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Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

Artigo: Repetitivo?

Do discurso de Alberto João Jardim no Chão da Lagoa — que já vi classificado de “repetitivo” ou de “mais do mesmo”, ressalta uma questão que para mim, é esta pelo menos a minha opinião, me parece crucial: falando da maneira que falou, criticando da forma que criticou, utilizando os termos que utilizou, tudo isto significa que o “machado de guerra”, no que às relações institucionais entre os dois governos, o da República e o da Região diz respeito, foi desenterrado. Ou seja, a anunciada “paz” — que eu sempre previ que seria tempo perdido — motivada pela expectativa de uma alteração de posições por parte do governo socialista de Lisboa, depois das eleições regionais de 6 de Maio, caiu rapidamente em saco roto, porque o Presidente do Governo Regional terá percebido, ao fim de dois meses de espera, sem sucesso, que tudo continuará na mesma e que, na menor das hipóteses, nada se alterará pelo menos até Dezembro deste ano, final da presidência portuguesa da União, julgo mesmo que por imposição do próprio Cavaco Silva que em devido tempo disse não admitir “instabilidades” que pudessem “prejudicar” a imagem do nosso país. Isto faz-me lembrar aquele casal, que passa a semana à pancadaria um com o outro, que praticamente nem se falam, mas ao fim-de-semana, pura palhaçada, aparecem nas festas sociais sorridentes e agarradinhos, como se nada se passasse, envolvendo-se numa hipócrita encenação que, mais tarde ou mais cedo, todos acabam por descobrir. No nosso caso é o mesmo. Numa Europa cada vez mais apostada na consolidação das pequenas comunidades, das cidades e das regiões, como forma de cativar os europeus e de os mobilizar para o projecto europeu, opta-se pela encenação de uma presidência transformada também num circo propagandístico, escondendo diferendos políticos internos que, pela sua natureza, certamente que incomodariam a nomenclatura comunitária e nos deixariam com uma reduzida capacidade de manobra e de persuasão perante os nossos parceiros europeus.Não estou com isto a fazer a apologia ou sequer a pretender fomentar a institucionalização da guerrilha institucional ou da conflitualidade porque tenho a consciência que ninguém ganha com isso, pior, que o elo mais fraco acaba sempre por ser o mais prejudicado. O que me pareces essencial é que as pessoas percebam que há, no que ao Presidente do Governo diz respeito, uma responsabilidade acrescida, que foi determinada pelos resultados de Maio passado, a de resolver um diferendo que, pelos vistos, tende a eternizar-se. Eu penso, sinceramente, que em nenhuma comunidade autonómica espanhola, região italiana ou belga, “lander” suíço ou austríaco, etc, esta situação ocorreria, muito menos perante a passividade de órgãos de soberania que têm, ou deveriam ter, uma outra capacidade de intervenção. Acusam-se as regiões, particularmente a Madeira, e os municípios, de “chularem” o Orçamento do Estado, de viverem à custa dos impostos dos portugueses, de agravarem o défice das contas públicas, etc. Ainda há dias vimos o vergonhoso défice das empresas públicas portuguesas em 2006, ser disfarçado por operações de alienação de património e outras habilidades bancárias, como se isso fosse um feito só possível com este governo socialista. Acusam as regiões, particularmente a Madeira, e os municípios, de “chularem” o Orçamento do Estado, de viverem à custa dos impostos dos portugueses, mas ficamos a saber que o Estado vai ter que pagar mais de um milhão de euros para recompensar funcionários públicos injustamente despedidos por um governo PSD/CDS. Vemos a TAP a apresentar no final do semestre um prejuízo de mais de 6 milhões de euros. Mas tudo isto parece estar bem. O problema para o país e os portugueses, não são os milhões que serão gastos em megalomanias tontas, mas antes o dinheiro reclamado pela Madeira e pelos municípios, como se houvesse uma cumplicidade alargada, montada em torno de uma deliberada intenção de obstaculizar a vida dessas entidades, impondo um manto de silêncio sobre tudo o que incomoda ou ameaça determinados objectivos propagandísticos.Não vamos ser hipócritas — até porque recuso sê-lo — e resolver andarmos aqui a disparatar, escondendo que os problemas entre a Madeira e a República, para além das questões de natureza político-partidárias, que naturalmente separam social-democratas insulares de socialistas nacionais, têm a ver com a polémica sobre a interrupção voluntária da gravidez ou outras temáticas, informativamente mais ou menos aliciantes, e não com dinheiro. Ou seja, os cortes impostos pela lei de finanças regionais representam um problema complicado para a governação regional que urge resolver, até porque precisamos de saber com o que contamos. Mas acresce ainda outro problema, neste caso resultante do facto do Estado — que recusa alterar a sua posição quanto às transferências de mais recursos financeiros para a Madeira — também não querer criar condições legislativas para que a Região possa optar, caso queira e encontre financiador, por recorrer ao crédito bancário, assumindo, depois, todas as responsabilidades decorrentes de eventuais impactos negativos resultantes de um qualquer aventureirismo financeiro. Explicando, quem me garante que o chamado endividamento zero, imposto a municípios e regiões, é uma imperiosa e incontornável necessidade da política orçamental do Estado e não uma habilidade para os manter, a uns e outras, com a rédea curta?
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 31 de Julho 2007

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