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quarta-feira, 13 de junho de 2007

Artigo: FISCALIZAÇÃO

O Presidente da República remeteu para o Tribunal Constitucional o diploma sobre incompatibilidades dos deputados das Assembleias legislativas da Madeira e dos Açores, arbitrariamente aprovado pela Assembleia da República, e que contraria normas constitucionais e estatutárias. A decisão de Cavaco Silva, remetendo para o TC uma decisão sobre esta matéria – e isso poderá ser útil dado que a jurisprudência que eventualmente venha a ser produzida, poderá ajudar a dissipar de uma vez por todas dúvidas, teimosias e sistemáticos atropelos legislativos que ciclicamente são ensaiados em Lisboa, contra a Madeira, tudo por causa do PSD e de João Jardim e não especificamente por causa da Madeira enquanto tal, há que reconhecer – foi acertada, não surpreende e, posso garantir convictamente, era a decisão esperada até pelos partidos (da esquerda) autores do diploma em questão.
A justificação dada pela Presidência da República, consta de um comunicado de Belém, lacónico, que recordo integralmente: “O Presidente da República solicitou hoje ao Tribunal Constitucional a fiscalização preventiva da constitucionalidade do decreto da Assembleia da República que alterou o regime jurídico de incompatibilidade e impedimentos dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos. O presente pedido de fiscalização da constitucionalidade não implica, por parte do Presidente da República, qualquer juízo de mérito sobre a extensão aos deputados às assembleias legislativas dos Açores e da Madeira do regime de incompatibilidades e impedimentos dos restantes titulares de cargos políticos. Aquele pedido decorre tão-só da existência de fundadas dúvidas quanto à constitucionalidade do diploma submetido a promulgação, uma vez que a matéria em apreço parece configurar-se da reserva de Estatuto Político-Administrativo das Regiões Autónomas, nos termos do nº 7 do artigo 231º da Constituição”.
Não se trata, como já ouvi, de qualquer frete presidencial à Madeira e aos Açores, mas em meu entender da única decisão que o Presidente da República poderia tomar, em face do disposto na Constituição sobre esta matéria, particularmente a conjugação da definição do estatuto dos titulares dos órgãos de governo próprio, com a competência em matéria de alteração dos Estatutos Políticos e com as competências da própria Assembleia da República.
Eu reconheço que é extraordinariamente difícil, para não considerar ser impossível, que se estabeleça uma diferença entre deputados à Assembleia da República e deputados às Assembleias Legislativas. Ou seja, suspeito que a opinião pública regional dificilmente entenderá, que os deputados nacionais estejam sujeitos a um regime de incompatibilidades que deixa de se aplicar aos deputados regionais, quando relativamente a tudo o resto, nomeadamente no que aos direitos e regalias diz respeito, os parlamentos regionais adoptam tudo o que se aplica em São Bento. Ou seja, mais tarde ou mais cedo, teremos que fazer alguma coisa, e o próprio Alberto João Jardim, mesmo antes das eleições de Maio passado, admitiu-o inevitavelmente. Os políticos não podem continuar sistematicamente sob suspeição, apenas porque a aplicação de um regime de incompatibilidades, que vigora para os deputados da República, incluindo os madeirenses eleitos para a Assembleia da República, que se aplica também a autarcas a tempo inteiro e a membros do Governo Regional, não serve aos deputados regionais. Ou é dada uma explicação razoável e lógica, ou teremos que fazer alguma coisa.
Mas uma coisa é o que eu penso sobre as incompatibilidades, e tudo o que os políticos possam dizer sobre esta temática, e o debate político, em, si mesmo, em torno desta temática, outra coisa são os subterfúgios, as manhosices políticas ensaiadas por partidos, principalmente à esquerda, que ignorando deliberadamente normas constitucionais e estatutárias, procuram impor mecanismos legais com base em metodologias francamente inadmissíveis. Se a Constituição remete a definição do estatuto dos titulares dos cargos públicos dos órgãos de governo próprio das Regiões para os Estatutos Políticos, se qualquer alteração estatutária depende apenas e só da iniciativa dos parlamentos regionais, como se pode aceitar que a Assembleia da República – que deveria constituir um exemplo no rigor e no cumprimento das normas que ela própria aprovada – faça tábua rasa de tudo isso e aceite, discuta e vote diplomas feridos à partida de comprovada inconstitucionalidade. Não acredito, por isso, que o Tribunal Constitucional possa protagonizar o milagre – mas tudo é possível em política... – de se pronunciar de forma diferente, ou de fazer um frete jurisprudencial, contrariando o que até hoje é um dado adquirido.
Em resumo, e para que quaisquer dúvidas se dissipem, o que está em causa, nesta minha posição pessoal, não tem nada a ver com a questão política das incompatibilidades em si mesmas, mas apenas e tão-somente com os procedimentos legislativos adoptados por PS, PC e Bloco de Esquerda, que naturalmente esbarraram em reacções semelhantes do PSD da Madeira e do PS dos Açores de repúdio da aprovação pelo facto de se tratar de matéria estatutária e, por isso mesmo, reservada a alterações no quadro de qualquer reforma dos Estatutos.
Luís Filipe Malheiro

Jornal da Madeira, 13 de Junho 2007

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