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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Opinião: FENÓMENO CONSISTENTE?

Quero referir que não tenho nada contra as companhias de aviação “low cost”, não questiono o seu contributo para uma mudança que era necessária no sector, nas possibilidades por elas propiciadas a muitos cidadãos – falo sobretudo na Europa – que antes hesitavam em viajar ou não viajavam, por causa do custo exagerado das tarifas vigentes nas companhias de bandeira mais tradicionais. Nem sequer considero que as “low cost”, só por causa dessa sua designação, devam ser olhadas como uma espécie de parentes pobres na aviação comercial ou que sejam menos seguras que as demais companhias. Não tenho indicadores para poder aventurar-me por caminhos inquestionavelmente polémicos. Ainda há dias o JM dava conta do balanço da actividade das operadoras de baixo custo mais importantes, no que á Madeira diz respeito, e contra factos não há argumentos. Continuo a pensar que este fenómeno comercial relativamente novo - que presta um serviço com características muito próprias, realizado por empresas que na sua maioria possuem frotas bastante limitadas (por exemplo, um atraso com um aparelho origina imediatamente uma espiral de contrariedades com outras ligações, de solução bastante difícil) e assente na viabilidade económica das opções tomadas (as ligações escolhidas) pelas companhias “low cost”, cuja gestão assenta, compreensível e logicamente, num primado economicista - tem tido alguma influência positiva na mudança em centos turísticos europeus mais tradicionais e mais procurados, assim como têm originado o aparecimento de novas alternativas, facto que também prejudica destinos mais tradicionais como a Madeira e as Canárias que em 2007 sofreu uma queda abrupta de entradas.
Mas sobre este assunto, e para que se perceba do quer estamos a falar, deixo-vos a opinião de Douglas Wires, um brasileiro com larga experiência empresarial na aviação comercial e operadores turísticos, e que no seu blog pessoal tem emprestado contributos interessantes sobre diversas matérias relacionadas como turismo e em particular com o transporte aéreo:
“O marketing agressivo de vendas de passagens aéreas por 1 euro, iniciada na Europa com o surgimento de companhias aéreas operando nesse conceito de administração, reflectiu no Brasil e no resto do mundo essa nova tendência. Entretanto, 1 euro é apenas uma isca (1 a 8 assentos dos 50 a bordo de um avião de médio porte) porque o preço médio praticado por voo é de aproximadamente 100 Euros. Mesmo assim, ainda é barato! Às vezes, o mesmo preço ou um pouco a mais do valor de uma passagem de autocarro. Quais os factores que contribuem para a compra de passagens aéreas baratas em companhias aéreas “low cost”: a eliminação de todos os serviços gratuitos a bordo (refeições, bebidas e jornal), a não marcação de lugares, a não transferência de bagagem e passageiros entre voos de ligação, os seguros de viagens, o atendimento electrónico (não há “call center”, porque tudo é feito pela Internet) e a franquia de bagagem diferenciada (volume de malas e quantidade de peso menor) das demais companhias aéreas regulares. Na prática, transformaram o que seria um custo para uma companhia regular (Air France, TAP, TAM, etc) numa oportunidade de receita, cobrando por todos os serviços extras, que são dispensados pela maioria dos passageiros. Entre os problemas encontrados nas companhias aéreas “low cost”, podemos citar: as partidas e chegadas de seus voos, são na sua maior parte, em aeroportos regionais, o que implica gastos acrescidos com táxi, os voos menos rentáveis não são diários, e geralmente, são apenas um por dia (em caso de atraso de voo ou perda de voo que faz ligação com o de outra companhia aérea, prepare o bolso…), os voos não oferecem refeições a bordo (quando oferecem elas são de baixa qualidade), dado que não são empresas credenciadas pela IATA, não emitem bilhetes aéreos, mas sim recibos de compra pela Internet que não são reembolsáveis nem endossáveis, o seu cartão de crédito pode ser alvo dos “hackers” que tentam utilizar as suas informações confidenciais no momento da compra do bilhete nos sites destas companhias aéreas e o horário de seus voos não são regulares, ou seja, podem ser cancelados e marcados para o dia seguinte ou ter a partida adiada para mais de 6 horas devido o facto de possuírem, em certos casos, 1 ou 2 aviões (o que torna inviável reprogramá-los para embarcar os passageiros que tiveram o seu voo cancelado).
Problemas à parte, o factor preço acaba pesando mais no orçamento fazendo com que o viajante ignore todos esses detalhes, esquecendo-se que mais adiante o barato poderá custar caro. Quando a filosofia de voos “low cost” chegou ao Brasil, muitos brasileiros motivaram-se para viajar de avião, acreditando que seria possível realizar seu sonho de voar. Muitas empresas “low cost” surgiram. Umas já faliram. Outras que não eram “low cost”, adoptaram esse conceito para se manterem no mercado, mas acabaram por desaparecer. Outras ainda, que eram “low cost”, deixaram de ter tal conceito. Quer saber por quê? Os custos com a aviação são altos. Não há condições de um empresário abrir uma empresa aérea “low cost”, porque ele venderá real mas pagará o “leasing” da aeronave, o seguro, a reposição das peças e demais equipamentos em dólares ou euros. Aos poucos, a falência surgirá, tendo como reflexos a má conservação da aeronave, a falta de manutenção, a insegurança de voar, a insatisfação dos funcionários que atendem os passageiros com má vontade e falta de atenção porque seus salários estão atrasados, etc.
Vale a pena lembrar, que o crescimento turístico dos últimos anos se deveu sobretudo ao advento das companhias aéreas “low cost”, e não a uma política de promoção sustentada pelos governos. Porém, cada vez mais as companhias aéreas “low cost” actuam em rotas mais rentáveis, ocasionando o cancelamento de outras rotas devido aos custos de operação e à concorrência com outros meios de transporte (comboio). Isso quer dizer que a sua permanência num destino não será duradoura e que o cancelamento de uma das suas rotas poderá apanhar desprevenidos muitos passageiros com passagens aéreas já compradas”.
Acabei de transcrever a opinião de uma pessoa profissionalmente ligada ao sector e que certa e compreensivelmente conhece melhor que eu, e muitos de nós, a sua realidade e os desafios que permanentemente são colocados a um sector em clara mudança.
Luís Filipe Malheiro (in "Jornal da Madeira, 04 de Fevereiro de 2008)

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