Artigo: Crescimentos…
O Banco de Portugal saca, de quando em vez, de uma “cartola mágica” de Constâncio, perspectivas económicas que parecem ir contra tudo e contra toda a lógica. Para o BP, o crescimento económico português cresce, sempre para cima, a eito. Voltou a acontecer esta semana. Não se percebe bem como, mas a verdade é que a “sentença” de Constâncio está dada. Estatisticamente o banco central acrescenta mais três décimas à sua anterior previsão (que era de 1,5% ao ano em 2007). Os portugueses deixaram de acreditar no que lhes dizem de paradisíaco, porque às vezes mais parece destinado a servir de “almofada” ao governo socialista do que a expressar a verdade. O que é facto, é que perante a realidade económica das famílias e das empresas, os aumentos constantes de preços a níveis substancialmente superiores aos aumentos salariais, um poder de compra que tem levado “pancadaria” todos os anos, nos últimos dez anos, uma procura interna que não percebo como pode crescer, o sector imobiliário que entrou em “saldos” (!), o crédito mal parado que aumenta todos os meses, o desemprego que volta a subir, grandes empresas que fecham, etc, contradizem as estimativas animadoras do Banco de Portugal que às vezes parece querer “vender” um país que não é o nosso, aquele onde vivemos. Evidentemente que sabemos, particularmente os que mais informados se encontram sobre esta matéria, que as perspectivas económicas, mais do que estimativas sempre vulneráveis, particularmente a factores externos que não controlamos mas que podem ser decisivos, não são apresentadas com base em componentes políticas ou em qualquer forma de aproveitamento estatístico das contrariedades. Os especialistas utilizam outras componentes, fazem outras projecções, consideram outras componentes, internas e externas, eventualmente até trabalham num país diferente do nosso, embora vivam cá. Mas há factos, realidades e verdades, que não podem ser escamoteadas, nem por previsões de bancos centrais, por muito manipulados (ou manipuláveis) que sejam os indicadores estatísticos disponíveis num determinado momento. O que o Banco de Portugal não pode fazer, nem deve, é tentar manipular o percurso normal da economia portuguesa, condicionar seja o que for, cobrir políticas governativas numa dada conjuntura ou legitimar estimativas que, de uma forma ou de outra, podem deturpar a realidade com que os portugueses e as empresas se confrontam permanentemente. Isto tudo porque o Banco de Portugal reviu em alta a previsão de crescimento da economia portuguesa este ano de 1,5 para 1,8%, igualando a expectativa do Governo socialista de Sócrates. Pura coincidência… E o aviso está dado nas previsões de Inverno do Banco de Portugal: o crescimento da economia portuguesa do próximo ano será ainda melhor, atingindo 2,1%. O banco central justifica a melhoria das previsões para este ano com o salto das exportações e com o facto do consumo poder dar também um empurrão. O investimento será nulo e terá um comportamento inverso às exportações e ao consumo. Evidentemente que a melhoria das condições económicas será acompanhada pelo agravamento da inflação, que atingirá os 2,3% — duas décimas acima do valor previsto pelo governo socialista para este ano e que serviu como valor de referência para a negociação dos aumentos salariais da função pública. Mas existem dois “pequenos” pormenores que nem todos os meios de comunicação social abordaram. O primeiro, que resulta do facto do défice das balanças correntes e de capital (BCC), segundo o Banco de Portugal, poder cair para 7,6% em 2006 e para 7,3% e 7,2%, em 2007 e 2008, respectivamente. Em segundo lugar, porque as estimativas avançadas para a economia portuguesa em 2007 e 2008, foram feitas com base numa série de pressupostos, que “assentam nas expectativas implícitas nos mercados de futuros até ao final do horizonte de projecção (2008)”. Por exemplo, que a taxa de juro de curto prazo aumentará de um valor médio de 3,1% em 2006, para 4% em 2007 e 4,1% em 2008 e que o preço do petróleo se estabilizará em valores médios anuais próximos de 65 dólares por barril de petróleo ‘brent’ em 2006 e 2007 (54 dólares em 2005), aumentando de novo para cerca de 69 dólares em 2008. E se tudo isto “der para o torto”?… n P.S. Deixo, finalmente, uma nota para reflexão, sobre a alegada “recuperação” económica e estatística de Portugal, reclamada pelo governo socialista e apadrinhada pelo sempre solícito Banco de Portugal. No passado dia 21 de Dezembro, a fábrica da “General Motors” na Azambuja, encerrou portas, definitivamente, lançando para o desemprego cerca de 1.200 trabalhadores. Tudo porque a multinacional decidiu proceder à deslocalização da sua unidade fabril para as novas instalações da Opel, em Saragoça, Espanha. Os trabalhadores assinaram um acordo de rescisão com a empresa que pagará dois meses de salário por cada ano de trabalho, acrescido de um prémio de 1.700 euros por cada trabalhador, caso o objectivo de produção fosse alcançado. A “General Motors” já garantiu que não pretende promover nenhuma deslocalização na Europa, pelo menos até 2012, o que implica a manutenção em funcionamento das suas sete fábricas existentes na Europa Ocidental e que empregam cerca de 68 mil pessoas. Para Portugal ficou a constatação de que esta transferência da Opel para Espanha acabou com 43 anos de funcionamento das instalações da Azambuja, que em 2005 montaram mais de 70 mil veículos.
Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 12 de Janeiro de 2007
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