobretudo do crescimento dos lucros da Parpública para 627 milhões de euros. A holding do Estado responsável pelas privatizações quase quadruplicou os lucros (mais 380,7%). Este resultado reflecte a melhoria de lucros das empresas mais rentáveis que o Estado transferiu para esta sociedade, como a Galp e a EDP. E eis que aparece, bem lá no fundo da notícia, a explicação para todo este “milagre”: as mais-valias financeiras obtidas nas privatizações (venda de empresas por um valor superior ao contabilístico). Mas afinal qual é o retrato possível do sector empresarial do Estado envolvido nesta notícia? O relatório destaca um “acréscimo de 13% do passivo para 31,8 mil milhões de euros, considerando dados globais das empresas; os empréstimos adicionais subiram 15,2% para os 3.381 milhões de euros diminuindo em 19,6% o esforço financeiro do Estado, para 704,3 milhões de euros; o investimento subiu 19,6% para 4,8 mil milhões de euros, com mais recurso a auto-financiamento e o número médio de trabalhadores cresceu 11,8% para 107.760, com os custos a subirem 13,3%, evolução explicada pela inclusão de mais hospitais”.A propósito da manipulação do público, Georges Picard (“Pequeno Tratado para uso daqueles que querem ter sempre razão”), escrevia: “Segundo uma lei conhecida, os homens, considerados colectivamente, são mais estúpidos do que tomados individualmente. Numa conversa a dois, convém que respeitemos o parceiro, mas essa regra de conduta já não é tão indispensável num debate público em que se trata de dispor as massas a nosso favor. Há uns anos, um político pagou a figurantes para o aplaudirem numa concentração. Como bom profissional, compreendera que uma claque, embora não melhore o discurso, predispõe melhor os espectadores a descobrirem os seus méritos. O mimetismo é a mola principal para mover as massas no sentido do entusiasmo, do respeito ou do ódio. Mesmo perante um pequeno público de trinta pessoas, há sempre algo de religioso que provém da coagulação dos sentimentos individuais em expressão colectiva. No meio de um grupo, é necessária uma certa energia para pensar contra a maioria e coragem para exprimir abertamente essa opinião. Os manipuladores de opinião ou, para utilizar uma palavra mais delicada, os comunicadores, sabem que, para conduzir mentalmente uma assembleia numa determinada direcção, é necessário começar por agir sobre os seus líderes. A primeira tarefa consiste em determinar quem são, apesar de eles próprios não o saberem. Um manipulador não tarda a distinguir o punhado de indivíduos em que pode apoiar-se para influenciar os outros. Consoante os casos, escolherá os faladores ou os fanfarrões, os que protestam ou se obstinam, os que fazem rir ou chorar, os que alimentam a cólera, etc. O caldeirão mágico do comunicador não tem fundo. Toda a sua arte consiste em conquistar rapidamente a simpatia dos líderes ainda inconscientes do seu estado e papel. Manipulados, serão por sua vez manipuladores do resto do grupo, que os seguirá como um só homem (…) É óbvio que este princípio tem que ser adaptado, nomeadamente em função da importância do público. Quanto mais numeroso for, menos necessário é o esforço de fingir. As multidões não apreciam os vencidos: não é que sejam cruéis, mas a derrota desmoraliza-as. Só a cólera, o medo ou o entusiasmo as animam. O enorme animal constituído pela multidão é impermeável às subtilezas, tem necessidades do tonitruante e do ostentatório. Reduzida às dimensões de um grupo, a sua psicologia muda, mudando ainda mais se o grupo se transforma numa assistência restrita. Mas, em todos os casos, o princípio da alavanca mantém-se válido: é necessário identificar o ponto nevrálgico sobre o qual o esforço deve incidir para movimentar o conjunto”. Pois é…
Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 02 de Agosto 2007

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