PINACULOS

Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 15 de junho de 2007

Artigo: Ronaldo

O pior que pode acontecer a uma pessoa é chegar à sua terra e sentir-se “a mais”, ainda por cima envolvidos em polémicas, de uma forma injusta. Confesso que nunca pensei escrever sobre o nosso Cristiano Ronaldo, pura e simplesmente porque não é matéria que me interesse. Mas reconheço que o jovem jogador foi injustamente visado durante a sua última visita à Madeira, por causa de factos que não lhe podem ser imputados. Eu acho lamentável — e tenho que dizer — o oportunismo político que rodeia o jogador. No passado, quando não passava de um ilustre desconhecido, estavam todos a se borrifar para Ronaldo e para a sua família. Hoje, ou andam à volta dele porque estão interessados nos milhões, indiferentes ao facto do rapaz poder contrair uma grave lesão ou coisas do género, ou querem ser levados às cavalitas pelo jogador do Manchester ganhando protagonismo que lhes dê visibilidade, ou pura e simplesmente são hipócritas.Ronaldo é um jogador de futebol, sujeito a um contrato de trabalho, contrato esse que impõe regras claras quanto à imagem dos jogadores, ao seu envolvimento em actos públicos ou em compromissos com entidade. A liberdade dos jogadores de futebol profissional está condicionada a factores diversos que não podem ser escamoteados, só pelos ignorantes. Dou um exemplo: se o Manchester decidir que os seus profissionais pura e simplesmente não falam para a comunicação porque é que esta haverá que “furar” essa decisão e penalizar o jogador infractor da decisão tomada pelo clube? Um funcionário de uma empresa qualquer não pode estar a trabalhar simultaneamente noutra, sem que haja, pelo menos, um assentimento da entidade patronal, o que por si só é um absurdo. No mundo do futebol, e no rigor britânico em particular, onde as regras são escrupulosamente cumpridas — ainda por cima quando o Manchester é só o maior clube do mundo — as coisas funcionam exactamente assim, com regras, com rigor. Ronaldo sabe como isso funciona.Cristiano Ronaldo nasceu em Santo António, no seio de uma família humilde, que vivia dos rendimentos que esforçadamente reunia. Eles próprios não escondem dificuldades que superaram pela união e pela sorte que acabou por lhes bater à porta. Aliás, as dificuldades não devem envergonhar ninguém. Durante os mais de 10 anos em que vivi em Santo António, ouvia falar, e várias vezes o via e ouvia, do Aveiro, o pai de Ronaldo, que repetidamente publicitava esse seu estatuto — nos autocarros de Santo António todos o conheciam — mais pelo orgulho que sentia pelo filho que entretanto dava os primeiros passos no mundo do futebol, do que por vaidade pessoal ou ânsia de protagonismo que o Aveiro do Andorinha certamente não perseguia. Depois, quando o “puto” foi para o Sporting e mais tarde para o Manchester — mas sobretudo quando esteve em Alvalade — o Aveiro já não precisava de anda a dizer quem era, porque todos o conheciam como o pai do “pequeno do Sporting”. Portanto, quando vejo um Ronaldo, entretanto bafejado pela sorte, devido às suas extraordinárias qualidades futebolísticas, vejo-o sempre com um puto humilde que, por isso, e por tudo o que passou, não merece a injustiça de ser mal tratado ou, pior do que isso, de ser pior aconselhado.Ronaldo é um jovem, conhecido mundialmente, rico, com uma margem de progressão grande, que tem apoiado, e bem, toda a sua família, e que naturalmente, fruto da velocidade como tudo aconteceu, tem cometido erros, excessos e se ridicularizado. Mas bem aconselhado ele vai superar tudo isso. Ronaldo precisa de organizar-se, de saber lidar com a comunicação social, de se consciencializar de que tudo o que diga ou fale tem hoje um significado e um impacto que não tinha num passado recente. Ronaldo não pode acreditar em demasia em empresários — não sei se é o caso do seu porque nem o conheço — que vêem os jogadores como um produto que se vende para gerar lucros. O madeirense pode ter precisado, precisou certamente, de empresários, para dar o salto da sua vida e da carreira, mas a sua categoria, a evolução registada, a forma como hoje se integra no clube e no futebol, inglês faz com que possa recusar ser refém de empresários. Mourinho, por exemplo, alguma vez aceitaria ser mandado por um empresário, por muito importantes que eles tenham sido na sua transferência para o Chelsea? Obviamente que não. Esses empresários já foram compensados pelo seu trabalho, já receberam as comissões acordadas, já encheram os bolsos à custa da transferência. A partir daí o problema diz respeito a Mourinho, ao que ele mostrar, ao que ele vale, porque não é o empresário que treina equipas ou ganha títulos. Ronaldo precisa de se organizar, de ordenar tudo o que se passa ou que gira à sua volta, precisa de ter cuidados redobrados nalguns assuntos, necessita de ser aconselhado, bem aconselhado nas relações com a imprensa, precisa de preparar bem toda e qualquer deslocação à Madeira, onde continuará a ser vitoriado e aclamado, especialmente pelos jovens, não deixando nada ao acaso ou entregue a meia dúzia de oportunistas ou amadores que nem para a pesca servem. Ele não precisa de ficar a dever nada a oportunistas de meia tigela que se colam. Enfim, Ronaldo, deve ter presente o percurso de Maradona, tudo o que de bom, mas também de mau e de péssimo, lhe aconteceu, tudo o que ele hoje passa por causa dos erros cometidos enquanto futebolista extraordinariamente muito bem pago. Há exemplos que, por muito duros que sejam, devem constituir uma referência. Por mim, continuarei sempre a puxar pelo Ronaldo, a estar ao lado dele, a sentir orgulho porque quando se fala dele — por muito português que ele seja — associamos logo a Madeira. Desejando sempre que ele tenha toda a sorte do mundo…
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 15 de Junho 2007

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