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segunda-feira, 4 de junho de 2007

Artigo: EDUCAÇÃO

Quando se fala em educação, em Portugal, falamos de um país com baixos níveis de educação, com elevadíssimos níveis de abandono escolar e, como se tudo isso não bastasse, com carências formativas que o colocam entre os primeiros países menos evoluídos. E para se falar em educação não precisamos ser especialistas, muito menos de fazer parte de nenhuma das ”corporações” que no seio do sistema educativo, há muitos anos a esta parte, disputam entre si hegemonias, influências, a posse do primado da verdade absoluta. Pelo contrário, quando se fala de educação, fala-se essencialmente de uma realidade global que há muitos anos vem sendo questionada e de forma crescente e mais ou menos consistente, dividindo os principais agentes do processo educativo. Mas falamos essencialmente de orientações governativas, de produção legislativa, logo fala-se de política, de programas governamentais, de opções partidárias. Há muito que as pessoas se habituaram a perceber que, na educação ou em qualquer outro sector com a mesma importância e dimensão, como a saúde ou a justiça, as corporações quando se sentem “ameaçadas” ou questionadas, rapidamente esquecem as divergências e juntam–se me torno de estratégias comuns de sobrevivência e de auto-defesa colectiva que, verdade sejam dita, com o actual governo socialista em Lisboa, não têm resultado minimamente.
Não vou discutir - porque não me importa nem considero pertinente neste contexto - aspectos estruturais ou de pormenor, questões sectoriais de classe, ou pormenores relativos às orientação individuais tomadas por cada estabelecimento de ensino porque isso pouco me importa. Além disso, sabemos todos, qualquer debate dedicado à temática educacional acaba sempre como começou, num impasse, sem que ninguém se entenda, com ânimos exaltados, com argumentos facilmente rebatíveis e sem que nenhuma ideia em concreto dele resulte. O que se assiste é a uma repetitiva e sistemática tentativa das diferentes corporações que fazem parte do sistema educativo, em garantir a imposição dos seus pontos de vista, naturalmente tendenciosos, porque estruturados com base num certo egoísmo classista que privilegia questões menores, ou de pormenor, em detrimento do essencial.
O que me parece importante e as pessoas pretendem saber, por exemplo, é se a actual orientação do governo em Lisboa, de encerrar escolas em nome de uma concentração de alunos e mais adequada gestão de recursos, ajuda a combater o abandono escolar e a garantir um eficaz combate à iliteracia que nos vulnerabiliza. Eu sei que é preciso, por razões orçamentais, rentabilizar recursos financeiros cada vez mais insuficientes. Mas a verdade é que olho para milhares de professores no desemprego – mas o que é facto é que outros milhares continuam a sair todos os anos das universidades sem garantia de colocação - para uma substancial quebra na população escolar nos vários patamares de ensino, por razões essencialmente demográficas que nem são um exclusivo português, mas antes europeu, olho para a crise no ensino superior, para as estatísticas internacionais (principalmente da OCDE) que denunciam a nossa fragilidade e não tenho condições para responder seja ao que for, porquanto não encontro em lado nenhum, nem pistas, nem explicações razoáveis para as dúvidas que todos os dias são suscitadas em torno deste tema.
A nível nacional ficamos a saber que quase 11 mil escolas do 1º ciclo já foram encerradas devido a terem poucos alunos (6355 em 2004 e 4509 no início deste ano lectivo). Um relatório do Ministério da Educação, intitulado “Organização do Ano Lectivo 2006-07” compara vários indicadores numa amostra de mais de “300 agrupamentos de escolas públicas, representativa de um quarto do universo de escolas, alunos e professores”, apontando vários constrangimentos: 22% dos jardins-de-infância ainda não asseguram o funcionamento até às 17h30 e a rede de cobertura da Educação Pré-Escolar é insuficiente; há um “número significativo” de crianças com três anos que não são admitidas nos jardins-de-infância, nomeadamente em Lisboa e Algarve; no 1.º Ciclo existem muitas escolas (18%) em regime de horário duplo “devido à escassez de instalações”, o que tem consequências na capacidade de oferta de Actividades de Enriquecimento Curricular (90% das escolas primárias oferecem-nas aos seus alunos).
Quanto ao 2.º Ciclo, o relatório do ME fala na “confusão entre alunos com necessidades educativas especiais e alunos com dificuldades de aprendizagem”, enquanto que no 3.º Ciclo, o principal problema parece ser o a “distribuição desequilibrada das actividades lectivas pelos dias da semana, já que existem dias com oito ou mais horas e outros com cinco ou menos”. A entidade autora do relatório (IGE) critica os professores dos 2.º e 3.º Ciclos e do Secundário devido a “utilização menos eficiente das horas da componente não lectiva dos docentes no desenvolvimento de projectos pedagógicos destinados a promover o sucesso educativo”. Evidentemente que se forem contactar os sindicatos a contestação a estas conclusões serão óbvias, mesmo que de uma forma envergonhada alguns admitam a existência de sustentabilidade nalgumas das observações constantes do relatório. Mas há outras situações a reter neste quadro de uma realidade complexa:
- há 202 inspectores ao serviço da Inspecção-Geral da Educação, num total de 310 funcionários;
- existem este ano 169.291 professores e educadores de infância em actividade desde o início do ano lectivo, menos 8.239 do que em 2005;
- há 1.669.470 alunos matriculados nas escolas públicas no início do ano lectivo, mais 21.192 que em 2005.
Diga o que o ME disser, os problemas vão continuar, o encerramento de escolas prossegue (cerca de 850 no próximo ano), os níveis de abandono escolar manter-se-ão até porque associados aos rendimentos das famílias e às necessidades de subsistência desses agregados, os professores continuarão aos milhares, e cada vez mais, no desemprego, as escolas terão cada vez menos recursos financeiros, etc. E afinal, pergunta-se, perguntam as pessoas: quais as soluções, quais as saídas possíveis para a realidade incontestável de uma das mais importantes área de intervenção governamental em qualquer país?
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 31 de Maio 2007

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