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quarta-feira, 9 de maio de 2007

Máfia dos bingos financiou PS no Brasil e queria casino em Lisboa

O PSD exige que o PS esclareça "com urgência" as ligações dos socialistas aos detidos na operação Furacão, um grupo acusado de, a partir do Brasil, negociar sentenças judiciais e decisões políticas para beneficiar casas de bingo e de máquinas de jogos de azar. Licínio Soares Bastos, um dos empresários portugueses detidos, é dos maiores financiadores do PS no Brasil e suportou grande parte das despesas da campanha do candidato socialista ao círculo fora da Europa nas legislativas de 2005, Aníbal Araújo.
Licínio é também proprietário do imóvel onde está instalada a sede do PS no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca. O empresário viria a ser nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, um ano depois de José Sócrates chegar ao poder, mas o processo nunca chegou a ser formalizado junto do Ministério das Relações Exteriores do Brasil.
A Polícia Federal (PF) brasileira suspeita que o português fosse o intermediário do grupo nas negociações para abrir casinos em Portugal e no Brasil. Numa das escutas anexadas ao processo, outro detido, o advogado e empresário Jaime Garcia Dias, admitia ao vice-presidente da Associação dos Bingos do Rio de Janeiro, José Renato Granado, que estava em Portugal reunido com deputados e que as despesas da estadia estavam a ser suportadas "pelo presidente da câmara". Na transcrição da escuta, o empresário brasileiro nunca revelava o nome ou o partido dos deputados e do autarca.
"O PS e o Governo têm de clarificar esta situação com urgência, é o nome de Portugal e das comunidades portuguesas que está em risco", sublinhou José Cesário, deputado do PSD e antigo secretário de Estado das Comunidades.
Licínio Soares Bastos é natural de Oliveira de Azeméis, de onde é também oriundo o candidato do PS ao círculo de fora da Europa em 2005, Aníbal Araújo. O primeiro é fundador de alguns dos jornais administrados por Aníbal Araújo. "É um benemérito que muito ajuda a comunidade portuguesa, não há qualquer promiscuidade", enfatiza Araújo. Antes das legislativas de 2005, a confusão instalou-se na secção do PS no Rio de Janeiro, sem se saber quem dirigia esta estrutura. Terá sido por essa altura que se tornaram públicas as relações entre Aníbal Araújo e Licínio Bastos - alguns elementos do PS defendem que o empresário brasileiro impôs o nome do futuro candidato. "Foi então que o sr. Licínio [Soares Bastos] disse que foi contactado pela direcção do PS para ajudar o partido. Aí, criou a sede e pagou a campanha de Aníbal Araújo", disse ao PÚBLICO Eduardo Moreira, antigo deputado do PSD para o círculo fora da Europa e residente no Rio de Janeiro. A "ostentação" da campanha motivou uma queixa do PSD à Comissão Nacional de Eleições, apresentada a 20 de Abril de 2005. "Utilizaram aviões, cartazes em autocarros, programas de rádio e televisão aqui no Brasil. É óbvio quem suportou tudo isso", expõe o social-democrata. "Eu desconheço se o sr. Licínio, de quem sou amigo, financiou ou não a minha campanha", contrapôs Aníbal Araújo. O deputado José Lello, antigo secretário de Estado e responsável pela área das Comunidades Portuguesas do PS, também alega desconhecer a origem do financiamento. "Isso é da responsabilidade do candidato. Conheci Licínio Soares Bastos durante essa campanha, foi-me apresentado por Aníbal Araújo. Não sei se foi ele o financiador", afirmou, argumentando também ignorar que a sede do PS no Rio de Janeiro funciona em instalações do empresário agora detido. O actual responsável pelo departamento de Relações Internacionais e Comunidades Portuguesas do PS, Luís Pisco, admite e desvaloriza o facto de a sede do PS no Rio de Janeiro estar instalada numa propriedade de Licínio Bastos. "É normal isso acontecer, ele quis ajudar o partido. Posso é garantir que as reuniões políticas do partido se realizam noutro lugar", frisou. Pisco não soube, no entanto, identificar os actuais dirigentes socialistas no Rio de Janeiro.
Cônsul em Cabo Frio
Colocando a tónica na sede do partido e na "generosidade" do empresário agora detido, o social-democrata Eduardo Moreira recorda conversas antigas. "Eu não sei se há promiscuidade ou não, sei é que o sr. Licínio dizia que o apoio ao PS lhe renderia contrapartidas comerciais em Portugal", sublinhou. Um ano depois de o PS chegar ao poder, Licínio Soares Santos foi nomeado cônsul honorário de Portugal em Cabo Frio, a 150 quilómetros do Rio de Janeiro. A nomeação, despachada pelo secretário de Estado das Comunidades, António Braga, foi publicada em Diário da República dia 16 de Maio de 2006, mas veio a ser suspensa meses depois quando se constatou que Licínio Bastos estava a ser investigado pelas autoridades brasileiras. A secretaria de Estado justificou a indigitação pela "disponibilidade" manifestada por Licínio Bastos para suportar todas as despesas do posto consular. "O Estado português não teria qualquer despesa com esse consulado, Licínio Bastos ofereceu-se para suportar todo o investimento para ajudar a comunidade portuguesa, ele é um benemérito e até ser condenado merece a presunção de inocência", explicou ao PÚBLICO Eduardo Saraiva, assessor de imprensa do secretário de Estado das Comunidades, António Braga. Um argumento que não colhe, pelo menos junto de Eduardo Moreira, que também já presidiu ao Conselho das Comunidades Portuguesas no Rio de Janeiro."Em Cabo Frio residem no máximo 20 portugueses, não faz sentido abrir aí um consulado e encerrar o de Santos, onde habitam cerca de 15 mil pessoas com ligações a Portugal", disse. António Braga, Eduardo Saraiva e Luís Pisco foram telefonicamente contactados pelo PÚBLICO em Salvador da Bahia, onde participam no congresso da União Portuguesa da Imprensa Regional, estrutura presidida por Aníbal Araújo.
Fonte: Publico, Nuno Amaral, Rio de Janeiro

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