Artigo: DUAS NOTAS
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É um facto – e seria hipocrisia da minha parte passar ao “lado” - que politicamente o Funchal vive hoje momentos de alguma movimentação política, polémica que provavelmente tende a arrastar-se no tempo, tudo por causa do relatório de uma auditoria realizada pelo Governo Regional à Câmara Municipal do Funchal - ao que consta ao mandato anterior ao que foi iniciado em 2005 – documento que ninguém conhece, mas do qual muita gente fala em pormenor, o que não deixa de ser estranhíssimo. Confesso que a minha opinião é a de que a gestão deste processo pode não ter sido a adequada, o que nada tem a ver com qualquer forma de apologia – longe de mim tal intenção – de branqueamento de situações menos claras que, agora, pela projecção mediática que a assunto alcançou, precisam de ser cabalmente esclarecidas. Mas uma coisa é conseguir que isso aconteça, outra coisa é alimentar a especulação, o aproveitamento partidário que tem sido feito, sem qualquer consistência. Eu percebo que o PS ande freneticamente a pedir a perda de mandato do Presidente da Câmara, julgando-o antecipadamente, parecendo inclusivamente que continua empenhado num ajuste de contas” por causa da derrota eleitoral de Dezembro de 2005. É um comportamento normal neste partido. Não me parece eticamente correcto que se ande a julgar na praça pública as pessoas, seja quem for, emitindo sobre elas juízos de valor ofensivos para a sua dignidade e que, por absurdo, sejam políticos que, por razões que não vamos agora discutir, perderam (ou não?) o seu mandato autárquico, a reclamar a demissão do edil funchalense e a assumir-se como se de ”justiceiros” se tratassem, quando não são.
O que me parece essencial perceber, a partir do momento em que o documento foi legalmente remetido às entidades judiciais competentes, é que a especulação não pode ser alimentada assim como não se pode meter antecipadamente a cabeça-na-areia. Caberá às entidades judiciais uma decisão, pelo que mandaria a ética que os políticos não tentassem nem manipular, nem antecipar-se nem influenciar quem tem a tarefa de decidir com verdade, com isenção e com base em factos, não em suposições. Da minha parte, não farei mais nenhum comentário sobre esta temática até que seja confrontado com decisões em concreto. No final, a haver responsabilidades, nesse caso elas terão que ser assumidas por quem de direito. E nada mais tenho a referir.
II. João Carlos Gouveia multiplica-se em entrevistas como se isso lhe desse votos, ora anunciando uma audiência com um ministro mas depois é recebido por um secretário de estado, ora falando sobre trivialidades. Gouveia corre o risco de esgotar-se, de banalizar a presença de um político na comunicação social, mesmo que tenha encontrado – e tem encontrado – uma certa capacidade de “penetração” noticiosa. Gouveia tem que perceber que, nas legislativas nacionais de 2009, se joga o primeiro “round” do seu mandato. Um mau resultado do PS, dará origem, inevitavelmente, a movimentações internas antecipadas no PS local, onde alguns barões recusam a possibilidade de ser o actual líder o candidato nas regionais der 2011, ainda por cima, como já foi anunciado, sem ter Alberto João Jardim como candidato no PSD. Tenho, confesso, alguma dificuldade em admitir que o próprio Gouveia esteja disposto a sê-lo. João Carlos Gouveia, mais do que este protagonismo quase frenético que não o conduz a lado nenhum, nem lhe dará coisa nenhuma, tem que perceber, mais do que tudo isso, que precisa de mostrar a coragem – tal como prometeu aos seus correligionários - para concretizar as mudanças no seu partido. O problema de um partido, em momentos de fracasso e de desaire eleitoral, não se circunscrevem a mudar o líder, a não eleger vices, a conseguir umas tantas entrevistas na comunicação social, e a deixar tudo o resto tal como estava antes. Um partido que, por medo ou por comodismo, opte pela via mais fácil - neste caso até foi Jacinto Serrão quem facilitou as coisas, ao não se recandidatar – de mudar coisa nenhuma, vai bater de frente, vai estalelar-se contra um paredão. Para o PSD até é bom que isso aconteça, como facilmente se depreende. Para a democracia regional e para a perspectiva qualitativa da oposição regional, obviamente que será desastroso. Gouveia tem que conquistar o PS e desconfio que ainda esteja longe de o conseguir. E nem falo nas elites socialistas, nas poucas elites socialistas, porque essas, quase de certeza, não estarão com ele, porque não subscrevem nem a sua liderança, nem as suas ideias, nem o seu discurso, nem a sua forma de fazer política. Além de que, e insisto neste questão, Gouveia é uma espécie de “cristão-novo” nos socialistas, ao qual aderiu já em finais dos anos 90, sem qualquer percurso histórico anterior, salvo porventura uma cumplicidade efémera com o ex-PRD.
Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 21 de Agosto 2007
Jornal da Madeira, 21 de Agosto 2007
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