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sábado, 14 de abril de 2007

Artigo: MENTIRA E DESPEDIMENTOS

É público que o Governo Regional da Madeira encomendou um estudo sobre a realidade do funcionalismo público na Região, particularmente com incidência sobre a estrutura e modelo de funcionamento dos serviços, estudo esse que, obviamente, não pode ser dissociado da contabilização dos efectivos presentemente ao serviço. Recuso a teoria de que na Madeira está tudo bem e que as coisas funcionam mal ou deficientemente, penas “lá fora”. Acabemos de uma vez por todas com essa treta do auto-convencimento que, quanto muito, nos engana a nós próprios. Trinta anos depois, é mais do que evidente que o modelo estrutural do funcionalismo público tem que adaptar-se a novas realidades, a novas exigências, a novos modelos de gestão de recursos humanos, a novas exigências no domínio da formação e da qualificação (que não pode continuar a ser olhada como um “frete” ou uma obrigação para dar mais uns pulos na carreira profissional, sem que exista uma convicção e uma motivação para essa absorção de mais conhecimentos e capacidades), enfim a novos desafios. Estamos hoje numa era da globalização irreversível, quer no acesso à informação, quer no primado das novas tecnologias de informação, que fazem, com que procedimentos, comportamentos, métodos de trabalho e estruturas que porventura responderem no passado ao que se esperava, hoje estão ultrapassadas ou funcionem de forma deficiente, realidade indesmentível por muito grande que seja, e é, a reacção corporativista visando contrariar a mudança e de pugnar pela manutenção do “status quo”.
Por outro lado, parece-me evidente que nenhum governo encomenda um estudo para que tudo continue na mesa ou para o emoldurar e pendurar numa parede. O recurso a especialistas, à apresentação de novas ideias de novos modelos, de recomendações ou sugestões, significa que houve uma prévia constatação de que era preciso fazer alguma coisa. Tal como o governo socialista da República em Lisboa sentiu necessidade do seu “Parce”, na Madeira o governo regional sentiu necessidade de olhar para a estrutura do funcionalismo público de uma forma diferente, porventura menos passiva do que até hoje acontecia. Trinta anos, é muito tempo, porventura tempo demasiado, para que não se alterem as coisas, desde que isso corresponda a uma preocupação qualitativa, a mais eficácia, mais celeridade, mais seriedade.
Estamos a falar de um estudo encomendado à mesma equipa que apresentou semelhante iniciativa ao governo socialista em Lisboa (equipa essa liderada pelo madeirense e professor universitário, João Bilhim), e que viria a estar na origem da institucionalização do denominado “PARCE” – Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado – que no caso da Madeira eventualmente se chamaria “PRARAM” – Programa de Reestruturação da Administração Regional Autónoma – ou coisa que o valha. É-me indiferente. Desconheço em absoluto, o teor desse estudo, tão pouco me importa saber se o mesmo já foi entregue na sua versão final, uma estrutura micro, ou se apenas foi canalizado para o governo madeirense, se o foi, uma versão preliminar, com uma dimensão macro, que não vai naturalmente ao âmago da questão. O que me parece estranho em tudo isto é a insistência dos socialistas locais no alegado despedimento ou dispensa de 30% do funcionalismo público, cenário repetidamente desmentido por Alberto João Jardim e pelo PSD, embora eu tenha a consciência de que em situações como esta, aliás como em tudo na política, quem acaba por ser olhada com desconfiança é a versão governamental (poder é poder...) e não quem recorre à mentira, à deturpação ou à manipulação. Por isso, penso que este assunto tem que ser cabalmente esclarecido, para que se evite que durante mais de um mês de campanha os socialistas andem a agitar uma bandeira, particularmente sensível para um sector importante do eleitorado regional.
Mas o que é absolutamente hipócrita, é que sejam os socialistas locais a manifestar-se “preocupados” com os funcionários públicos, ou que desafiem o Governo Regional a divulgar um estudo que alegadamente existirá, mas que eu desconheço, quando é sabido que em nome do “PARCE”, o governo socialista central, para além de tudo o que tem feito aos funcionários públicos em matéria salarial e de carreiras, assumiu que quer reduzir em 75 mil efectivos até final do seu mandato (em 2009) o número de funcionários públicos actualmente existentes em Portugal. Ainda há dias, na entrevista televisiva de Sócrates a propósito da “estória” do canudo, o primeiro-ministro socialista bem se vangloriou por ter conseguido, até ao momento, reduzir 10 mil funcionários e 25% das chefias...
Por isso, das duas uma: ou estamos perante um “bluff” de campanha eleitoral, de caça ao voto, e que tem tanto de verdade como dizermos que a Madeira tem petróleo no Pico Ruivo, revelando esta estratégia mentirosa o carácter dos socialistas e a consistência dos “princípios éticos” que os norteiam, o que não é propriamente uma novidade, ou, pelo contrário, algum (uns) do(s) autor (res) do estudo em questão, e efectivamente encomendado pelo Governo Regional, porque foi uma decisão pública, terá passado alguma informação aos socialistas, cenário este que considero absurdo, conhecendo-se as pessoas em questão. É por isso que tenho alguma dificuldade em compreender, o que me surpreenderia negativamente, que Bernardo Trindade, o primeiro a falar em 5.000 despedimentos na função pública regional, tivesse entrado por este caminho de demagogia eleitoralista e mentirosa. É fácil aos socialistas falarem de 5 mil despedimentos ou de 30% efectivos a dispensar. Mas a verdade é que não dizem mais nada, não têm bases que confirmem essa verborreia malcheirosa. O próprio Jacinto Serrão, naquela cruzada tonta e descarada, caracterizada pelo disparar de tiros de pólvora-seca a partir de um palanque, com um ar triunfal, até garantiu há dias em Machico - onde mais poderia ter sido?!... – que “sabia” o que esse estudo dizia, o que considero ser uma mentira à imagem e semelhança da dimensão de quem profere tal disparate.
Luís Filipe Malheiro

Jornal da Madeira, 13 de Abril 2007

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