Em busca do túmulo perdido da família de Jesus
Será possível que, enterrado - e esquecido - debaixo de um condomínio num bairro de Jerusalém, esteja o túmulo da família de Jesus, com, entre outros, os ossários de Maria, Maria Madalena, o próprio Jesus, e ainda uma criança, identificada como Judas, filho de Jesus? Parece pouco plausível. Mas Simcha Jacobovici, realizador judeu nascido no Canadá, está convencido de que é praticamente impossível tratar-se de uma coincidência que, naquele túmulo, estivessem enterradas tantas pessoas com os nomes dos principais protagonistas do Novo Testamento. Convenceu James Cameron, o realizador de Titanic, a produzir o projecto, e os dois fizeram The Lost Tomb of Jesus (na versão portuguesa O Código de Cristo, O Túmulo Perdido), o polémico documentário, contestado por especialistas de diferentes áreas, que a SIC transmite hoje à noite. A história começa em 1980, quando os operários que escavam um terreno para construção encontram a entrada de um túmulo antigo - o acontecimento é banal numa cidade como Jerusalém, onde qualquer escavação revela vestígios arqueológicos. No interior do túmulo estavam dez ossários, pequenas caixas de pedra clara, que os arqueólogos observaram, classificaram e guardaram no Museu Rockfeller, sob a responsabilidade da Autoridade de Antiguidades Israelita. Foi aí que permaneceram durante mais de 20 anos. Tese contestada E foi aí que Jacobovici os encontrou e observou atentamente, concluindo aquilo que até aí mais ninguém concluíra: que os nomes discretamente gravados na pedra de cada um dos ossários - Jesus, filho de José, Maria (escrito em aramaico, mas com a forma latina do nome hebraico Miriam), Yose (diminuitivo de José, supostamente um dos irmãos de Jesus), Mariamne e Mara (uma inscrição controversa, que Jacobovici traduz como "Maria Madalena, a mestra", e outros lêem como "Maria e Marta" e defendem que os dois nomes foram escritos em momentos diferentes), e ainda Judas, filho de Jesus - seriam os da família de Jesus Cristo. A tese defendida por Jacobovici - e que com a ajuda de Cameron se transforma num filme de aventuras e suspense - tem sido contestada quer por arqueólogos, quer por especialistas na Bíblia ou nos inícios do cristianismo, entre os quais nomes respeitados como o do arqueólogo israelita Amos Kloner, que em 1980 fez a primeira catalogação do que se encontrava no túmulo. Muitos dos que a contestam argumentam que Jesus vinha de uma família pobre de Nazaré, que dificilmente teria um túmulo daquela grandeza e importância em Jerusalém. Dizem também que Maria, José, Jesus e Judas eram os nomes mais comuns na época, e que aparecem em inúmeros ossários. "São nomes muito banais para a época", confirma o biblista padre Joaquim Carreira das Neves. No que diz respeito à existência, ou não, de irmãos de Jesus, explica que é uma questão de interpretação, havendo teólogos que consideram que os Evangelhos se referem a irmãos de sangue, enquanto outros defendem que seriam apenas familiares, membros da mesma tribo ou clã. Quanto ao nome Mariamne, Carreira das Neves confirma que era usado na época, mas não vê nele nada que permita concluir que se trata de Maria Madalena. "Madalena significa que ela era da cidade de Magdala, e em Mariamne nada indica isso". Mas Jacobovici é um homem determinado e continuou a sua investigação. Com restos de ossos recuperados dos ossários faz análises de ADN que concluem as pessoas identificadas como Jesus e Mariamne (a suposta Maria Madalena), apesar de estarem no mesmo túmulo não são da mesma família de sangue - logo, pode admitir-se que fossem marido e mulher. A tese defendida no filme é a de que Jesus teria casado e teria tido um filho, ou seja, a mesma que Dan Brown apresenta no Código Da Vinci.
Um bom filme
As ideias de Simcha Jacobovici colocam vários problemas aos católicos. Um deles, central para a fé católica, é o da ressurreição, que a alegada descoberta dos ossos de Jesus poria em causa. "A catequese cristã", explica Carreira das Neves, "faz sempre referência à parte corporal. Há uma totalidade e não uma dualidade [separação do corpo e da alma]". Embora "haja teólogos que defendem que a ressurreição pode ser apenas relativa à alma, essa não é a posição da Igreja, que considera que não há pessoa sem o corpo e a alma". O outro grande problema é, claro, o da suposta descendência de Jesus. Aí, o que Jacobovici sugere é que, dadas as perseguições aos primeiros cristãos, a existência de uma criança teria sido mantida em segredo, para a proteger - e que essa criança seria o "discípulo amado" a que se referem os Evangelhos. Podem uns nomes gravados na pedra há dois mil anos mudar a história do cristianismo? Jacobovici parece achar que sim, mas muito poucos investigadores credíveis o levam a sério. "Dá uma grande história para um filme", disse ao Jerusalem Post o arqueólogo Amos Kloner. "Mas é impossível. Não faz sentido." Fonte: Alexandra Prado Coelho, Público
As ideias de Simcha Jacobovici colocam vários problemas aos católicos. Um deles, central para a fé católica, é o da ressurreição, que a alegada descoberta dos ossos de Jesus poria em causa. "A catequese cristã", explica Carreira das Neves, "faz sempre referência à parte corporal. Há uma totalidade e não uma dualidade [separação do corpo e da alma]". Embora "haja teólogos que defendem que a ressurreição pode ser apenas relativa à alma, essa não é a posição da Igreja, que considera que não há pessoa sem o corpo e a alma". O outro grande problema é, claro, o da suposta descendência de Jesus. Aí, o que Jacobovici sugere é que, dadas as perseguições aos primeiros cristãos, a existência de uma criança teria sido mantida em segredo, para a proteger - e que essa criança seria o "discípulo amado" a que se referem os Evangelhos. Podem uns nomes gravados na pedra há dois mil anos mudar a história do cristianismo? Jacobovici parece achar que sim, mas muito poucos investigadores credíveis o levam a sério. "Dá uma grande história para um filme", disse ao Jerusalem Post o arqueólogo Amos Kloner. "Mas é impossível. Não faz sentido." Fonte: Alexandra Prado Coelho, Público
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