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Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Artigo: Representante

Já tive oportunidade, várias vezes, de afirmar o que penso quer dos extintos cargos de Ministro da República, quer do actualmente designado cargo de “representante” da República para a Madeira, na medida em que entendo que eles tiveram, inquestionavelmente, uma justificação política e constitucional no passado, mas que hoje, esvaziados das suas competências e até da sua importância protocolar — há que dizer as coisas tal como elas são — não são mais de um símbolo da desconfiança política do Estado centralista em relação às suas duas Regiões Autónomas e insulares, do que propriamente uma entidade com efectiva utilidade e reconhecida pertinência e acuidade no quadro constitucional.Basta ver a impotência manifesta, que eu não atribuo a Monteiro Dinis, em matéria de aproximação do Estado e da Região, numa conjuntura que há mais de um ano e meio se caracteriza por uma quase absoluta inexistência de qualquer relacionamento institucional efectivo, contrariando tudo o que deveriam ser as normas funcionais de qualquer Estado democrático e unitário.Mas a minha opinião sobre o actual Representante da República, é meramente política, mesmo tendo a consciência que Monteiro Dinis, pelas críticas que tenho feito ao cargo, é capaz de ficar melhor se se virar para o lado contrário aquele onde me encontro. Eu confesso que isso não me incomoda rigorosamente nada, nem sequer dou importância, porque não altero a minha forma de pensar por causa de episódios desse tipo. Recuso confundir a questão institucional ou até mesmo a forma como o Estado encontrou suporte constitucional para marcar presença “tutelar”(?) nas Regiões Autónomas, com as pessoas. Pelo contrário. Reconheço que Monteiro Dinis é uma personalidade competente, foi membro do Tribunal Constitucional, tem um respeitável percurso profissional, que fala por si, nunca se comportou contra a Madeira nem contra a Autonomia, de uma maneira geral, que tem sabido gerir as relações institucionais na Região de uma forma habilidosa e superior, mas que tem uma forma de pensar muito própria, por exemplo, acerca do esvaziamento do cargo que exerce e que naturalmente, e com toda a legitimidade, nunca aceitou esse retirar de competências que o relegaram para uma espécie de “prateleira dourada”, limitado a assinar diplomas impor condecorações, conceder audiências protocolares e pouco mais do que isso. Monteiro deixou de ter o protagonismo de outros tempos, de desfrutar do espaço de manobra dos seus antecessores (dele próprio que foi o último Ministro da República e o primeiro Representante da República na Madeira) e de uma tutela efectiva sobre os serviços do Estado na Madeira, não tendo grande facilidade de “entrada” nos meandros do poder socialista em Lisboa, sobretudo quando de integrar o Conselho de Ministros. Enfim, viu substancialmente reduzida a sua capacidade de intervenção e protagonismo que os anteriores Ministros da República inquestionavelmente tiveram. Mas esse problema não me diz respeito, nem sequer à Madeira ou à Autonomia. Tenho um grande respeito por ele, apesar de ser um fortíssimo opositor da existência do cargo, e sei que posso afirmar que a Madeira nunca teve motivos para temer Monteiro Dinis, nem ele se comportou como um “coveiro” ou como um especialista em jogadas “duplas”, capaz de se colocar ao mesmo tempo nas duas margens de um rio.Onde é que pretendi chegar com tudo isto? Apenas à intenção de realçar algumas passagens do discurso proferido por Monteiro Dinis na cerimónia do 10 de Junho realizada no Palácio de São Lourenço:“A criação do sistema autonómico regional, por muitos considerada como uma das mais profundas inovações constitucionais no domínio da estrutura do Estado, constituiu paradigma e exemplo da democracia plena adoptada pelos deputados constituintes, pois que semelhante regime nunca poderia ser consagrado em sistemas políticos autoritários, de forte pendor centralizante, com largos condicionamentos dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e das entidades territoriais com especificidades próprias, razão pela qual todas as tentativas que, com maior ou menor empenho, suporte e determinação, haviam sido em tal sentido ensaiadas ao longo dos tempos, se saldaram sempre em inevitável insucesso. Da transposição dos princípios organizatórios do Estado para o plano das realidades materiais, com a implantação do sistema autonómico e após o início da sua vigência até à actualidade, resultou, como é imperativo reconhecer-se, um assinalado desenvolvimento civilizacional do arquipélago, tanto na dimensão económica como cultural e social (…)”.“É que, numa região com escassa dimensão territorial e diminuta população, muito marcada por um certo atavismo histórico-cultural, centrado em especial nas questões e condicionamentos da insularidade, assumem especial importância as mensagens transmitidas pelos partidos políticos e por aquelas entidades, em ordem ao esclarecimento e compreensão das regras de funcionamento do complexo sistema autonómico e das questões derivadas da intercomunicabilidade existente entre a República e a Região, assim como a delimitação rigorosa do que pertence à responsabilidade decisória de uma e de outra. Sem embargo de a Constituição, ainda hoje, porventura já sem cabal justificação, proibir a constituição de partidos que, pela sua designação ou pelos seus objectivos programáticos, tenham índole ou âmbito regional, e independentemente do princípio da unidade do Estado cujo acatamento sempre lhes seria devido, há-de reconhecer-se que as forças políticas regionalmente radicadas, pela própria natureza das coisas, privilegiam na sua acção o esclarecimento das matérias e questões que directamente respeitam às populações insulares, e só mediatamente às matérias de índole nacional, em especial quando estas se projectam sobre o ordenamento regional e se repercutem sobre a vida daquelas populações (…)”.Prometi a mim mesmo que leria com atenção, especialmente para as entre-linhas, este discurso. Vou fazê-lo…
Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 14 de Junho 2007

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