PINACULOS

Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2007

Artigo: Três Notas

I. Há coisas que não lembram o diabo mas que mostram a eficácia de medidas governamentais, anunciadas com grandes parangonas, algumas das quais chegaram a alimentar ainda mais conflitos institucionais já suficientemente “aquecidos” e a “queimar” ainda mais o relacionamento entre o Estado central e a Madeira. É o caso da lista dos devedores ao fisco. Pois bem, na semana passada foi noticiado — claro está — sem grande projecção ou divulgação mediática, porque isso contraria a propaganda socialista, que “a lista de devedores ao fisco continua a aumentar e que, na última actualização (realizada a 7 de Fevereiro), foram acrescentados mais 176 nomes”. Segundo o jornal que divulgou esta notícia, demonstrativa da eficácia de certas medidas folclóricas do Ministério das Finanças (a quem valeu a competência e a eficácia do director-geral de contribuições e impostos e a capacidade de resposta dada pelos serviços, a par de uma certa consciencialização dos cidadãos e das empresas, que cumpriram as suas obrigações, apesar de se confrontarem todos os dias com medidas governativas lamentáveis), “o aumento de contribuintes resulta do facto de, desde Janeiro, poderem figurar nestas listagens todos os contribuintes singulares com dívidas de valor igual ou superior a 25 mil euros (anteriormente este limite era de 50 mil euros) e contribuintes colectivos (empresas) com dívidas de valor igual ou superior a 50 mil euros (antes o limite era de 100 mil euros)”. Evidentemente que a publicação da lista dos devedores da administração fiscal terá permitido ao Estado arrecadar quase 60 milhões de euros em dívidas que estavam por cobrar, segundo anunciou o governo. Mas, pelos vistos, a realidade continua a ser inegavelmente ampla, porventura excessivamente mais ampla do que se possa pensar.

II. Muito se tem falado dos projectos da OTA e do TGV, mais pelos seus custos do que pelo seu impacto para o nosso país, principalmente por causa de uma estranha insistência depositada pelo actual governo socialista nestes dois projectos milionários… Há dias, li num jornal económico de Lisboa que “Portugal tem seis meses para concluir o programa de reformas, em particular o da Administração Pública, com que se comprometeu no início da legislatura, sob pena de pôr em risco todos os objectivos definidos. A presidência da União Europeia, no segundo semestre deste ano, é um “grande risco” já que as autoridades poderão cair na tentação de não dar atenção à agenda nacional e 2008 poderá ser um ano já voltado para as manobras eleitorais para garantir uma reeleição do Partido Socialista. O alerta é feito pela economista da The Economist Intelligence Unit (o gabinete de investigação da revista “The Economist”). “As reformas da Administração Pública estão a surgir demasiado tarde”, lamentou a responsável na organização pela economia portuguesa. “Esperávamos que a lei sobre a função pública tivesse sido aprovada no final do ano passado e que, em Janeiro, já estivesse em prática. No entanto, o Governo ainda está a aprovar na Assembleia as leis, uma a uma”. Para adensar estas dificuldades, a economista fala da presidência portuguesa da UE — e da necessidade do “Governo não perder de vista o objectivo” — e das pressões políticas que Sócrates vai enfrentar para garantir que em 2009 o PS vença novamente as eleições legislativas. “O problema é que por trás de Sócrates existem outros ministros e um partido. Ele é pressionado para ser um bom primeiro-ministro socialista, que não é [socialista]”, sublinhou. “O Governo não deve tornar-se complacente. Vai levar muito tempo até que o crescimento comece a aparecer, mas isso é uma questão estrutural e não há muito que o Executivo possa fazer. A única coisa que o Governo não está a fazer é gastar dinheiro. Se o fizer, isso será um grande, grande erro”, alerta Ania Thiemann”. Que dizer? Reflictamos…


III. Por outro lado, também a OCDE distribuiu recentemente um documento oficial da organização segundo o qual “Portugal precisa ter uma legislação laboral mais flexível, que facilite os despedimentos individuais”! Esta é uma das principais conclusões do relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico, documento que analisa as reformas estruturais implementadas e por implementar nos trinta Estados que dela fazem parte. No nosso caso, a OCDE considera prioritárias para o nosso país intervenções no domínio da educação (Ensino Secundário e Superior), da competitividade (mais flexibilidade na indústria e nos serviços) e no mercado de trabalho, recordando a organização internacional que depois da entrada em vigor do novo Código do Trabalho (em 2003) “não foram adoptadas quaisquer outras medidas para reformar a legislação laboral. Existem normas demasiado restritivas que impedem a mobilidade dos trabalhadores, reduzem a criação de postos de trabalho permanentes e atrasam a introdução de novas tecnologias”. Como sempre, é mais fácil fazer recomendações — principalmente de fora para dentro — do que depois concretizá-las: “A solução está em tornar mais flexíveis as regras de contratação, facilitando as rescisões individuais que tornariam a economia mais competitiva e promoveriam uma maior contratação de trabalhadores regulares”. Não deixa de ser curioso que, segundo o jornal que deu esta notícia, as fontes governamentais contactadas pelos jornalistas tenham garantido que “o ministro do Trabalho e o Governo, em geral, aceitam todas as recomendações que forem feitas”. Depois das iluminadas declarações do ministro Manuel Pinho na China, onde os baixos salários e a rédea curta dos trabalhadores se transformaram em bandeiras de atracção de investimento externo e da competitividade portuguesa, segue-se agora uma posição intolerável do governo socialista de submissão a sugestões não vinculativas e facilitistas de uma organização que, apesar de tudo, vale o que vale e não tem que estar a dar ordens a Portugal. Mas, pelos vistos, os socialistas continuam a baixar a bola sempre que alguém de fora abre os queixos… O que é que querem? É este o nosso país, é neste país que vivemos…
Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 23 Fevereiro de 2007

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