IWO JIMA
A batalha de Iwo Jima está tão afastada das memórias dos japoneses que quando Clint Eastwood filmou Cartas de Iwo Jima, o outro lado de As Bandeiras dos Nossos Pais - que hoje se estreia em Portugal - nenhum dos seus actores sabia do que se tratava. E no entanto, 21 mil soldados morreram nos combates ao serviço do imperador. A derrota da ilha foi o princípio da derrota do Japão.
O filme poderá ser particularmente útil, num momento em que o país se envolve num processo de autoconsciência sobre o seu passado. "A identidade histórica tem sido ignorada" pelos japoneses, comentou ao PÚBLICO, por telefone, John Swenson-Wright, especialista em questões nipónicas do think-tank britânico Chatham House. "Possivelmente, haverá actualmente mais vontade de lidar com o passado da guerra". O país está envolvido num debate vigoroso sobre as alterações à sua Constituição pacifista, redigida pelos EUA depois de o Japão ter perdido a guerra em 1945. Apenas há dois dias, a Agência de Defesa foi transformada em ministério, pela primeira vez em 60 anos. "Se este processo [de debate] for transparente, o Japão pode tornar-se num país mais normal", porque estará em condições de desenterrar os seus tabus. Justin McCurry, do Guardian, escrevia a 20 de Dezembro: "Após décadas a ser tratado como um episódio infeliz numa guerra que muitos preferiam esquecer, Iwo Jima entrou finalmente na consciência japonesa com dois filmes de Clint Eastwood." Numa visita ao local, McCurry descreveu o que resta de um dos túneis arquitectados pelo general Tadamichi Kiribayashi, que "aceitou a futilidade de tentar resistir a uma invasão muito antes de o primeiro tiro ser disparado".
Inimigo invisível
É um dos poucos locais abertos a visitantes, que apenas podem chegar à ilha em aviões militares, e que servia de hospital de campanha. Há ainda garrafas de sake encostadas às paredes, capacetes reunidos a um canto. Quando foi explorado, em 1984, havia também múmias de 54 soldados japoneses - Iwo Jima é um monte vulcânico e dentro dos túneis a temperatura atingia os 50 graus. O sistema de túneis e bunkers que pareciam proteger os japoneses foi descrito por James Bradley no livro best-seller que deu nome ao filme de Eastwood. "Vinte e seis quilómetros de túneis que ligavam 1500 [abrigos] subterrâneos construídos pelo homem. Muitos dos fuzileiros sobreviventes nunca viram um soldado japonês vivo em Iwo Jima. Lutavam contra um inimigo que não conseguiam ver." "Os japoneses sabiam quão vital era para as forças americanas conquistar Iwo", escreveu Robert Sherrod, o repórter da Time que acompanhou o desembarque. "Eles sabiam o revés que a sua perda seria para a defesa do Japão." Mas a protecção não resistiu às investidas americanas, que provocaram baixas pesadas às forças japonesas. O corpo do próprio Kiribayashi não chegou a aparecer. O general ordenara aos seus homens que, antes de morrer, deveriam abater dez marines. E que, para orgulho do império, nunca se deveriam render. No fim, dos 22 mil soldados que defendiam a ilha, apenas 1080 a deixaram com vida.
... e o pesadelo dos americanos
Robert Sherrod, repórter da Time que acompanhou o desembarque na ilha japonesa de Iwo Jima a 19 de Fevereiro de 1945, comentou: "Aquela primeira noite só pode ser descrita como um pesadelo no Inferno." As forças americanas acabaram por vencer as defesas japonesas. Mas a batalha entrou para a história como a mais pesada de sempre para os Marines: dos 6821 americanos mortos, 5931 eram fuzileiros. E o número representa um terço de todas as baixas sofridas pela força de elite durante a Segunda Guerra Mundial. O ícone da vitória americana é a fotografia de Joe Rosenthal, da Associated Press. A imagem - que alguns dizem ser a melhor fotografia de todos os tempos - levou a que James Bradley, o filho de um dos seis soldados que ergueram o símbolo nacional dos EUA, escrevesse As Bandeiras dos Nossos Pais, na origem do filme de Clint Eastwood que hoje se estreia em Portugal com o mesmo nome. A pequena ilha de Iwo Jima (nove quilómetros de comprimento por três de largura) estava na primeira linha da defesa do Japão contra as forças dos EUA, que ainda não tinham conquistado território nipónico. A sua captura ofereceu aos americanos um posto estratégico para subjugar o resto do país: serviu de base para os esquadrões de B-29 que arrasaram Tóquio e outras cidades japonesas. E foi uma vitória com sabor amargo e sem glória para os EUA. Os comandantes americanos previam-na ao fim de quatro dias; apenas cinco semanas mais tarde, a 26 de Março, a deram por conquistada. Além de mais de 6800 mortos, 17 mil soldados ficaram feridos - um número superior aos homens enviados pelas forças nipónicas para defender o posto: 22 mil. Para um e outro lado, foi o princípio do fim. No seu livro, Bradley cita o soldado Tex Stanton: "Fomos transformados desde o dia em que pusemos o pé naquela areia."
O filme poderá ser particularmente útil, num momento em que o país se envolve num processo de autoconsciência sobre o seu passado. "A identidade histórica tem sido ignorada" pelos japoneses, comentou ao PÚBLICO, por telefone, John Swenson-Wright, especialista em questões nipónicas do think-tank britânico Chatham House. "Possivelmente, haverá actualmente mais vontade de lidar com o passado da guerra". O país está envolvido num debate vigoroso sobre as alterações à sua Constituição pacifista, redigida pelos EUA depois de o Japão ter perdido a guerra em 1945. Apenas há dois dias, a Agência de Defesa foi transformada em ministério, pela primeira vez em 60 anos. "Se este processo [de debate] for transparente, o Japão pode tornar-se num país mais normal", porque estará em condições de desenterrar os seus tabus. Justin McCurry, do Guardian, escrevia a 20 de Dezembro: "Após décadas a ser tratado como um episódio infeliz numa guerra que muitos preferiam esquecer, Iwo Jima entrou finalmente na consciência japonesa com dois filmes de Clint Eastwood." Numa visita ao local, McCurry descreveu o que resta de um dos túneis arquitectados pelo general Tadamichi Kiribayashi, que "aceitou a futilidade de tentar resistir a uma invasão muito antes de o primeiro tiro ser disparado".
Inimigo invisível
É um dos poucos locais abertos a visitantes, que apenas podem chegar à ilha em aviões militares, e que servia de hospital de campanha. Há ainda garrafas de sake encostadas às paredes, capacetes reunidos a um canto. Quando foi explorado, em 1984, havia também múmias de 54 soldados japoneses - Iwo Jima é um monte vulcânico e dentro dos túneis a temperatura atingia os 50 graus. O sistema de túneis e bunkers que pareciam proteger os japoneses foi descrito por James Bradley no livro best-seller que deu nome ao filme de Eastwood. "Vinte e seis quilómetros de túneis que ligavam 1500 [abrigos] subterrâneos construídos pelo homem. Muitos dos fuzileiros sobreviventes nunca viram um soldado japonês vivo em Iwo Jima. Lutavam contra um inimigo que não conseguiam ver." "Os japoneses sabiam quão vital era para as forças americanas conquistar Iwo", escreveu Robert Sherrod, o repórter da Time que acompanhou o desembarque. "Eles sabiam o revés que a sua perda seria para a defesa do Japão." Mas a protecção não resistiu às investidas americanas, que provocaram baixas pesadas às forças japonesas. O corpo do próprio Kiribayashi não chegou a aparecer. O general ordenara aos seus homens que, antes de morrer, deveriam abater dez marines. E que, para orgulho do império, nunca se deveriam render. No fim, dos 22 mil soldados que defendiam a ilha, apenas 1080 a deixaram com vida.
... e o pesadelo dos americanos
Robert Sherrod, repórter da Time que acompanhou o desembarque na ilha japonesa de Iwo Jima a 19 de Fevereiro de 1945, comentou: "Aquela primeira noite só pode ser descrita como um pesadelo no Inferno." As forças americanas acabaram por vencer as defesas japonesas. Mas a batalha entrou para a história como a mais pesada de sempre para os Marines: dos 6821 americanos mortos, 5931 eram fuzileiros. E o número representa um terço de todas as baixas sofridas pela força de elite durante a Segunda Guerra Mundial. O ícone da vitória americana é a fotografia de Joe Rosenthal, da Associated Press. A imagem - que alguns dizem ser a melhor fotografia de todos os tempos - levou a que James Bradley, o filho de um dos seis soldados que ergueram o símbolo nacional dos EUA, escrevesse As Bandeiras dos Nossos Pais, na origem do filme de Clint Eastwood que hoje se estreia em Portugal com o mesmo nome. A pequena ilha de Iwo Jima (nove quilómetros de comprimento por três de largura) estava na primeira linha da defesa do Japão contra as forças dos EUA, que ainda não tinham conquistado território nipónico. A sua captura ofereceu aos americanos um posto estratégico para subjugar o resto do país: serviu de base para os esquadrões de B-29 que arrasaram Tóquio e outras cidades japonesas. E foi uma vitória com sabor amargo e sem glória para os EUA. Os comandantes americanos previam-na ao fim de quatro dias; apenas cinco semanas mais tarde, a 26 de Março, a deram por conquistada. Além de mais de 6800 mortos, 17 mil soldados ficaram feridos - um número superior aos homens enviados pelas forças nipónicas para defender o posto: 22 mil. Para um e outro lado, foi o princípio do fim. No seu livro, Bradley cita o soldado Tex Stanton: "Fomos transformados desde o dia em que pusemos o pé naquela areia."
fonte: Francisca Gorjão Henriques (Publico)
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