PINACULOS

Opinião e coisas do nosso mundo...

sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

Campeã de velocidade com a cabeça coberta

Ruqaya Al-Ghasara fez história: medalha de ouro nos 200 metros nos Jogos Asiáticos. A marca foi banal; o lenço na cabeça é que não é. A sprinter do Bahrein Ruqaya Al- Ghasara teve de dizer a mesma coisa várias vezes depois da vitória: não a atrapalha correr com o hijab, o tradicional lenço muçulmano que lhe cobre a cabeça. Na verdade, insistiu, até a torna mais rápida.
"Usar o vestuário tradicional muçulmano deu-me coragem. Não é um obstáculo - antes pelo contrário", reafirmou Al-Ghasara depois de ganhar a final dos 200 metros na modalidade de atletismo nos Jogos Asiáticos, com o tempo de 23,19 segundos. Na prova dos 100 metros, Al-Ghasara tinha alcançado a medalha de bronze. Na pista, mesmo à distância, é imediatamente reconhecível, por causa do equipamento que só deixa à vista as mãos e o rosto. O tecido é leve e elástico e o hijab branco exibe o mais do que conhecido logótipo da marca de equipamento desportivo que a patrocina. A atleta afirma que o equipamento se trata de uma escolha pessoal, embora a tradição tenha um peso determinante. Enquanto outras atletas do Bahrein se apresentaram vestidas da forma mais comum nas competições internacionais, o facto é que muitas são estrangeiras naturalizadas que não foram educadas segundo a tradição muçulmana. Al-Ghasara, que aponta como ídolo e modelo a campeã norte-americana Marion Jones, diz esperar que a sua escolha inspire outras mulheres muçulmanas a praticarem atletismo e outras modalidades.
"Usar o hijab mostra que não há obstáculos. Alcancei os meus melhores tempos com ele e foi com ele que me qualifiquei para Osaka", declarou, referindo-se à cidade japonesa que organiza em 2007 os Mundiais de Atletismo. Embora a atleta forneça poucos pormenores, o seu caminho até ao topo não foi dos mais fáceis. Al-Ghasara tem 24 anos e chegou tardiamente às pistas, numa nação onde as mulheres têm tradicionalmente sido desencorajadas de competir. Descoberta no liceu, foi indicada ao treinador Tadjine Noureddine, que a guiou até à sua primeira medalha de ouro, nos Jogos Árabes realizados na Jordânia em 2002. "Ela tem excelentes qualidades como sprinter", afirma Noureddine, um antigo corredor de provas com barreiras. "O único problema é que começou tarde e por isso tivemos que trabalhar duramente os alongamentos e a potência muscular. No Bahrein, o desporto para as mulheres é uma coisa nova, com cerca de cinco anos", conta. O treino incluiu uma importante vertente psicológica e exercícios em altitude na África do Sul, revela. Com tudo isto, Al-Ghasara tem conseguido manter afastadas as lesões, tirando alguns problemas nas costas. A atleta não se cansa de agradecer ao treinador, que afirma conhecer perfeitamente quer os segredos da modalidade, quer as questões extra-atletismo envolvidas. "É muçulmano e árabe, por isso conhece bem as tradições islâmicas", afirma.
Christopher Bodeen, Jornalista da AP

O brilho do Ouro Bactriano

O tesouro de Tillia-Tepe, contemporâneo da época do nascimento de Jesus Cristo e conhecido como Ouro Bactriano - inclui desde pequenas contas a coroas, vestidos e sandálias -, foi descoberto em 1978 perto do rio Oxus, no Norte do Afeganistão, por uma equipa de arqueólogos russos. Depois de mais de 30 anos de guerras, invasões e saques em que foi dado como desaparecido, voltou a ser encontrado há apenas dois anos escondido sob pilhas de notas fora de circulação no palácio presidencial afegão. Está no Museu Nacional de Arte Asiática de Paris (Musée Guimet), numa exposição itinerante do Museu Nacional de Cabul. Conseguir a exposição do tesouro de Tillia-Tepe foi um golpe de rins do Presidente francês Jacques Chirac, que entrou em negociações directas com o seu homólogo afegão, Hamid Karzai, quando o mundo inteiro - Estados Unidos, Holanda, Áustria, Coreia... - a queria mostrar em primeira mão.

FBI tenta decifrar código secreto na Bíblia de padrinho da Máfia

O Código Da Vinci poderá em breve ter um concorrente sério. É que a chaves secretas que, supostamente, foram deixadas à humanidade pelo inventor italiano podem não ter comparação com um novo enigma que está a ser estudado pelo FBI. Algo que se poderia chamar Código Provenzano, nome do padrinho da Máfia que andou fugido à justiça 43 anos e que terá deixado uma linguagem secreta na sua Bíblia pessoal. Quando a polícia italiana deteve Bernardo Provenzano em Abril, na sua casa, na ilha Corleone, encontrou entre os seus haveres uma Bíblia totalmente anotada, marcada com post-it e com frases e números misteriosos. A partir daqui, vários especialistas dedicaram-se a estudar as anotações do "patrão dos patrões" da Máfia, admitindo que elas poderiam revelar mais sobre a organização e até um código de comunicação entre os seus membros. Não conseguindo resultados objectivos, resolveram agora pedir ajuda ao FBI, que tem um departamento especializado em decifrar códigos secretos.
"O FBI está a trabalhar com a polícia italiana com o objectivo de determinar se todas aquelas anotações não são mensagens escondidas", disse à Reuters uma fonte oficial norte-americana, que pediu para não ser identificada. O trabalho está a cargo de criptologistas do FBI, da sede de Quântico, na Virgínia. Bernardo Provenzano, também conhecido como Binu, o Tractor, tem actualmente 73 anos. Andou fugido à justiça durante 43 anos e ninguém conhecia o seu rosto, tendo sido preso graças a uma encomenda que enviou à sua mulher e que foi detectada pela polícia italiana. Provenzano encontra-se detido na prisão de Terni (centro de Itália) e passa grande parte do seu tempo a ler e continua a estudar e a anotar passagens da Bíblia.
O capítulo da Bíblia que está a merecer mais atenção dos investigadores, por ser o mais anotado, é o último, que relata o Apocalipse.

Fonte: Reuters

Iraniana impedida pelo regime de defender título de campeã

A campeã iraniana de ralis tem algo a jogar contra ela: é um ás das pistas, capaz de vencer qualquer adversário, mulher ou homem. Desde que Laleh Seddigh, 29 anos, venceu o Campeonato do Irão, em Março de 2005, tornou-se um ícone feminino no país, mas a sua carreira de piloto pode ter chegado ao fim quando a Federação Automóvel iraniana a baniu de participar numa corrida. Foi a primeira vez que Laleh, cujos sucessos obtidos nos últimos seis anos lhe valeram a alcunha de "pequena Schumacher", foi excluída de uma prova. Os responsáveis da federação argumentam que não conseguiram obter a necessária autorização para ela participar. Uma circular governamental, explica o vice-presidente da organização, Hossein Shahryari, ontem citado no diário britânico The Guardian, determina que as mulheres só podem disputar as provas femininas. O decreto foi entretanto revogado. A campeã está convicta de que quiseram apenas garantir que ela não conquistaria pontos suficientes para revalidar o título. Mas Hossein deixou sinais para o que é esperado como comportamento futuro da corredora: "As mulheres estão a ter-se em grande conta e isso está a causar incómodo entre os homens que arriscam as suas vidas neste deporto. As mulheres não são campeãs, apenas participantes."
A mais velha de quatro filhos de um rico industrial, Laleh diz que admira Schumacher, mas ressalva que o seu verdadeiro herói é o pai, que a ensinou a conduzir quando tinha 13 anos. Houve ocasiões em que roubava as chaves do carro e fugia de casa, "sempre com medo da polícia", antes de ter a carta de condução. Seguiu os passos do pai na qualidade da condução - "rápida mas segura" - e também na orientação profissional: licenciou-se em gestão industrial na Universidade de Teerão e está agora a tirar o doutoramento. Há muito que a "pequena Schumacher" sabe que a maior parte dos homens têm "inveja" do seu sucesso. Quando se sagrou campeã, a televisão do Estado recusou mostrar as imagens em que ela aparecia no pódio (eliminado pela federação desde o triunfo de Laleh em 2005), com a cabeça bem acima das dos homens. O momento foi, porém, captado pelos fotógrafos que mostraram Laleh a receber a medalha, quieta, o belíssimo rosto inexpressivo e, conforme prometera aos organizadores da prova, com um lenço a cobrir-lhe o longo cabelo negro e um casaco sobre o fato de piloto. Cumpriu, aliás, o decreto religioso que determina que as mulheres podem participar nas corridas caso obedeçam ao código de vestuário islâmico.
Na altura, Laleh acreditava que nada a iria parar: "A resistência dos homens não me incomoda. Quando estou na pista, gosto de pôr em prática as minhas capacidades técnicas, tomar o controlo e dominar os outros condutores."

Dulce Furtado (Publico)

Os arquivos de Darwin na Internet

O espólio completo do cientista britânico Charles Darwin está a ser compilado e disponibilizado gratuitamente na Internet. O projecto da Universidade de Cambridge conta já com vários manuscritos e diários nunca antes publicados ou recentemente transcritos, assim como imagens e arquivos de áudio, que relatam as ideias do naturalista que desenvolveu, ao longo de décadas, a teoria da evolução através da selecção natural. "A família sempre quis que os documentos e manuscritos de Darwin pudessem ser consultados por todos", diz Randal Keynes, trineto de Darwin, citado pela BBC. "É fantástico que agora qualquer pessoa no mundo possa lê-los através da Internet."
John van Whyh, director do projecto, conta que, embora grande parte do conteúdo seja proveniente do arquivo de Darwin em Cambridge, passou quatro anos a viajar à procura de cópias de documentos escritos pelo próprio Darwin, edições desconhecidas dos seus livros, textos de referência, obituários e colecções do naturalista.
"Escrevi para muitas pessoas de diferentes partes do mundo para ter acesso aos textos a fim de publicá-los e tive reacções muito positivas: a ideia agradou a todos", diz.
No sítio http://darwin-online.org.uk podem ser encontradas pela primeira vez na Internet as primeiras edições de Journal of Researches, Descent of Man e Zoology of the Voyage of H.M.S. Beagle e ainda várias edições de A Origem das Espécies. Um dos documentos mais importantes é o diário que escreveu durante a viagem às Ilhas Galápagos. Foi roubado na década de 1980, mas a transcrição do microfilme consta do catálogo do sítio, em formato áudio. A teoria da evolução através da selecção natural diz que a espécie humana, à semelhança dos outros animais, é o resultado de mutações e adaptações ao longo do tempo, bem como da selecção natural, o que explica por que alguns animais sobrevivem e outros se extinguem. O projecto ainda não está terminado, só está on-line cerca de 50 por cento do material. Mas o arquivo deve estar completo até 2009, quando se assinala o bicentenário do nascimento do cientista britânico e o 150.º aniversário da publicação de A Origem das Espécies.
Ana Margarida Santos (Publico)

Frescos eróticos são nova atracção em Pompeia

O bordel era o único edifício da cidade destruída em 79 a.C dedicado apenas à prostituição O lupanar de Pompeia, um dos locais mais citados do centro arqueológico situado perto de Nápoles, por causa dos seus frescos eróticos, reabriu ao público após dois anos de intensos trabalhos de restauro.Este era "o único edifício da Pompeia antiga somente destinados à prostituição", ao contrário de outros bordéis que partilhavam o espaço com albergues, notou o responsável pelo sector arqueológico de Pompeia, Pietro Giovanni Guzzo, durante a inauguração oficial.
Descoberto de 1862, o bordel tinha uma dezena de quartos em dois andares. O primeiro seria reservado aos clientes mais importantes e tinha mesmo uma entrada independente. O piso térreo seria frequentado pelas classes mais modestas e até por escravos. Ainda hoje é possível ver nas paredes vários frescos eróticos muito explícitos, que poderiam constituir um catálogo das práticas sexuais propostas pelo bordel.
Os trabalhos de restauro permitiram reavivar as cores dos frescos mas também consolidar as estruturas internas e externas do edifício, danificadas pelas intempéries e pelas visitas públicas. O termo "lupanar" vem do latim lupus (lobo). Na Roma Antiga, as prostitutas eram chamadas "lobas". Pompeia, sepultada sob as cinzas do vulcão Vesúvio no ano 79 antes de Cristo, é um dos locais mais visitados de Itália, atraindo todos os anos mais de três milhões de turistas. (fonte: comunicação social nacional)

Milão vai ter portagens urbanas

O município de Milão anunciou que, a partir de 19 de Fevereiro de 2007, irá iniciar uma experiência colocando na cidade portagens que visam desmotivar a entrada de viaturas na cidade. Trata-se de uma medida que tem como objectivo reduzir os níveis de poluição e, ao mesmo tempo, descongestionar o tráfego.
Os residentes que se apresentem em carro próprio estarão livres de qualquer pagamento, mas todos os outros, para poderem circular dentro da cidade, deverão pagar uma quantia que ronda entre os dois e os dez euros, consoante o nível de partículas poluentes emitidas pelas respectivas viaturas. Esta ideia do município deverá ser objecto de debate com associações locais de desenvolvimento e de residentes. Segundo declarações do responsável pelo tráfego de Milão, Eduardo Croci, a taxa a aplicar irá afectar 45 por cento dos automobilistas e 94 por cento das viaturas comerciais que diariamente circulam na cidade. A medida será válida para os dias úteis, entre as 7h e as 18h.
Os estudos ambientais citados por Croci ao jornal La Stampa referem que entram diariamente em Milão mais de 500 mil viaturas, sendo estas em grande parte responsáveis por níveis de poluição atmosférica que ultrapassa em 150 pontos percentuais os limites recomendados.
A taxa irá ser aplicada também aos residentes que conduzam carros que não lhes pertençam. Nestes casos os pagamentos serão anuais e poderão ser de 40, 100 ou 200 euros, consoante os níveis de poluição produzidos pelo motor.A ideia da taxa já havia sido anunciada pelo município em Agosto deste ano, tendo então sido ventilado o início de Janeiro próximo para a entrada em vigor. No entanto, devido a pressões de diversas associações, houve necessidade de proceder a reajustamentos.
Os condutores deverão comprar bilhetes para poderem entrar na cidade. Esses bilhetes serão depois validados nos equipamentos electrónicos que o município instalará em todos os acessos. A cidade de Londres é o exemplo europeu mais significativo de instituição de portagens urbanas. Posto em prática em 2003, o sistema tem recebido avaliações favoráveis e mostra resultados visíveis nos níveis de poluição e fluidez do trânsito.

(fonte: comunicação social nacional)

Morreu o espião "sem cara"

O mais célebre dos espiões da antiga Alemanha de Leste, Markus Wolf, morreu durante o sono, aos 83 anos, na sua casa na capital germânica - no mesmo dia em que se assinalam 17 anos sobre a queda do Muro de Berlim, marco histórico da reunificação alemã que o mestre espião sempre disse ter sido para ele "uma surpresa".
Um dos maiores espiões da guerra fria - consensualmente aceite como fonte de inspiração para o mítico personagem Karla de John Le Carré, embora o autor sempre o tenha negado -, Wolf dirigiu entre 1958 e 1987 os serviços de espionagem externa da Segurança de Estado da Alemanha de Leste (a Stasi), pondo em activo movimento uma impressionante rede de mais de quatro mil agentes. Durante aquelas três décadas permaneceu como "o homem sem cara", por nunca ter sido fotografado.
Wolf foi o cérebro de algumas das mais audaciosas operações secretas da guerra fria, responsável pelo recrutamento de um agente junto do então chanceler da Alemanha Federal, Willy Brandt, que conduziu à queda deste último quando o espião comunista foi exposto em 1974.
"Não posso dizer que me sinto orgulhoso do que fiz. Mas creio que não vivi em vão", avaliou Wolf numa entrevista à Reuters em 1997. Em Memoirs of a Spymaster, Wolf diz que se fizer parte da história da espionagem será por ter aperfeiçoado o sexo na espionagem, referindo-se ao uso que fazia de agentes sedutores/as para obter segredos.
Após a reunificação da Alemanha, Wolf refugiou-se na Rússia, para onde a família, judia e comunista, fugira em 1934. Chegou a estar depois na Áustria até que, em Setembro de 1991, decidiu entregar-se à justiça alemã - que o condenou a seis anos de prisão por traição. A pena nunca foi cumprida por o Supremo alemão ter anulado todos os processos por espionagem feitos contra antigos responsáveis dos serviços secretos da ex-RDA.
Até ao momento da morte, Markus Wolf manteve a denúncia daquilo que descrevia como sendo uma "justiça dos vencedores", que dele quis fazer "o símbolo do mal", e jamais denunciou qualquer dos agentes que para ele trabalharam. Nos últimos anos vivia das conferências sobre espionagem e dos livros, entre os quais a autobiografia Man Without a Face.
Os herdeiros políticos do antigo partido comunista do Leste alemão (SED) celebraram ontem a memória do espião: um homem "cheio de contradições", observou o presidente do pós-comunista PDS, Lothar Bisky.
"Tenho seguido com algum assombro a idealização de Markus Wolf como um intelectual cheio de glamour e reformista", afirmava ontem à Reuters o historiador e analista político Timothy Garton Ash. "Mas a verdade é que ele foi parte de um dos piores engenhos de opressão da Europa pós-guerra", avançou o autor de The File: A Personal History, livro em que o escritor conta como descobriu o seu ficheiro da Stasi.

Dulce Franco (Publico)

O mistério das notas de euro desfeitas

O estranho caso das notas de euro que apareceram semidesfeitas na Alemanha sem razão aparente terá origem no facto de terem sido usadas para inalar droga, a acreditar nos resultados de exames divulgados pela revista alemã Der Spiegel.A droga em questão é metanfetamina em cristais, vulgo speed, que seria inalada através de notas enroladas. Os resíduos que ficam no papel-moeda, como sulfatos, misturados com o suor, poderão ter criado um ácido que corroeu as notas.No início deste mês, depois de queixas de vários alemães terem aparecido em tablóides, o banco central alemão acabou por admitir que cerca de 1500 notas com valores faciais entre os 5 e os 100 euros apresentavam sinais de deterioração rápida - eram retiradas de caixas multibanco já com buracos e iam-se desfazendo mais ou menos depressa. Depois do comunicado do Bundesbank, o Banco Central Europeu, pela voz do seu presidente, Jean-Claude Trichet, indicou que nenhum outro país relatara casos semelhantes, notando também que as notas afectadas constituíam uma fracção ínfima do total em circulação - cinco mil milhões de euros só na Alemanha.A polícia alemã tem conhecimento de que a metanfetamina em cristais está a substituir a cocaína como a droga preferida pelos frequentadores das festas. A Der Spiegel escreve que os cristais são pulverizados e espalhados nas notas que depois são enroladas.Muito deste speed que chega a Alemanha é refinado na Polónia e nos Balcãs e misturado com sulfatos. A revista, citando um porta-voz da polícia laboratorial do estado da Renânia-Palatinado, afirma: "Quando uma nota contaminada entra em contacto com suor humano, os químicos interagem para formar um ácido sulfúrico agressivo. Se as notas foram guardadas com outras numa carteira ou numa mala, a corrosão espalhar-se-á de uma para as outras."Esta foi a primeira explicação oficial para um mistério que tem ocupado espaço na imprensa alemã - e alimentado um bom número de piadas - nas últimas semanas. O Bundesbank tem manifestado relutância em aceitar e substituir as notas corroídas sem saber ao certo o porquê de elas aparecerem assim.A polícia alemã empreendeu investigações separadas em vários depósitos de notas, mas os resultados ontem divulgados pela Der Spiegel são até ao momento a única explicação conhecida para o caso.A BBC on-line recordava ontem que uma investigação realizada em 2003 pelo Instituto de Pesquisa Farmacêutica e Biomédica de Nuremberga indicava que um número esmagador das notas de euro em circulação na Alemanha - 90 por cento - continham vestígios de cocaína. Quase na mesma altura, um estudo britânico dizia que acontecia o mesmo com 99 por cento das notas de libra em circulação em Londres.

ARTIGO: Ladainha patética

Ficamos a saber neste final de 2006 que o PIB per capita em Portugal se situa 30% abaixo da média da União Europeia a 25 Estados-membros, cujo produto interno bruto naquele período, se situou entre os 48 e os 251% da média europeia. Portugal foi um dos poucos países da União Europeia onde o nível de vida se deteriorou consecutivamente nos últimos três anos. Os dados divulgados pelo Eurostat confirmam que o PIB per capita do Luxemburgo, “ajustado às paridades de poder de compra, duplicou a média da Europa a 25 em 2005, enquanto a Irlanda se situou 40% acima da média”. Sabe-se, de acordo com o estudo, que a Holanda, Áustria, Dinamarca, Bélgica, Reino Unido e Suécia apresentaram valores situados entre os 15 e os 25% acima da média da União enquanto a Finlândia, a Alemanha e a França se ficaram pelos 10% acima daquela média — a Itália e a Espanha estão dentro da média europeia, enquanto que abaixo dela figuram o Chipre, com 10%, seguido da Grécia e pela Eslovénia (20%). A Hungria, a Estónia e a Eslováquia contaram com um PIB per capita 40% abaixo da média europeia enquanto que na Lituânia, na Polónia e na Letónia o PIB per capita ficou por cerca de metade da referida média europeia de referência. Para quem passa o dia — como os portugueses — a ter que aturar ou a ouvir o primeiro-ministro e o ministro das finanças, num coro muito bem afinado, falar de recuperação económica e de que “estamos no caminho certo”, transbordando optimismo por excesso, estes valores, bem como o assunto que abaixo referirei, desmontam uma cabala propagandística que, por envolver questões sérias, demasiado sérias, para as famílias e para as empresas, não deveria ser objecto de oportunismo saloio, ou ladainhas patéticas, por parte do governo socialista. Mas como cada país tem o governo que merece… Mas como se isso não bastasse, fiquei a saber por um jornal económico português que o crédito ao consumo de cobrança duvidosa cresceu mais de 57% no mês de Outubro, se comparado com o mesmo mês do ano anterior (2005) e que no total, já são quase 470 milhões de euros que estão em risco de não serem devolvidos às instituições financeiras. Ou seja, “entre Outubro de 2005 e o mesmo mês deste ano, verificou-se um aumento de 22% nos montantes solicitados às sociedades financeiras e à banca através dos créditos ao consumo, confirmados pelos dados do Boletim Estatístico do Banco de Portugal”. No final do mês de Outubro, o montante solicitado pelos portugueses ascendia aos 11,114 mil milhões de euros, correspondendo 4,2% deste montante a crédito ao consumo de cobrança duvidosa. Um dos responsáveis pela Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor em declarações a outro jornal lisboeta reconheceu que esta "é uma situação que, não só já se esperava, como tende a piorar nos próximos anos", sublinhando que "o aumento das cobranças duvidosas nos créditos ao consumo demonstra que cada vez mais portugueses estão presos na espiral de endividamento. Por vezes recorrem aos créditos imediatos para tapar as suas necessidades e pagar outros créditos". Basicamente, sustenta aquele especialista, a subida continuada das taxas de juro, decididas pelo Banco Central Europeu — política que já mereceu reparos de vários dirigentes europeus — é apontada como a principal causa do sobreendividamento familiar dos portugueses, associada ao que muitos classificam de uma “certa leviandade” na atribuição de empréstimos por parte do sector bancário: "Por vezes, recorrem aos créditos imediatos para tapar as suas necessidades e pagar outros créditos e com a época do Natal é muito provável que o endividamento das famílias cresça", alterando-se assim os valores divulgados recentemente mas reportados ainda a Outubro de 2006. Curiosamente, e segundo o Banco de Portugal, continuando a ter Outubro como referência, já quanto aos empréstimos bancários para fins de aquisição de habitação própria, o crédito de cobrança duvidosa recuou, tendo sido detectados 1,170 mil milhões de euros de créditos de cobrança duvidosa, menos 1,26% que os 1,185 mil milhões registados no mesmo mês do ano de 2005. Há que ter presente, lembrando o BP, que o montante pedido à banca aumentou quase 15%, passando dos 79,174 mil milhões de euros para os 90,976 mil milhões entre Outubro de 2005 e de 2006. Se conjugarmos estas duas realidades, incontornáveis, facilmente nos apercebemos que a alegada recuperação da confiança dos consumidores portugueses a par da tão propagandeada recuperação económica do País, se existem mesmo, ou estão apenas na cabeça de Sócrates e Teixeira dos Santos ou nalguns indicadores contraditórios entre si e, por isso mesmo, passíveis de terem utilização diversa, conforme os interesses e objectivos do “freguês”…

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 29 Dez 2006

quinta-feira, 28 de dezembro de 2006

ARTIGO: Sondagens

A grande novidade política da quadra natalícia foi-nos dada pelo dirigente socialista local, Jacinto Serrão, ao anunciar durante uma jantarada a existência de uma sondagem que, segundo ele, daria à oposição, toda junta, a maioria dos mandatos no parlamento regional — caso as eleições se realizassem hoje — independentemente do facto do PSD ganhar as eleições. Outro dirigente socialista, continuando a rábula em torno deste coelho tirado da cartola, foi mais longe e garantiu, solenemente, que o PSD madeirense até tinha encomendado uma sondagem cujos resultados “desastrosos” estariam na origem da recusa de Alberto João Jardim em se demitir da presidência do governo e enfrentar eleições antecipadas. Confesso que achei uma enorme piada a tudo isto, sobretudo porque revela a capacidade de invenção e de mentira dos socialistas locais, no seu frenesim pré-eleitoralista! Desde logo porque eles sabem que eu sei que não existiu sondagem nenhuma — se ela existisse já a tinham passado para alguns meios de comunicação social locais, como habitualmente fazem. Houve apenas um conjunto de projecções, uma espécie de tentativa de “estudo” futurologista — ou “adivinhação”, como diz o povo… — feito pelos cérebros locais da rua do Surdo, relativamente ao que poderia ocorrer hoje, caso as eleições regionais tivesse lugar nos tempos mais próximos, projecções essas que retiraram ao PSD uma determinada percentagem de votos, em função da média apurada nos actos eleitorais anteriores. O problema desse “estudo” — e eles sabem que foi isso que eles fizeram — é que o PS estava sempre a subir, ou seja, para os mentores da palhaçada socialista, eles não eram penalizados pelas patifarias que têm feito e pelas mentiras usadas ao longo destes dois anos de poder em Lisboa. Ora, é mais do que evidente que, retirando votos a todos os outros partidos, mas mantendo os do PS (e uma vez mais eles escolheram o melhor resultado eleitoral dos socialistas que nem foi em eleições regionais!!!), nem mesmo assim eles conseguiam os desfechos que pretendiam, já que só a oposição toda junta, nas contas deles, teria mais deputados (que não votos) que o PSD. Estudos destes faço-os eu, frequentemente, mas com seriedade, comparando eleições semelhantes entre si (regionais com regionais, legislativas nacionais com legislativas nacionais, etc.), nunca cruzando actos eleitorais diferentes só porque os resultados nos interessam. E eu sei que, por muito espremida que seja a “laranja”, o sumo é sempre a favor dos social-democratas. Salvo se alguma hecatombe ocorrer em 2008 ou se o PSD não tiver o juízo que neste momento deve ter e entregar o “ouro ao bandido”. A segunda parte desta história ainda é mais patética que a primeira — ou talvez não, se atendermos à origem: o PSD da Madeira não fez nenhuma sondagem, não se preocupa com essa questão, neste momento, pelo simples facto de entender que não existem motivos para tal. Nem alguma vez Alberto João Jardim pensou demitir-se, de nada valendo andarem os socialistas a dizer o contrário. Mas isso não invalida — e talvez seja bom que os socialistas tenham presente esta realidade — que o PSD da Madeira esteja sempre disponível para qualquer cenário eleitoral, normal ou antecipado, sem temores, confiante, porque está convencido que o ganhará com o apoio do povo, porque acredita que os madeirenses, por muitas razões de queixa que possam ter, jamais admitirão os atentados contra a sua dignidade colectiva e os seus direitos que tem sido sistematicamente lançados pelos socialistas em Lisboa com a cumplicidade e o aplauso histérico dos socialistas locais. Portanto, confesso de novo, foi um Natal politicamente muito bem passado, graças a “notícias” que nos divertem. Mesmo que elas não tenham merecido primeiras páginas, porque, compreensivelmente, os próprios jornalistas desconfiaram (apenas uma estação de rádio repetiu a “homilia” de Serrão, proferida num bem regado jantar de Natal, onde, por causa disso, tudo se perdoa). Curiosamente ninguém mais falou no assunto. Com o PSD “crucificado” e ninguém mais fala na tal, “sondagem” socialista?! E porque motivo o PS não a colocou cá fora? Agora pode inventar tudo o que quiser porque já ninguém lhe dará credibilidade, muito menos a inventonas que reflectem, mais do que a falta de seriedade, o desespero dos organizadores da jantarada, perante a necessidade de um qualquer facto passível de o estimular — porque a mobilização em autocarros não foi suficiente — na medida em que dificilmente era escondido um evidente mal-estar entre muitos dos presentes, postura que nada tem a ver com as suas opções eleitorais socialistas.

Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 28 de Dez 2006

quarta-feira, 27 de dezembro de 2006

ARTIGO: Escroques

Há por aí uns tipos, oportunistas e intriguistas da pior espécie, que me dão pena, mas que passam o dia a dizer mal de tudo e de todos, vivendo bem na podridão mal-cheirosa que representa o mundo que eles construíram e onde vivem, mergulhados nas suas frustrações e habilidades, espalhando dejectos no seu caminho, e apenas sentindo-se satisfeitos com a maledicência, ora política, ora por coisas menores, sempre e em qualquer dos casos, sem serem capazes de esconder que o seu principal problema continua a ser a inveja, a frustração de não serem importantes, graças ao combate feitas contra essa ambição desmedida por parte de quem conhece o tipo de ralé com que lida e tem toda a legitimidade para mantê-los à distância. Eles bajulam, até demais, porque querem sobreviver politicamente, precisam dos tachos. Mas depois, libertos desse “ónus”, ei-los cuspindo no prato onde comem as lentilhas, alegadamente porque nunca lhes dão o que eles querem, o penacho. São os oportunistas que mancham a política, prejudicam os partidos e abalam a confiança que muitas vezes as pessoas depositam nos líderes. Julgam-se importantes, abraçam empresários, lambem-lhes as botas, vivem à custa deles e dos empregos que estes lhes dão, sempre vendendo a ideia de que são capazes de manipular pessoas ou decisões. Deixam um rasto de suspeição, de polémica, de incompetência e soluções “milagrosas” que depois se desmoronam, transformando respeitáveis instituições, empresariais ou institucionais, em exemplares do descrédito. Ei-los, arrogantes e convencidos, andando por aí quais importantões, julgando que alguém lhes passa cartão, acreditando que influenciam ou manipulam sejam quem for, só porque berram alto, em vez de falarem. Vendem essa ideia e dela tiram proveitosos rendimentos (quem sabe se um dia…), porventura nem olham para o passado, por vergonha. Mas quanto a língua afiada, eles são os maiores. Enterrados no areal do Porto Santo ou apascentados nos cafés ali nas bandas da Sé, eles são os mesmos de sempre, incuráveis, intratáveis. Pior que lixo. Querem ser tudo na vida, queriam ser tudo na política. São apenas uns miseráveis, dos quais sentimos pena, porque já nem do ridículo eles se apercebem. Repito, deles temos pena. Não mais do que isso. Entram em desespero, numa paranóia doentia e incontrolável que não é de hoje, porque se apercebem que a hora deles está a chegar. Ninguém mais tem paciência para os aturar, estes eternos candidatos a qualquer coisa, sistematicamente adiados (e ainda bem). Por isso quando outros, bem ou mal, conseguem alguma coisa — com esforço e apenas por aposta na valorização profissional — gozam, tentam ridicularizar, nos cafés, junto de outros oportunistas do mesmo partido, que se aos poucos, pela sede de tachos e de protagonismo, se transformam em capangas dispostos a servir de paus-mandados de tudo e para tudo. Mas não se apercebem de algo essencial: a credibilidade que ninguém lhes dá, a má fama que granjearam para si. Gente que não vale um cêntimo, que por enquanto ainda anda na política, política que espera (e desespera) pelo momento de os ver pelas costas, definitivamente, para que finalmente seja possível dar mais um passo em frente na credibilidade que ela precisa. Hipócritas convencidos, incompetentes mas afamados “gestores” de falências camufladas, quais inigualáveis aves de arribação. Neste Natal a nossa bondade é ignorá-los a todos. Como? Concedendo-lhes o desprezo que a mediocridade merece. Falam alto pelos cafés, tal como o fazem na praia, berram, gesticulam, dizem mal de companheiros que depois passam a mão nas costas, como se os outros fossem obrigados a ouvi-los. Levam a intriga ao extremo, tentando derrubar pessoas com as quais trabalham e às quais devem respeito, mais não seja pela idade mais avançada, só para lhes conquistarem a cadeira e o lugar. Vivem dos e para os tachos, e bufam que se fartam. Sempre cheirando mal. Telefonam muito, para terem visibilidade, para que deles façam notícias. Tudo serve, desde que deles falem, que os coloquem no pedestal de onde há muito caíram. E se os outros começarem a falar deles, do passado, de factos ainda hoje sob suspeição, de decisões tomadas, das causas para elas, dos fretes consumados, de manipulações, de jogos e maquinações económicas, das histórias de relações pessoais (e não só) terminadas em conflitualidade levado ao extremo, de interesses obscuros, de traições e oportunismos, de facadas nas costas, etc., será que eles continuavam, sequer, de cabeça erguida, olhando-se ao espelho? Pateticamente “importantes”, mediocramente rafeiros da pior espécie. Eles são assim. O problema é que temos que aturar isto e semelhante gente. Depois, quando for tarde, procurem as causas para as derrotas, para os votos que se perdem. Então, infelizmente, será tarde de mais, porque não houve, enquanto foi tempo, a coragem de afastar quem se serve em vez de servir, quem usa em vez de partilhar, quem ataca em vez de defender, quem sistematicamente cospe no prato onde come lentilhas. E não me venham com a treta de que o inimigo está lá fora. Está sim senhor, mas não só. O inimigo está, muitas vezes, dentro de casa, demasiado perto de nós, movendo-se traiçoeiramente, ambicioso, dizendo mal de tudo e de todos, até daqueles que têm sido, todos estes anos, o principal colchão dessa gente sem escrúpulos. O inimigo está realmente lá fora, eu seu disso. Mas tenho o direito de dizer que me borrifo nesta gentalha miserável e escroque, tal como tenho o dever ético de lembrar que estarei sempre do outro lado da barricada, até porque nunca precisei de andar noutros partidos, de ser candidato e só depois entrar no PSD, pela porta das traseiras, ainda por cima comportando-se como se se tratassem de laranjas desde pequeninos. Os partidos podem ter memória curta. Mas não perdem a sua história.

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 15 de Dez 2006

ARTIGO: Europa

I. O Parlamento finlandês aprovou, por larga maioria (125 contra 39 votos e quatro abstenções), a ratificação do projecto do Tratado Constitucional Europeu, documento rejeitado em referendos realizados em 2005, na França e na Holanda. A Finlândia — 16.º país europeu a ratificar este documento — desencadeou este processo sobretudo porque exerce, até ao final deste ano, a presidência da União Europeia, enviando desta forma um sinal aos europeus, já que no primeiro semestre do próximo ano, com a Alemanha na presidência da União, tudo indica que o processo poderá ser dinamizado. O que importa saber é se esta Constituição Europeia deve ser referendada apenas pelos parlamentos nacionais ou se os povos europeus não têm direito a uma palavra. Eu sou um apologista incondicional e fundamentalista do referendo popular. Não há parlamento nenhum que tenham o direito e a legitimidade para decidir, numa matéria tão substancialmente importante em nome de povos que não os mandataram para isso. Em Portugal seria vergonhoso que fosse a Assembleia da República a se pronunciar sobre esta temática, mantendo o povo à margem de um processo que cada vez mais diz mais respeito aos cidadãos e cada vez menos é uma espécie de quintal reservado a para parlamentos ou a políticos. E faça a Finlândia o espectáculo que fizer, as dúvidas subsistem numa Europa em crise, de referências, de causas e de identidade.

II. Nunca pensei fazê-lo mas tenho que me render a Ségolène, a socialista candidata às presidenciais francesas de Abril do próximo ano, que no congresso dos socialistas europeus realizado há dias no Porto foi directa, falando sem equívocos de um dos problemas que hoje mais afectam a Europa e ameaçam o projecto de construção da União. Ségolène deixou avisos duros ao poderoso Banco Central Europeu, cada vez mais dotado de um alargado espaço de manobra e de poderes estranhamente reforçados, permitindo a União Europeia, particularmente as suas estruturas dirigentes, que o seu Presidente, o francês Truchet, mande e desmande impunemente, que aumente as taxas de juro de referência quando e sempre que entende, tudo em nome da ameaça de uma inflação que parece dar cada vez mais um tremendo jeito ao Banco Europeu, tudo isto passando-se como se acima de Truchet e do BCE não existisse uma estrutura política que não pode continuar a olhar para esta “libertinagem” anárquica que caracteriza a actuação do BCE, de uma forma tolerante, passiva e cúmplice. Neste contexto, Ségolene foi clara ao defender que devem ser os políticos e não os tecnocratas a ter de assumir as suas responsabilidades: "O Banco Central Europeu deve estar sujeito a decisões políticas e não caberá apenas ao senhor Trichet liderar as nossas economias". Curiosamente, uma semana depois, foi a vez do próprio primeiro-ministro francês, Dominique de Villepin, se ter mostrado partidário da necessidade dos estados da Zona Euro “recuperarem margens de manobra e de soberania” face ao Banco Central Europeu, para poderem fazer mais contra a inflação. Villepin defendeu “uma clarificação dos papéis entre as instituições” embora reconhecendo que o BCE “tem a responsabilidade principal da luta contra a subida de preços e a inflação”. Sobre isto a Finlândia, apostada na palhaçada da referendar por cima uma Constituição Europeia que continua a ser um documento divisionista e conflituoso, nada disse. Daí o falhanço de uma presidência que deveria ser mais sensível ao pulsar dos povos e não aos desejos dos políticos ou dos parlamentares. Realmente é inadmissível que a Europa, a braços com dificuldades várias, económicas, orçamentais, sociais e políticas, andem a reboque destes “truchets” todos. No mesmo dia em que aumentou as taxas de juro, o Presidente do BCE, como se fosse ele o mentor e o decisor das orientações do Banco central, justificou que a decisão de aumentar a taxa de juro de referência para a Zona Euro reflecte os riscos de inflação, embora não dando garantias concretas de que isso possa acontecer, já que apenas falou de riscos, mas adiantando já que a instituição vai continuar a subir o valor das taxas de juro, uma vez que considera que eles "ainda estão baixos". É esta falta de liderança política, esta ausência de líderes europeus carismáticos e fortes, que tem contribuído para o desprestígio da União Europeia, para o descrédito das suas instituições e para o crescente distanciamento dos cidadãos. Talvez por isso a Europa, enquanto projecto político, social, económico, comece a parecer-se mais com uma farsa, para gáudio de uma decadente nomenclatura europeia, bem instalada e principescamente bem paga, do que com um objectivo a alcançar. E nem falo na questão turca, porque até provas em contrário, não sou um entusiástico adepto desse alargamento, muito menos quando feito aos empurrões, sem adequada reflexão aprofundada, muito menos depois de ter percebido que esse desiderato agrada aos norte-americanos por razões (militares e geo-estratégicas) que nada têm a ver com a Europa e com os europeus.

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 20 Dez 2006

ARTIGO: Coisa(o)s

I. Parece-me recomendável que algumas pessoas, com responsabilidades privadas, não comecem a perder o “tino” para que não façam, nem figuras parvas, nem transpareçam um pedantismo convencido que ainda os vai trair, mais do que alguma fama que começam a ter na praça local. É tudo apenas uma questão de tempo. Continuo a pensar que a história vai um dia explicará certos factos, certas faltas de transparência ética, certas traições e, por causa de tudo isso, certas saídas abruptas de funções governamentais. E desvendar, também e particularmente, as razões para que isso tivesse acontecido, e em que circunstâncias tudo aconteceu. Parece-me também, que seria recomendável que, de uma vez por todas, tais indivíduos, mesmo que aparentemente não sejam capazes, façam um esforço e dispensem certos comentários ridículos, que os retratam e que não façam figuras pateticamente parvas, particularmente durante entrevistas aos meios de comunicação social, durante as quais deram uma demonstração, mais uma, da sua própria mediocridade, por muito que ela, a par do convencimento excessivo, por enquanto os tenha ajudado. Pouco me importa que eles não aceitem nem respeitem as opiniões dos outros, a liberdade que eu tenho de pensar como penso e como quero. Não é por causa deles que não durmo melhor, continuarei a pensar e a escrever de acordo com o que penso. O que me faltava era ter que aturar arrufos de gente vaidosa que se move em função de objectivos e de ambições que a seu tempo serão desvendados. Repito, não é por causa deles que não durmo. Estes comportamentos, pela rafeirada rasca que comportam, implicam que da minha parte tais personagens deixem de ser credores de qualquer respeito, muito menos de solidariedade. Como não lhes devo nada, e vice-versa, por muito que eles mexam em “papel” ou, como consta por aí, andem às voltas com uns tantos milhões de incobráveis razões por resolver e que ameaçadoramente funcionam, para eles, qual “espada de Demóstenes”. Tudo isto tranquiliza-me. Ao contrário de alguns indivíduos que, ou resolvem rapidamente determinadas situações que por aí andam, ou ainda verei gente a perder empregos e a “stressar”… As ameaças de abandono durante uma entrevista, a par de outras absurdas atitudes, revelam o carácter de quem as toma, é certo, mas em nada alteram a minha opinião acerca da pouca-vergonha e da promiscuidade que constitui a mistura de funções claramente incompatíveis, pelo menos no plano da ética pessoal. E já agora, recomendo a todos, aos mais e aos menos atentos, aos que se preocupam ou não com certas movimentações que por aí andam, que vão dando atenção ao que acontecerá em 2007, à medida que certos processos de alienação patrimonial forem implementados na Região. Talvez se perceba, finalmente, porque motivo alguns grupos empresariais locais se empenharam tanto na conquista de certas associações e alguns patéticos espécimes andem eufóricos e reclamar a paternidade da solução. Como se isso contribuísse alguma coisa para a nossa felicidade colectiva. Mas uma coisa atrevo-me a sugerir-lhe, quer eles queiram ou não. Olhem para o futebol e percebam que as coisas começam a mudar, talvez porque a justiça está farta de ser apontada a dedo como a culpada de tudo, e de todos os nossos males colectivos, e que, pelos vistos, resolveu reagir e responder, adequadamente, aos que a atacam. E percebam que, hoje no futebol, amanhã sabe Deus onde…
II. A “Grande Lisboa”, capital da região portuguesa mais rica, viu há dias ser aprovado pelo governo socialista um investimento de 140 milhões de euros a serem gastos em auto-estradas. O contrato para a construção dos lanços de auto-estrada da Concessão da Grande Lisboa foi aprovado hoje pelo Governo. Estas obras deverão estar concluídas em 2010, representando um investimento de cerca de 140 milhões de euros. Além disso, o ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Mário Lino, lembrou que está em curso o alargamento do IC19, que a conclusão da Circular Regional Interna de Lisboa (CRIL) está prevista para 2009 e o eixo Norte-Sul, que atravessa Lisboa, estará completo no próximo ano. Tudo isto na região portuguesa mais rica e com o PIB mais elevada de todas. Curiosamente aqui não funcionou o critério do governo socialista de Sócrates que resolveu, ao abrigo da lei das finanças regionais, retirar imediatamente varias dezenas de milhões de euros à Madeira para dá-los aos Açores (e pelos vistos a mais alguém…) por alegadamente os açorianos terem um PIB substancialmente inferior ao madeirense.


Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 20 Dez 2006

ARTIGO: Uma história

Esta história, com origem no Brasil, chegou-me por correio electrónico, é verdadeira e foi contada na primeira pessoa: “Exactamente na véspera de Natal, eu corri ao mercado para comprar os últimos presentinhos, que eu não havia conseguido comprar antes. Quando eu vi todas aquelas pessoas no mercado, comecei a reclamar comigo mesma: – "Isto vai demorar a vida toda, e eu ainda tenho tantas coisas para fazer, outros lugares para ir. O Natal está ficando pior a cada ano. Como eu gostaria de poder apenas me deitar, dormir e só acordar após tudo isso". Sem notar, eu fui andando até à secção de brinquedos, e lá eu comecei a bisbilhotar os preços, imaginando se as crianças realmente brincam com esses brinquedos tão caros. Enquanto eu olhava a secção de brinquedos, notei um garoto de mais ou menos 5 anos pressionando uma boneca contra o peito. Ele acarinhava o cabelo da boneca e olhava tão triste, e fiquei tentando imaginar para quem seria aquela boneca que ele tanto apertava. O menino virou-se para uma senhora que estava próxima e disse: – "Avó, você tem certeza que eu não tenho dinheiro suficiente para comprar esta boneca?" A senhora respondeu: – "Você sabe que o seu dinheiro não é suficiente, meu querido!" E ela perguntou ao menino, se ele poderia ficar ali olhando os brinquedos por 5 minutos, enquanto ela iria olhar outra coisa. O pequeno menino estava segurando a boneca em suas mãos. Finalmente eu comecei a andar em direcção ao garoto e perguntei para quem ele queria dar aquela boneca. Ele respondeu: – "Esta é a boneca que a minha irmã mais adorava, e queria muito ganhar neste Natal. Ela estava tão certa que o Pai Natal traria esta boneca para ela este ano." Eu disse: "Não fique tão preocupado, eu acho que o Pai Natal trará a boneca para a sua irmã." Mas ele triste disse-me: – "Não, o Pai Natal não poderá levar a boneca onde ela está agora. Eu tenho que dar esta boneca para minha mãe, assim ela poderá dar a boneca à minha irmã, quando ela for lá." Os seus olhos se encheram de lágrimas enquanto ele falava: – "Minha irmã teve que ir para junto de Deus. O papai me disse que a mamãe também irá embora para perto de Deus em breve. Então eu pensei que a mamãe poderia levar a boneca com ela e entregar a minha irmã.". Meu coração quase parou de bater. Aquele garotinho olhou para mim e disse: – "Eu disse ao papai para dizer a mamãe não ir ainda. Eu pedi-lhe que esperasse até eu voltar do mercado." Depois ele mostrou-me uma foto muito bonita dele rindo: – "Eu também quero que a mamãe leve esta foto, assim ela também não se esquecerá de mim. Eu amo a minha mãe e gostaria que ela não tivesse que partir agora, mas meu pai disse que ela tem que ir para ficar com a minha irmãzinha." Ele ficou olhando para a boneca com os olhos tristes e muito quietinho. Eu rapidamente procurei a minha carteira e peguei algumas notas e disse para o garoto: – "E se nós contássemos novamente o seu dinheiro, só para termos certeza de que você tem o dinheiro para comprar a boneca?" Coloquei as minhas notas junto ao dinheiro dele, sem que ele percebesse, e começámos a contar o dinheiro. O dinheiro daria para comprar a boneca e ainda sobraria um pouco. E o garotinho disse: – "Obrigada Senhor, por atender o meu pedido e me dar o dinheiro suficiente para compra a boneca". Ele olhou para mim e disse: – "Ontem antes de dormir eu pedi a Deus que fizesse com que eu tivesse dinheiro suficiente para comprar a boneca, assim a mamãe poderia levar a boneca. Ele me ouviu... e eu também queria um pouco mais de dinheiro para comprar uma rosa branca para minha mãe, mas eu não ousaria pedir mais nada a Deus. E Ele me deu dinheiro suficiente para comprar a boneca e a rosa branca. Você sabe, a minha mãe adora rosas brancas." Uns minutos depois, a senhora voltou e eu fui embora sem ser notada. Terminei as minhas compras num estado totalmente diferente do que havia começado. Entretanto não conseguia tirar aquele garotinho do meu pensamento. Lembrei-me de uma notícia no jornal local de dois dias antes, quando foi mencionado que um homem bêbado numa camioneta, batera noutro carro, e que no carro estavam uma jovem senhora e uma menininha. A criança faleceu imediatamente, a mãe estava em estado grave nos cuidados intensivos, e que a família decidiu desligar as máquinas, uma vez que a jovem não sairia do estado de coma. E pensei, se seria a família daquele garotinho. Dois dias depois do meu encontro com o garotinho, li no jornal que a jovem senhora tinha falecido. Eu não pude me conter e sai para comprar rosas brancas. Fui ao velório daquela jovem. Ela estava segurando uma linda rosa branca nas suas mãos, junto à foto do garotinho e com a boneca em seu peito. Deixei o local chorando, sentindo que a minha vida havia mudado para sempre. O amor daquele garotinho por sua mãe e irmã continua gravado em minha memória até hoje. É difícil de acreditar e imaginar que numa fracção de segundos, um bêbado tenha tirado tudo daquele pequeno garotinho”. Boas Festas.

Luís Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 21 Dez 2006

ARTIGO: Vésperas

O Papa João Paulo II, e mais uma vez recordo essa figura que sempre me fascinou, na sua homilia da véspera de Natal de 2003, deixou-nos uma mensagem que nunca é demais lembrar: “ (...) Salva-nos dos grandes males que dilaceram a humanidade neste início do terceiro milénio. Salva-nos das guerras e dos conflitos armados que assolam inteiras regiões do globo, da praga do terrorismo e das muitas formas de violência que afligem pessoas débeis e inermes. Salva-nos do desânimo ao enfrentar os caminhos da paz, certamente difíceis, mas possíveis e, por isso, necessários; caminhos urgentes, sempre e em qualquer lugar, sobretudo na Terra onde nasceste, Tu, Príncipe de Paz (…)”. Um Papa que sabia falar às pessoas e que eu recordo com saudade. Nesta quadra natalícia – estes dias recuso-me a falar de política – não nos podemos esquecer de uma realidade que faz com que, este ano, o Natal volte a ser, para milhares de portugueses e no final de mais um ano de sofrimento e de penoso saque governamental, uma quadra pouco festiva. E querem saber porquê? Porque somos um país a recuperar economicamente e a tornar felizes, todos os que nele vivem: (…) “A pobreza, em Portugal, é um problema social grave e o seu não reconhecimento tem-se revelado, ultimamente, um dos maiores entraves à sua erradicação. No nosso país, 1 em cada 5 portugueses vive no limiar da pobreza (21% da população total), 12.4% da população activa ganha o salário mínimo nacional, 7,2 % da população activa está desempregada, mais de 5000 trabalhadores tiveram o seu trabalho reduzido ou suspenso em 2004, 26,3% dos reformados recebe menos de 200€/mês de reforma, 148 mil recebem o Rendimento Social de Inclusão, 79,4% da população activa não terminou o ensino secundário, 45,5% da população, em idade escolar, abandona de forma precoce a escola, a taxa de Analfabetismo ronda os 9% da população, 300 mil famílias (8% da população) viviam, em 2001, em habitações sem condições mínimas. Mas, por outro lado, as 100 maiores fortunas portuguesas representam 17% do Produto Interno Bruto Nacional – 22.4 mil milhões de euros. O país tem a pior distribuição de riqueza no seio da União Europeia com os 20% mais ricos a controlar 46% do rendimento nacional, que 10 800 pessoas têm rendimentos de cerca de 816 mil euros anuais (…)”. É o Natal dos pobres, dos que sofrem, dos pais tristes e infelizes que não podem dar aos seus filhos mais do que o seu amor, que a tristeza contida, que lágrimas habilmente escondidas. É o Natal dos sofredores, dos que nada têm e que o poema seguinte enaltece: “E que esta quadra bonita atravessa Sem o bacalhau para a consoada Nem ninguém a quem o peça E ver os seus filhos a sonhar Como qualquer outra criança E nada lhes poder comprar Nem ter réstia de Esperança É um luto profundo e triste Ser pobre por esta altura É ter coração que não resiste À bondade e à candura Ao Amor que lhe assiste E não ter o fim sua penúria!” Os meus votos, a minha esperança, que o Natal de 2007 seja melhor para todos os que, este ano, não o viveram como desejavam.

P.S. — O Instituto de Pesquisa sobre Políticas Alimentares, uma organização com sede em Washington, diz que cerca de 815 milhões de pessoas passam fome no mundo. O índice mostrou que os países da África subsaariana são os mais afectados pela fome, ocupando as 10 piores posições no ranking. O instituto também alerta que 127 milhões de crianças sofrem com insuficiência alimentar: "Na Índia e no Bangladesh há altas taxas de desnutrição infantil. O estatuto inferior das mulheres nos países do sul asiático e sua falta de conhecimento nutricional são determinantes importantes para a alta prevalência de crianças com baixo peso na região". O índice apurado teve em consideração factores como a mortalidade infantil, desnutrição infantil e o número de pessoas com deficiência alimentar, em 119 nações pobres ou emergentes até em finais de 2003.

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 22 de Dez 2006

ARTIGO: Um conto

Esta crónica de hoje destina-se a levar aos leitores um conto de Natal, muito conhecido no norte do País, e termina com o meu desabafo natalício: “Era uma vez uma família pobre, que vivia numa casa muito velha numa aldeia transmontana. Clarinha acordou muito feliz, era véspera Natal. Ela sabia que nesse dia o Pai Natal visitava todas as crianças e lhes deixava os seus presentes. Nessa noite, Clarinha quase nem dormiu com tanta ansiedade. Como não tinha árvore de Natal, deixou a sua meia pendurada na janela para que o Pai Natal lhe deixasse lá o seu presente. Na manhã seguinte, reparou que a sua meia estava vazia e que não havia presente nenhum. O seu pai, homem doente e desempregado, observava atentamente a filha, com muita tristeza. E então chamou-a: — Clarinha, vem cá! A menina com os olhos cheios de lágrimas sentou-se no seu colo e disse: — O Pai Natal esqueceu-se de mim, papá! Porquê? O pai não conseguiu conter as lágrimas, que lhe escorriam nas faces. Então a menina ao ver o pai a chorar perguntou: — Porque choras papá? O Pai Natal também se esqueceu de ti? E então o pai disse: — Não, minha filha, o Pai Natal não se esqueceu de mim porque me deu o melhor presente que algum dia eu poderia ter. Esse presente és tu e eu sei que o Pai Natal também não se esqueceu de ti, porque te deu uma família que gosta muito de ti e que deseja que sejas feliz. Nesse dia, o pai, mesmo doente, levou a sua filha para um passeio na montanha, brincaram todo o dia, regressando no começo da noite. Nessa noite Clarinha decidiu escrever uma carta ao Pai Natal, dizendo: “Querido Pai Natal, quero agradecer o presente que me deu. Desejo que todos os Natais sejam com o meu pai, que as nossas brincadeiras o façam esquecer dos problemas e que ele se possa distrair comigo, passando um dia maravilhoso como o de hoje. Obrigada pela minha vida, pois descobri que não somos felizes só com brinquedos, mas sim com o verdadeiro sentimento que está dentro de nós e que o Pai Natal desperta todos os anos. Obrigada. Clarinha.” E adormeceu, com um sorriso nos lábios. O pai de Clarinha quando viu a menina a dormir, aconchegou-lhe os velhos coberto- res para que não tivesse frio. Nesse instante viu a cartinha que ela tinha escrito ao Pai Natal e leu-a. A partir desse dia, o pai da menina não deixou que os seus problemas afectassem a sua felicidade e começou a fazer de todos os dias, um dia de Natal” * * * Há muitos anos, há demasiados anos, que não tenho os meus pais no Natal. Ainda na minha tenra infância, deixei de os poder ter comigo. Portanto, guardo deles uma ténue recordação. Algumas vezes pensei, confesso, que um bom presente de Natal, neste meu percurso de vida, seria poder ter os meus pais de volta, mesmo que fosse por um dia, abraça-los e dizer o quanto eles me fizeram falta. Valeu-me o facto de ter tido a sorte de ter uma família que me ajudou a superar isso tudo, e a quem eternamente estarei grato. E amigos que me ajudaram quando deles precisei. Quase todos já partiram, porque a idade e a Vida são implacáveis. É deles que me lembro nesta época do ano, recordando-os a todos com saudade, com o coração pesado. Às famílias, a todas as famílias, desejo que trabalhem pela sua união, que enterrem divergências tontas e que esqueçam as diferenças que causam divisões, geram incompatibilidades e dividam o que deve estar unido. O Natal é, de facto, a festa da família. Mais do que o consumismo que nesta época a todos atinge. Nos dias de hoje quero estar com os meus, com a minha família, garantindo junto deles a minha presença, numa quadra que tanto me entusiasma. Tendo-os a todos comigo, juntos, porque é isso que maior satisfação me dá. Tudo o resto é nada. Boas Festas.

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 25 Dez 2006

ARTIGO: Futebol

O futebol profissional está podre. Decididamente. E de nada servem os branqueamentos que repetidamente têm sido ensaiadas com a cumplicidade da imprensa desportiva portuguesa, a quem falta a coragem de assumir uma postura mais distantes dos centros de decisão e de denunciar factos, comportamentos, decisões e outras matérias ainda mal explicadas, que têm minado a credibilidade do futebol nacional. Mas não é de hoje esse estado catastrófico em que ele se encontra, mas de há muitos anos, há tempo demasiado para que hoje aceitemos passivamente, que andem por aí algumas carpideiras a chorar lágrimas de crocodilo, tentando sacudir do capote as responsabilidades pelo estado a que se chegou. Quando foi tempo de agir, quando foi tempo de impor a depuração, quando foi tempo de forçar a investigação, de acelerar o combate à corrupção, às suspeições e concretizar os processos judiciais, tudo foi abafado, porque o futebol profissional continua a viver numa redoma controlada por meia dúzia de privilegiados e a querer ser uma espécie de mundo à parte, embora vivendo dos favores, dos fretes, dos dinheiros públicos, enfim, à custa de todos nós. Paradoxalmente, foi um livro perfeitamente estapafúrdio a despoletar o que parece ser a evolução natural do processo “Apito Dourado” que muitos julgavam morto, mas que poderá conhecer – assim, se espera – uma segunda fase, decisiva, da qual deverão sair esclarecimentos, provas e punições exemplares para os prevaricadores. Há que acabar com esta impunidade que tem afastado os portugueses do futebol e diluído inquestionavelmente a disputa e a rivalidade clubística que hoje não tem rigorosamente nada a ver com o que se vivia no passado. Quando os “majores”, os “pintos”, os “vieiras”, os oliveiras, os empresários, as transferências, a televisão, os “milhões”, etc, não atraíam tantos interesses, tantos sanguessugas, tantos “aspiradores”… O futebol profissional não pode ser mais um “mundo” à parte, onde todos fazem o que querem, seguros de que ninguém lhes faz nada. A justiça é a justiça portuguesa. Não há excepções, não pode haver uma justiça desportiva, e uma justiça para os cidadãos. E se for preciso dar um exemplar safanão à UEFA e a todos os organismos desportivos internacionais, então levemos os assuntos até às últimas consequências, ao Parlamento Europeu, às instâncias judiciais europeias, a quem for preciso para que se meta a UEFA na ordem. E não venham com a treta da globalização. Nunca mais podemos deixar tudo como está, como se nada se tivesse passado, como se o futebol profissional fosse um mundo exemplar. Uma zanga de amantes amuados, com alegadas agressões, olhos negros, brincadeiras do “capuchinho vermelho” e do “lobo mau”, com atributos pessoais, tentativas de extorsão à mistura e amores perdidos, etc, tudo isso parece ter dado corpo a um livro publicado pela “D. Quixote” (se não tivesse a certeza do sucesso das vendas, certamente que nunca se envolveria nesta edição), trouxe factos novos, alguns conhecidos, outros ouvidos aqui e além, que mostram a dimensão da podridão do mundo do futebol e, pior do que isso, colocam a descoberto o que se pode considerar do lado mais criminoso, mais mafioso e mais violento dos subterrâneos do apodrecido futebol profissional português. Desta feita parece que o tiro lhes vai sair pela culatra. Porradas por encomenda, ameaças a magistrados, perseguições, etc, tudo isso foram factores suficientes, demasiado graves, para que o Ministério Público actuasse. E fê-lo de uma forma que promete polémica, mas ao mesmo tempo a convicção de que vamos, finalmente, ficar a saber alguma coisa de novo e de concreto. E porque motivo? Simplesmente pelo facto de Maria José Morgado ter sido envolvida no processo do “Apito Dourado” por decisão do novo Procurador-Geral da República. Ficamos a saber – e admito que exista gente que já não durma bem a partir de hoje – que a procuradora-geral adjunta, Maria José Morgado, vai coordenar os processos relacionados com a operação “Apito Dourado”, sobre a corrupção no futebol, decisão que partiu da Procuradoria-Geral da República. Segundo a imprensa, o processo principal está na fase de instrução no Tribunal de Gondomar tendo sido emitidas algumas dezenas de certidões que foram remetidas para variadas comarcas, entre as quais as relacionadas com a agressão do ex-vereador do PS Ricardo Bexiga e a eventual fuga de informação que impediu a detenção de Jorge Nuno Pinto da Costa, presidente do FC Porto. Maria José Morgado, considerada uma dura, com uma posição implacável em relação à corrupção, assumiu entre 2000 e Agosto de 2002 a chefia da Direcção Central de Investigação da Corrupção e Criminalidade Económica e Financeira da Polícia Judiciária, sendo actualmente procuradora-geral adjunta no Tribunal da Relação de Lisboa. No mesmo dia em que esta notícia foi divulgada – o que não deixa de ser curioso – Almeida Pereira, o número dois do Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) do Porto, recusou fazer parte da lista do Conselho de Justiça da Federação Portuguesa de Futebol, que tinha sido apresentada na véspera. Consta que o procurador da República terá recuado devido à insistência de outros magistrados, que o terão alertado para o melindre da situação. Esta decisão surgiu depois da renúncia de João Ramos, procurador do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP).

Luis Filipe Malheiro
Jornal da Madeira, 27 Dez 2006

Primeira passada

A 27 de Dezembro de 1956, criei este blog, com o objectivo de nele publicar alguns textos, uns da minha autoria, outros meras curiosidades que, nas minhas navegações "internéticas", considere interessantes e passíveis de uma concentração num único espaço de busca. Depois, com o tempo, veremos o que vai acontecendo. Este blog está directamente associado a este, claramente com uma outra finalidade.

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