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sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Morreu o espião "sem cara"

O mais célebre dos espiões da antiga Alemanha de Leste, Markus Wolf, morreu durante o sono, aos 83 anos, na sua casa na capital germânica - no mesmo dia em que se assinalam 17 anos sobre a queda do Muro de Berlim, marco histórico da reunificação alemã que o mestre espião sempre disse ter sido para ele "uma surpresa".
Um dos maiores espiões da guerra fria - consensualmente aceite como fonte de inspiração para o mítico personagem Karla de John Le Carré, embora o autor sempre o tenha negado -, Wolf dirigiu entre 1958 e 1987 os serviços de espionagem externa da Segurança de Estado da Alemanha de Leste (a Stasi), pondo em activo movimento uma impressionante rede de mais de quatro mil agentes. Durante aquelas três décadas permaneceu como "o homem sem cara", por nunca ter sido fotografado.
Wolf foi o cérebro de algumas das mais audaciosas operações secretas da guerra fria, responsável pelo recrutamento de um agente junto do então chanceler da Alemanha Federal, Willy Brandt, que conduziu à queda deste último quando o espião comunista foi exposto em 1974.
"Não posso dizer que me sinto orgulhoso do que fiz. Mas creio que não vivi em vão", avaliou Wolf numa entrevista à Reuters em 1997. Em Memoirs of a Spymaster, Wolf diz que se fizer parte da história da espionagem será por ter aperfeiçoado o sexo na espionagem, referindo-se ao uso que fazia de agentes sedutores/as para obter segredos.
Após a reunificação da Alemanha, Wolf refugiou-se na Rússia, para onde a família, judia e comunista, fugira em 1934. Chegou a estar depois na Áustria até que, em Setembro de 1991, decidiu entregar-se à justiça alemã - que o condenou a seis anos de prisão por traição. A pena nunca foi cumprida por o Supremo alemão ter anulado todos os processos por espionagem feitos contra antigos responsáveis dos serviços secretos da ex-RDA.
Até ao momento da morte, Markus Wolf manteve a denúncia daquilo que descrevia como sendo uma "justiça dos vencedores", que dele quis fazer "o símbolo do mal", e jamais denunciou qualquer dos agentes que para ele trabalharam. Nos últimos anos vivia das conferências sobre espionagem e dos livros, entre os quais a autobiografia Man Without a Face.
Os herdeiros políticos do antigo partido comunista do Leste alemão (SED) celebraram ontem a memória do espião: um homem "cheio de contradições", observou o presidente do pós-comunista PDS, Lothar Bisky.
"Tenho seguido com algum assombro a idealização de Markus Wolf como um intelectual cheio de glamour e reformista", afirmava ontem à Reuters o historiador e analista político Timothy Garton Ash. "Mas a verdade é que ele foi parte de um dos piores engenhos de opressão da Europa pós-guerra", avançou o autor de The File: A Personal History, livro em que o escritor conta como descobriu o seu ficheiro da Stasi.

Dulce Franco (Publico)

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